REVISTA ÉPOCA
Vivemos tempos de Hurricane, Escambo e Monte Carlo. Tais são as operações da Polícia Federal que prenderam contraventores ou "bicheiros" - como Carlinhos Cachoeira, Aniz Abrahão David, Ailton Guimarães, Turcão, Luiz Pacheco Drumond e Piruinha. Alguns são celebridades, patrocinadores do Carnaval carioca e amigos de senadores. Todos são acusados de praticar atividades ilegais - entre elas, figura o brasileiríssimo jogo do bicho.
A caçada aos banqueiros do bicho, um jogo que só existe no Brasil, levanta problemas curiosos. O primeiro é o jogo como uma atividade problemática no mundo capitalista e pós-industrial. O capitalismo é um sistema produtivo (e existencial) que tem como base a liberdade individual, e como núcleo o capital financeiro - e não mais fábricas infectas, os moinhos satânicos de que falava o poeta inglês William Blake. Realmente, o capitalismo atual chama a atenção principalmente pelos computadores superpoderosos, nos quais podemos nos tornar atores num teatro chamado de "Bolsa de Valores". No capitalismo, arriscamos, apostamos e investimos. Mas, nesse caso, trata-se de um risco legitimado pelo sistema, já que seu fundamento é a alavancagem de recursos que, até a famosa bolha americana, permite avaliar as empresas que estão no mercado. Um cínico diria que o mercado é a mesa do cassino, e a Bolsa sua roleta. Um sujeito razoável afirmaria que jogar na Bolsa é uma consequência da expansão do mundo financeiro e do triunfo do capital - que reinventa, a seu modo, nossas identidades locais, nacionais e globais.
Não é muito fácil distinguir esses tipos de "jogo" - o que é ilegal, como o bicho, e o que é institucionalizado, como a Bolsa - da mesma forma como não é tranquilo aceitar o álcool e o fumo, proibindo outras drogas. Sobretudo quando se sabe que tudo - literalmente tudo (computadores, jogos, livros, sexualidade, futebol, comércio, sorvete, automóveis, regimes alimentares, remédios, chocolate, comida etc.) - "vicia". Ou seja: pode causar dependência.
Deixando de lado nossas vãs filosofias e reiterando que não se trata de defender contraventores, sabemos que se joga na Bolsa como se pode jogar nos cassinos. A diferença crucial é que o jogo é proibido no Brasil. Ele foi colocado na ilegalidade em 1946 pelo Decreto no 6.259, assinado pelo então presidente e general, Eurico Gaspar Dutra. Uma lei que, pelo número, os aficionados do jogo do bicho sabiam pertencer ao grupo do jacaré. Ora, o jacaré é um bicho traiçoeiro, de modo que o decreto confirmou o caráter da lei dentro de uma cosmologia popular, que o próprio jogo do bicho estabeleceu.
Quando, com Elena Soárez, escrevi um livro sobre o jogo do bicho, escolhemos o título Águias, burros e borboletas, porque esses "bichos" remetiam à dimensão poética de toda instituição verdadeiramente popular. Eram da ordem daqueles "brasileirismos", como dizia Gilberto Freyre, que ajudam a construir a identidade de um povo. Essa identidade permite uma comunicação entre todos. Por exemplo: todos sabem - mesmo que não conheçam o jogo - que 24 é (data venia aos gays) o algarismo do veado. De tal modo que ser chamado pelo número é como ser igualado ao próprio bicho e a suas características.
Um jogo culturalmente aprovado e economicamente exitoso é considerado ilegal, mas continua até os nossos dias, numa flagrante contradição entre as leis e a capacidade de o governo honrar essa ilegalidade. Hoje temos mais um surto para detê-lo, mas o jogo continua. Não é a primeira vez que os bicheiros são presos. Isso sucedeu há exatamente 19 anos, quando a juíza Denise Frossard realizou o mesmo movimento - mas o jogo (com tudo o que ele conduz de malsão) retornou à cena.
Nesse grave contexto de prisões e intenções de proteger a sociedade contra pretensos meliantes, cabe discutir um ponto central: a produção da ilegalidade no Brasil. Em nosso país, tudo o que é legal ou ilegal tem uma zona cinzenta, onde as coisas vazam e o ilegal vira legal (e vice-versa). É o caso das questões do Enem, dos concursos públicos e - eis o assunto do momento - das concorrências públicas. Se assim é, cabe a pergunta que não quer calar: seria o jogo um crime relativo (porque o governo banca outros tipos de jogo, como as loterias) ou o que temos de fato é um traço nacional a ser discutido com mais clareza? Refiro-me, é claro, ao fato de que somos rápidos em legislar, resolvendo a realidade com uma proibição, mas muito ineficazes em vigiar e punir.
Não seria melhor tornar legal o inevitável, controlando com rigor seus excessos, em vez de continuar nessa nossa modernidade por decretos que não operam na prática? O que seria dos ingleses se eles proibissem as apostas nos cavalos, que, por sinal, são um jogo permitido no Brasil? O que ocorreu com os americanos na Lei Seca? O que aconteceria se os concursos de beleza fossem proibidos como ocorreu no governo de Jânio Quadros? Com a palavra, você, caro leitor.
domingo, março 25, 2012
Democracia maior - ANCELMO GOIS
O GLOBO - 25/03/12
Primeira mulher a ocupar, em abril, a presidência do TSE, a ministra Cármen Lúcia defende a mudança do processo de escolha dos dois advogados que integram o tribunal. Hoje, eles são escolhidos pelo presidente da República “entre seis advogados de notável saber jurídico e idoneidade moral, indicados pelo STF”.
Segue...
A proposta de Cármen é que qualquer advogado, de todo lugar do Brasil, possa se candidatar à lista dos indicados.
Deixa a Ana trabalhar
O Ministério da Cultura aprovou a captação de R$ 884.175,62 para um site sobre música chamado Farofafá, coordenadopor Pedro Alexandre Sanches, que mete o malho na gestão de Ana de Hollanda. Veja em http://bit.ly/xhnDQa. A aprovação da liberação da grana para o site inimigo está em http://bit.ly/GSEHIC.
Entre as pernas
João Bosco, que será o homenageado do Prêmio da Música Brasileira em 2012, compôs com Aldir Blanc “Aura de Glória” para a abertura da nova versão da novela “Gabriela”, da TV Globo. Trechinho: “Tem entre as pernas calor de asteróides queimando no céu e uma beleza que pede beleza e pincel...”
Como assim?
A “Voz do Brasil”, sexta à noite, qualificou o bicheiro-bingueiro Carlos Cachoeira como... “empresário da contravenção”. Quem ouviu ficou em dúvida se era alguma homenagem.
‘Dolce far niente’
Eduardo Paes, a pedido de Dilma, deve decretar feriado no Rio nos dias 20, 21 e 22 de junho (quarta, quinta e sexta), por causa da Rio+20. O carioca terá cinco dias de folga, incluídos o sábado e o domingo.
O DOMINGO É de Débora Nascimento, formosura de 26 anos, nascida em São Paulo, que interpretará Tessália em “Avenida Brasil”, nova novela das 21h da TV Globo, que estreia amanhã. Na trama, de João Emanuel Carneiro, a personagem da linda morena vai vencer um concurso de beleza. Para viver Tessália, Débora fez aulas de charme por três meses e até frequentou bailes. “É muito divertida essa dança”, conta. Dança com eu.
Chico de Bethânia
Maria Bethânia vai lançar seu CD “Oásis de Bethânia”, mas não sairá em turnê pelo país, como costuma fazer. É que voltará ao estúdio para gravar um songbook sobre Chico Buarque. Serão oito discos.
Corredor do Fórum
O juiz Glauber Bitencourt, de Piraí, RJ, condenou a Concessionária Nova Dutra a indenizar em R$ 140 mil a família de um ciclista que morreu atropelado ao atravessar a Via Dutra. Para o juiz, é obrigação da Nova Dutra erguer mureta entre as pistas para impedir a travessia.
‘BBB do MMA’
A TV canadense Superchannel mandou uma equipe ao Brasil para gravar um reality show com... a turma do MMA. Desde o dia 14, os gringos acompanham o dia a dia de lutadores daqui. O auge serão duelos no Brasil e no Canadá. Estreia lá em outubro. Vai se chamar “The Fight Exchange”.
Brizola armado
A deputada Juliana Brizola, neta do velho trabalhista, pediu ao PDT do Rio Grande do Sul que retire da frente de sua sede, em Porto
Alegre, um painel com esta foto de seu avô armado: — O partido não deveria expor meu avô com uma arma diante de quem não tem condições de analisar o momento histórico — diz Juliana.
Segue...
A foto é de 1961, quando Brizola liderava a Campanha da Legalidade, de resistência aos militares golpistas que não queriam a posse de Jango, vice-presidente eleito, após a renúncia do presidente Jânio Quadros.
Deus castiga
Às vésperas do carnaval, um gatuno furtou quatro quadros de 15 que representam a Via Sacra na Igreja de São Cristóvão, fundada em 1856, no Rio. Desde então, o padre Roberto Magalhães vinha encerrando os sermões com um pedido para os fiéis ficarem atentos, caso as peças lhes fossem oferecidas.
E não é que...
Terça passada, Alberto Silva Neto, que mora em Olaria, mas vai à missa na Igreja de São Cristóvão, chegou com os quadros. Encontrou-os à venda na Favela da Maré.
No mais...
Que São Cristóvão ajude o padre Roberto Magalhães e a nós não desampare.
‘Eu tive câncer de mama’
O compositor, poeta e produtor musical Hermínio Bello de Carvalho, 77 anos , operou quinta passada um câncer raro e pouco discutido no Brasil — o de mama... em homens. O carioca boa-praça Hermínio passa bem, teve alta na sexta. Mas o susto só foi menor porque descobriu a doença bem no início. Segundo o médico Marcos Moraes, é grande a chance de o nosso poeta estar curado.
— Sou um serviço de utilidade pública ambulante. Os homens não podem ignorar o exame de toque de mama. Têm de fazer como as mulheres. O doutor Marcos vai “cirurgiar”, novamente, este tal “ardido peito”, que tanto celebrei numa canção — brincava Hermínio, pouco antes da cirurgia.
O parceiro de Cartola e Carlos Cachaça no lindo samba “Alvorada” já havia sido vítima de câncer de mama em 2008. O exame, repetido há pouco tempo, apontou a volta da doença. O sintoma mais visível, ensina o médico Marcos Moraes, é um nódulo na mama, que pode ser descoberto pelo próprio homem, num autoexame.
Parceiro também de mestres como Paulinho da Viola e Baden Powell, entre outros, nosso Hermínio doou toda a sua “coleção Pixinguinha” (óleos sobre tela, desenhos, caricaturas que retratam o genial compositor de “Carinhoso”) à Fundação do Câncer, presidida pelo doutor Marcos Moraes.
O câncer de mama masculino ainda é tabu no Brasil. Os números mais recentes, catalogados pelo Inca, são do DataSus de 2009. Naquele ano, 12.098 pessoas morreram da doença no país — 11.969 mulheres e 129 homens. Segundo Marcos Moraes, a estimativa de novos casos em 2012 é de 52 mil, entre mulheres, e de 500 a 600, entre homens. Hermínio quer ser o divulgador deste alerta. Salve ele!
Primeira mulher a ocupar, em abril, a presidência do TSE, a ministra Cármen Lúcia defende a mudança do processo de escolha dos dois advogados que integram o tribunal. Hoje, eles são escolhidos pelo presidente da República “entre seis advogados de notável saber jurídico e idoneidade moral, indicados pelo STF”.
Segue...
A proposta de Cármen é que qualquer advogado, de todo lugar do Brasil, possa se candidatar à lista dos indicados.
Deixa a Ana trabalhar
O Ministério da Cultura aprovou a captação de R$ 884.175,62 para um site sobre música chamado Farofafá, coordenadopor Pedro Alexandre Sanches, que mete o malho na gestão de Ana de Hollanda. Veja em http://bit.ly/xhnDQa. A aprovação da liberação da grana para o site inimigo está em http://bit.ly/GSEHIC.
Entre as pernas
João Bosco, que será o homenageado do Prêmio da Música Brasileira em 2012, compôs com Aldir Blanc “Aura de Glória” para a abertura da nova versão da novela “Gabriela”, da TV Globo. Trechinho: “Tem entre as pernas calor de asteróides queimando no céu e uma beleza que pede beleza e pincel...”
Como assim?
A “Voz do Brasil”, sexta à noite, qualificou o bicheiro-bingueiro Carlos Cachoeira como... “empresário da contravenção”. Quem ouviu ficou em dúvida se era alguma homenagem.
‘Dolce far niente’
Eduardo Paes, a pedido de Dilma, deve decretar feriado no Rio nos dias 20, 21 e 22 de junho (quarta, quinta e sexta), por causa da Rio+20. O carioca terá cinco dias de folga, incluídos o sábado e o domingo.
O DOMINGO É de Débora Nascimento, formosura de 26 anos, nascida em São Paulo, que interpretará Tessália em “Avenida Brasil”, nova novela das 21h da TV Globo, que estreia amanhã. Na trama, de João Emanuel Carneiro, a personagem da linda morena vai vencer um concurso de beleza. Para viver Tessália, Débora fez aulas de charme por três meses e até frequentou bailes. “É muito divertida essa dança”, conta. Dança com eu.
Chico de Bethânia
Maria Bethânia vai lançar seu CD “Oásis de Bethânia”, mas não sairá em turnê pelo país, como costuma fazer. É que voltará ao estúdio para gravar um songbook sobre Chico Buarque. Serão oito discos.
Corredor do Fórum
O juiz Glauber Bitencourt, de Piraí, RJ, condenou a Concessionária Nova Dutra a indenizar em R$ 140 mil a família de um ciclista que morreu atropelado ao atravessar a Via Dutra. Para o juiz, é obrigação da Nova Dutra erguer mureta entre as pistas para impedir a travessia.
‘BBB do MMA’
A TV canadense Superchannel mandou uma equipe ao Brasil para gravar um reality show com... a turma do MMA. Desde o dia 14, os gringos acompanham o dia a dia de lutadores daqui. O auge serão duelos no Brasil e no Canadá. Estreia lá em outubro. Vai se chamar “The Fight Exchange”.
Brizola armado
A deputada Juliana Brizola, neta do velho trabalhista, pediu ao PDT do Rio Grande do Sul que retire da frente de sua sede, em Porto
Alegre, um painel com esta foto de seu avô armado: — O partido não deveria expor meu avô com uma arma diante de quem não tem condições de analisar o momento histórico — diz Juliana.
Segue...
A foto é de 1961, quando Brizola liderava a Campanha da Legalidade, de resistência aos militares golpistas que não queriam a posse de Jango, vice-presidente eleito, após a renúncia do presidente Jânio Quadros.
Deus castiga
Às vésperas do carnaval, um gatuno furtou quatro quadros de 15 que representam a Via Sacra na Igreja de São Cristóvão, fundada em 1856, no Rio. Desde então, o padre Roberto Magalhães vinha encerrando os sermões com um pedido para os fiéis ficarem atentos, caso as peças lhes fossem oferecidas.
E não é que...
Terça passada, Alberto Silva Neto, que mora em Olaria, mas vai à missa na Igreja de São Cristóvão, chegou com os quadros. Encontrou-os à venda na Favela da Maré.
No mais...
Que São Cristóvão ajude o padre Roberto Magalhães e a nós não desampare.
‘Eu tive câncer de mama’
O compositor, poeta e produtor musical Hermínio Bello de Carvalho, 77 anos , operou quinta passada um câncer raro e pouco discutido no Brasil — o de mama... em homens. O carioca boa-praça Hermínio passa bem, teve alta na sexta. Mas o susto só foi menor porque descobriu a doença bem no início. Segundo o médico Marcos Moraes, é grande a chance de o nosso poeta estar curado.
— Sou um serviço de utilidade pública ambulante. Os homens não podem ignorar o exame de toque de mama. Têm de fazer como as mulheres. O doutor Marcos vai “cirurgiar”, novamente, este tal “ardido peito”, que tanto celebrei numa canção — brincava Hermínio, pouco antes da cirurgia.
O parceiro de Cartola e Carlos Cachaça no lindo samba “Alvorada” já havia sido vítima de câncer de mama em 2008. O exame, repetido há pouco tempo, apontou a volta da doença. O sintoma mais visível, ensina o médico Marcos Moraes, é um nódulo na mama, que pode ser descoberto pelo próprio homem, num autoexame.
Parceiro também de mestres como Paulinho da Viola e Baden Powell, entre outros, nosso Hermínio doou toda a sua “coleção Pixinguinha” (óleos sobre tela, desenhos, caricaturas que retratam o genial compositor de “Carinhoso”) à Fundação do Câncer, presidida pelo doutor Marcos Moraes.
O câncer de mama masculino ainda é tabu no Brasil. Os números mais recentes, catalogados pelo Inca, são do DataSus de 2009. Naquele ano, 12.098 pessoas morreram da doença no país — 11.969 mulheres e 129 homens. Segundo Marcos Moraes, a estimativa de novos casos em 2012 é de 52 mil, entre mulheres, e de 500 a 600, entre homens. Hermínio quer ser o divulgador deste alerta. Salve ele!
A visita de Zecamunista - JOÃO UBALDO RIBEIRO
O ESTADÃO - 25/03/12
Relutei em voltar a falar em Zecamunista pela terceira vez em pouco tempo, mas os pedidos foram muitos em toda a vizinhança, que ele visitou brevemente, nos três dias de sua estada no Rio de Janeiro. Revolucionário de um lado e profissional do pôquer de outro, desde seus precoces 14 anos, habituou-se à clandestinidade, a codinomes, endereços secretos e disfarces dos mais variados, de maneira que, segundo ele, o primeiro impulso que sente ao despertar é se esconder da repressão. Só depois de um minuto ou dois, ele acorda de vez, suspira aliviado e canta a Internacional em voz alta, ritual cotidiano. Entre seus disfarces, o mais célebre e sempre lembrado na ilha é do tempo em que ele, ainda bem antes dos 14, fazia sucesso com mágicas de baralho em todo o Recôncavo, de turbante e usando o nome artístico de Abdul Saladim, em alusão a suas origens árabes. Daí para o pôquer foi um pulo e rendam graças aos céus os jogadores de pôquer do Rio por ele ter vindo por motivos estritamente políticos e, como sempre, subversivos.
A pedido dele, fui encontrá-lo na orla, ainda de manhã bem cedo. Ele me esperava de óculos escuros e chapéu enterrado na cabeça, contemplando o mar e usando seu inseparável brochinho da foice e martelo na lapela.
- Mas isto aqui é a paisagem mais linda do mundo - disse ele, com a voz um pouco embargada. - Nem em toda a União Soviética se encontrava uma paisagem que rivalizasse com esta. Nem em Itaparica, a verdade é esta. Até o nome é bom.
- Rio de Janeiro?
- Gua-na-ba-ra, a gente enche a boca. Você sabe o que quer dizer Guanabara em tupi-guarani?
- Eu li não sei onde que quer dizer "baía grande".
- Errado! Ignorância! Alienação! Os índios nem sabiam o que era baía, quanto mais se era grande ou pequena, eles só conheciam esta. A interpretação certa é "seio-mar", isso sim, faz justiça a esta baía extraordinária. Um grande peitão marítimo, um grande, farto e acolhedor regaço feminino! Você não acha que a Baía de Guanabara tem a forma de um peitão, o Grande Peitão?
- Bem, sinceramente, eu já olhei no mapa e nunca me pareceu isso.
- Os índios não tinham Google, para eles era um peitão! Olhada daqui é um peitão absoluto, o Grande Peitão, um peitão magnífico e arrebatador, como somente a carioc... Você reuniu algumas candidatas a se alistar na ala feminina dos Bem-te-vis da Pátria?
- Bem, eu devo confessar que não tenho muito jeito para isso.
- Eu já esperava, você não presta nem como linha auxiliar, nem como inocente útil você tem serventia.
- Eu falei com algumas amigas, mas a verdade é que elas ficaram um pouco desconfiadas do exame que você quer fazer nelas.
- Nelas não! Com elas! Olhe a regência, você quer me difamar, atenção no quinta-colunismo! Eu não vou fazer nada nelas, eu nunca faço nada nas mulheres, eu faço com elas, atenção na preposição, eu mando uma carta de protesto para a Academia e acabo com seu cartaz lá, se é que você tem algum!
- Que é isso, Zeca, também não precisa se exaltar.
- Desculpe, mas eu fico transtornado com essas coisas. Somente um cafajeste é que vai chegar para uma mulher, ainda mais a carioca, e dizer que quer fazer um negócio nela. Ele diz que quer fazer um negócio com ela, é diferente, é ali junto. É por essas e outras que desde o tempo de menino que você tenta apanhar mulher e não consegue, muito menos uma carioca, e para arranjar quem o aguentasse teve que engabelar uma jovem inocente em Birigui.
- Bem, de qualquer forma, quando eu disse o nome do exame, elas não gostaram.
- O psicotoque? É preciso ser muito maldoso, para condenar um exame de tanta utilidade, que eu mesmo desenvolvi a partir de certas descobertas de Pavlov. Ele fazia isso com cachorros, mas eu, modéstia à parte, faço com as mulheres, elas ficam babando que nem os cachorros dele, quando me veem, é reflexo condicionado. Mas essas suas amigas ficaram intimidadas foi com sua preposição insidiosa. Acharam que eu queria fazer o psicotoque nelas, mas eu quero fazer é com elas. Você tem obrigação de escrever isso no jornal, eu não quero me ver obrigado a entrar na justiça contra você, por difamação e injúria.
- Tudo bem, eu escrevo, mas não vai adiantar nada, acho que seu movimento não começou bem.
- Porque ainda não começou. Resolvi adiar o lançamento nacional aqui na Guanabara, preciso de uma preparação mais cuidadosa, não pensei que ainda por cima seria sabotado por amigos falsos e conterrâneos pérfidos. Você ainda ouvirá falar muito na ala feminina dos Bem-te-vis da Pátria. Eu tive uma ideia mercadológica, de vez em quando é preciso usar as armas do capitalismo, eu trabalhei muito em agitação e propaganda lá na ilha.
- Desde que eu nasci, nunca vi agitação na ilha.
- Não aceito insinuações. E minha decisão já está tomada. Vou fazer um anúncio naiternet, somente para as cariocas: "Seja uma comandante dos Bem-te-vis da Pátria! Venha fazer seu psicotoque com Zecamunista em Itaparica! Uma semana com todas as despesas pagas! Para melhor concentração, pais, maridos e namorados não serão aceitos! Não perca esta oportunidade!".
- Até que pode dar certo, Zeca, mas de onde virá a grana?
- Patrocínio. O psicotoque é de interesse nacional, quem já fez confirma. E a mulher carioca é cultura, estou tranquilo, acho que vou de Petrobrás.
PROGRAMAÇÃO ESPORTIVA NA TV
9h - Copa do Mundo de ginástica artística, Etapa de Cottbus, Sportv 2
9h15 - Zenit x Rubin Kazan, Campeonato Russo, ESPN
11h - Napoli x Catania, Campeonato Italiano, ESPN Brasil
11h - Lazio x Cagliari, Campeonato Italiano, ESPN HD
11h30 - Ajax x PSV, Campeonato Holandês, ESPN
12h - Masters 1.000 de Miami, Tênis, Sportv 2
12h30 - Colônia x B. Dortmund, Campeonato Alemão, ESPN Brasil e Esporte Interativo
14h - Athletic Bilbao x S. de Gijón, Campeonato Espanhol, ESPN HD
14h - Etapa de São Petersburgo, Indy, Band e Bandsports
16h - Corinthians x Palmeiras, Campeonato Paulista, Band e Globo (para SP)
16h - Vasco x Resende, Estadual do Rio, Band e Globo (menos SP)
16h - PSG x Bordeaux, Campeonato Francês, Sportv
16h45 - Juventus x Inter de Milão, Campeonato Italiano, ESPN e Sportv 2
18h - Boca Jrs. x Lanús, Campeonato Argentino, Esporte Interativo
18h30 - Mirassol x São Paulo, Campeonato Paulista, Sportv
20h - Torneio Interligas de Basquete, Sportv 2
20h - Kansas City x Dallas, Major League Soccer, ESPN HD
22h30 - Masters 1.000 de Miami, Tênis, Sportv 2
A banda desafinada do governo - VINICIUS TORRES FREIRE
FOLHA DE SP - 25/01/12
UM INTEGRANTE do governo, economista, contesta a ideia, exposta nestas colunas no domingo retrasado, de que o ministro Guido Mantega insinuou no Congresso que o governo manteria o câmbio numa banda informal de R$ 1,70 e R$ 1,90.
"O governo Dilma Rousseff acha que o melhor regime é de câmbio flutuante", afirma o economista. Que também contesta o rumor de que o governo estaria satisfeito com o dólar a R$ 1,80.
"Na metade da década, tivemos dólar por volta de R$ 2,50, e já era um nível difícil. Ainda por cima houve inflação. Houve perda de competitividade por alta de custos e encarecimento em dólar do produto nacional", argumenta o economista integrante do governo.
Bem, isso a gente sabe. Inflação maior que a dos parceiros comerciais e real caro é um problema único de dupla face. Mas é o governo que até agora, pelo menos, tratava apenas do câmbio, e não da alta de custos.
De volta ao câmbio: se não há "banda informal", se R$ 1,80 é preço de dólar muito barato, se o governo gosta de câmbio flutuante e se inclui, como é óbvio fazê-lo, a inflação na medida da competitividade (ou da adequação do nível de câmbio), o que diabos o governo enfim está querendo fazer?
Para levar o dólar de volta ao preço do ano de 2009, digamos, o câmbio da moeda americana deveria estar em torno de uns R$ 2,20, numa conta de guardanapo. O governo tem meios de levar o câmbio para esse nível?
"O governo vai tomando as medidas possíveis para diminuir as distorções causadas pela conjuntura econômica internacional, de abundante liquidez." Ou seja, o economista do governo não quer entrar em detalhes.
Enfim, desvalorização cambial não é também um modo de achatar salários reais? "O efeito de uma desvalorização não é tão simples assim de medir, nem no curto prazo", desconversa um pouco o economista.
Em suma, a mensagem que o governo quer passar, sem maiores detalhes, é que "não vai deixar a indústria desamparada". No curto prazo, isso significa "inevitavelmente" (palavra do economista) reduzir custos e empecilhos: baixar impostos, baratear crédito, conter o câmbio o quanto for possível, com todos os instrumentos à disposição, de compra de reservas a impostos.
"É uma situação de emergência (as medidas pró-indústria), mas que pode afetar o ânimo de investir dos empresários. O investimento no ano passado não fraquejou só por causa da crise na Europa ou da desaceleração brasileira e do gasto do governo. Foi ainda falta de confiança no futuro da indústria", afirma o economista.
O governo voltou a falar muito de investimento. Parte dos economistas do governo fala até de "esgotamento provisório" do crescimento puxado pelo crédito ao consumidor. A conversa quase parece que vai dar na ideia de que é preciso, enfim, dar um tempo no crescimento liderado pelo consumo das famílias.
Isto é, contenção dos rendimentos das famílias e da expansão do crédito para pessoa física, menos transferências do governo, mais investimento do governo e, caso o consumo não caia muito, mais investimento estrangeiro.
É isso o que está na cabeça do governo? O governo desconversa.
Desilusão de ótica - J. R. DURAN
O ESTADÃO - 25/03/12
Hoje, palavrão em fotografia é Photoshop. E o fotógrafo que deixar rastros é visto como amador
Houve um tempo em que o pior insulto que um fotógrafo podia receber, ao mostrar uma imagem, era a de que ela estava "fora de foco". Apresentar uma foto que não estivesse nítida era um palavrão visual que marcava, por muito tempo, a falta de habilidade em manejar um equipamento e a insensibilidade em mostrar um pedaço de papel contendo alguma coisa nebulosa. Uma habilidade que, se supunha, um bom profissional deveria administrar com a mesma maestria com que um bom espadachim maneja seu sabre ou um bom escritor sua pena.
A tecnologia digital suprimiu a possibilidade de perder a foto decisiva por falta de prática na hora de focar, com a objetiva autofoco e uma avalanche de recursos - sejam eles embutidos nas câmeras, sejam na pós-produção - que permitem a qualquer um fotografar. E quando digo "qualquer um" é isso mesmo que quero dizer; qualquer pessoa pode produzir uma imagem, não é preciso nem prática nem habilidade para apertar o botão de qualquer aparelho e desse ato surgir uma imagem. Se ela é uma boa foto ou não, é outra historia. Mas esse não é o ponto. O ponto é que, hoje, a pior suspeita que se pode levantar sobre um fotógrafo é a de que ele manipulou sua imagem. O palavrão, hoje, se chama Photoshop. E o fotógrafo que se atrever a deixar rastros de seu uso, no seu trabalho, passa a ser visto como amador.
Devo lembrar, porém, que a manipulação de imagens não é novidade. Mesmo nos desenhos das paredes da caverna de Lascaux os animais têm uma das quatro patas levantada para dar a percepção de que estavam se movimentando pelas pradarias perigordianas.
O pintor francês Ingres imaginou a tela de sua autoria Napoleon I on his Imperial Trone (1806) como uma maneira de enaltecer o imperador e, na sequência, conseguir apoio oficial para futuros trabalhos. Infelizmente, Ingres caprichou tanto no retrato que Napoleão, mesmo com seu ego inflado e sonhos de conquistador a se perder no horizonte, rejeitou o trabalho, achando que o pintor tinha passado da conta. Um caso de puxa-saquismo artístico que custou caro a Ingres; nunca recebeu uma encomenda oficial.
Outro pintor, o inglês John Singer Sargent, caiu em desgraça entre a alta sociedade da capital francesa depois de apresentar o retrato de Amelie Gautrau, o famoso Madame X, no Salão de Paris em 1884. O escândalo foi provocado pelo fato de uma das alças do vestido de madame Gautrau aparecer, na tela, displicentemente caída. O escândalo "deixou o artista pasmado e a modelo banhada em lágrimas". E o que era para ser o ápice de uma ascensão social anunciada - a senhora Gautrau era conhecida pela excelência de suas roupas e sua beleza, e imaginava que aquela tela a tornaria o talk of the town parisiense - se transformou, no século 19, em um exemplo de crash and burn digno do mercado de celebridades de hoje. Sargent refez o quadro e, na tela que pode ser contemplada no museu de Arte Metropoliano de Nova York, duas alças - finíssimas, é verdade - cobrem os ombros de madame Gautrau.
Cair em desgraça era o que levava os dirigentes do Partido Comunista russo, ou do chinês, a desaparecer, como por milagre, das fotos oficiais depois de certo tempo. Na medida em que os camaradas iam entrando em declínio político, as caras deles sumiam das fotos. O fenômeno de supressão da memória era feito pelos retocadores que, com um pincel e um estilete, seguiam os caprichos históricos de Stalin ou Mao Tsé-tung .
A tecnologia digital, além de facilitar o ato de fotografar, tem de compensar de alguma maneira a quantidade de imagens erradas que são jogadas para o ar, por segundo, no mundo. Para isso existem mais de 80 ferramentas e plug ins dentro do Photoshop. Com elas você pode retocar uma imagem, substituindo uma área por outra, ou copiar um pedaço da superfície retratada por outra. Ou, ainda, pode diminuir, e aumentar, partes do corpo, ou alterar o formato das roupas vestidas. Não consigo imaginar aonde Méliès poderia ter chegado se tivesse tido acesso na sua época a alguma coisa parecida. Mas posso contemplar, um dia sim, outro também, o que são capazes de fazer mentes sem talento no acabamento das imagens atuais.
A ideia por trás do Photoshop não é a otimização da mentira, mas melhorar a luz e atenuar eventuais condições adversas em que a foto tiver sido feita. No aplicativo está reunido todo o conhecimento necessário para que as pessoas, os lugares, os objetos saiam bem na foto, o mesmo conhecimento que por muitos anos foi dominado por poucos e agora está ao alcance de qualquer um. Não podemos esquecer que a Playboy foi lançada em 1953 e as mulheres dentro das páginas dela sempre pareceram, apesar de quererem ser as garotas da vizinhança, perfeitas.
Mas, assim como o hábito não faz o monge, a ferramenta não faz o mecânico. Uma boa imagem não é conseguida a partir de instrumentos de aperfeiçoamento, e sim em função de um bom equipamento e de uma boa luz. O uso do programa que corrige os erros de português do Word, que estou usando neste momento, não implica que o texto será melhor ou pior, apenas mais legível.
As aparências podem enganar, mas não durante muito tempo. Um sorriso - verdadeiro Photoshop da simpatia estampada no rosto - só convence se as intenções são verdadeiras. O mesmo se pode dizer de uma foto. E os exageros das imagens maltratadas afundam como a propaganda enganosa que tentam empurrar através da retina dos consumidores.
A manipulação de imagens, não se enganem os puristas, não é nenhuma novidade. A novidade é o espanto que essa manipulação possa provocar nas pessoas e a suposta vitimização do consumidor que, para algumas mentes legislativas, parece ser incapaz de analisar sozinho as informações que recebe. Como se tudo tivesse de ser mastigado, tirando a possibilidade de discernir o certo do errado e de se supor a ausência de uma inteligência própria no indivíduo, que funcionaria melhor quando substituída por uma coletiva, em que uns poucos dizem, e decidem, o que é bom para todos. Daí para a infantilização das pessoas, e que elas sejam tratadas como crianças, é um passo.
A propaganda através de imagens poderá ser enganosa, com ou sem Photoshop, porque a honestidade é um aplicativo mental que depende de cada um. Ninguém altera a imagem do frasco do produto, que vai ser encontrado fisicamente no supermercado ou no balcão de vendas; o que se extrapola é o tamanho do sonho, o tamanho do intangível.
Quem quiser burlar o próximo o fará como sempre foi feito, com lei ou sem lei. Cabe uma outra lei, a do mercado, colocar o enganador em seu lugar.
Criaturas do Sol - MARCELO GLEISER
FOLHA DE SP - 25/03/12
A imagem da nossa estrela como uma plácida bola de fogo no céu tem pouco a ver com o seu aspecto real
É DIFÍCIL não pensar no Sol nestes dias. Ao menos aqui onde trabalho, no norte dos Estados Unidos (Estado de New Hampshire), temos um início de primavera que já virou algo que lembra o verão, coisa que nunca vi ocorrer por aqui.
O Sol exerce uma espécie de efeito alquímico, transformando o humor das pessoas, que passaram os últimos quatro meses no frio. Ao mesmo tempo, ouvimos relatos de tempestades Solares que jogam bilhões de toneladas de plasma no espaço e, volta e meia, sobre a Terra.
Essas ejeções de massa coronal (ou seja, vindas da coroa, a "atmosfera" do Sol) tendem a aumentar em frequência em torno do período chamado de máximo Solar, que ocorre a cada 11 anos, aproximadamente. Estamos entrando num desses períodos de intensificação das tempestades solares neste ano.
A imagem do Sol como uma plácida bola de fogo no céu não tem nada a ver com a coisa real.
Imagens próximas revelam um verdadeiro inferno, no qual a temperatura na superfície chega a 6.000 graus Celsius, um incessante borbulhar de matéria e campos magnéticos de enorme intensidade.
Tempestades solares nos lembram que não devemos supor que o Sol continuará fazendo o seu trabalho todos os dias, sempre do mesmo jeito, mesmo que tenha sido assim por bilhões de anos.
O Sol irradia por segundo cerca de 400 trilhões de trilhões de watts, isto é, 1 seguido de 26 zeros, equivalente a 100 bilhões de bombas nucleares de um megaton cada. Essa potência toda vem de reações de fusão nuclear que ocorrem no centro do Sol, onde o hidrogênio se transforma em hélio. O Sol, agora em sua meia-idade, está passando por uma fase relativamente estável. Ninguém precisa começar a ter pesadelos achando que será frito amanhã.
Nos seus 4,5 bilhões de anos de vida, o Sol converteu apenas cerca de 5% de sua massa total em hélio.
Com o passar do tempo, mais hidrogênio vai sendo convertido, e a luminosidade solar, isto é, a energia total emitida pelo Sol, também aumenta. Em 1,1 bilhão de anos, a luminosidade será 10% maior e, em 3,4 bilhões de anos, 40% maior. Esse aumento de energia terá sérias consequências para o clima terrestre. Primeiro causando um "efeito estufa úmido", depois um efeito estufa descontrolado. A vida, ao menos como a conhecemos no momento, será impossível aqui.
Dado que a vida era impossível durante o primeiro bilhão de anos de existência da Terra -devido ao incessante bombardeio de cometas e asteroides- vemos que ela só é viável aqui por um período relativamente curto da existência do Sol, correspondendo a só 5 bilhões dos seus 10 bilhões de anos. Cada espécie que viveu e viverá na Terra é um fenômeno passageiro, parte do ciclo de vida e morte do Sol.
Sendo um otimista, tendo a acreditar que, ao vencermos nossos desafios climáticos mais imediatos (ligados aos combustíveis fósseis) e aprendermos com eles, conseguiremos encontrar uma outra casa para os seres vivos da Terra, ao menos para os que sobreviverem ao que andamos fazendo por aqui.
Posso até imaginar uma espécie de Arca de Noé espacial, transportando as formas de vida terrestre pelo espaço interestelar, em busca de um novo lar planetário.
A imagem da nossa estrela como uma plácida bola de fogo no céu tem pouco a ver com o seu aspecto real
É DIFÍCIL não pensar no Sol nestes dias. Ao menos aqui onde trabalho, no norte dos Estados Unidos (Estado de New Hampshire), temos um início de primavera que já virou algo que lembra o verão, coisa que nunca vi ocorrer por aqui.
O Sol exerce uma espécie de efeito alquímico, transformando o humor das pessoas, que passaram os últimos quatro meses no frio. Ao mesmo tempo, ouvimos relatos de tempestades Solares que jogam bilhões de toneladas de plasma no espaço e, volta e meia, sobre a Terra.
Essas ejeções de massa coronal (ou seja, vindas da coroa, a "atmosfera" do Sol) tendem a aumentar em frequência em torno do período chamado de máximo Solar, que ocorre a cada 11 anos, aproximadamente. Estamos entrando num desses períodos de intensificação das tempestades solares neste ano.
A imagem do Sol como uma plácida bola de fogo no céu não tem nada a ver com a coisa real.
Imagens próximas revelam um verdadeiro inferno, no qual a temperatura na superfície chega a 6.000 graus Celsius, um incessante borbulhar de matéria e campos magnéticos de enorme intensidade.
Tempestades solares nos lembram que não devemos supor que o Sol continuará fazendo o seu trabalho todos os dias, sempre do mesmo jeito, mesmo que tenha sido assim por bilhões de anos.
O Sol irradia por segundo cerca de 400 trilhões de trilhões de watts, isto é, 1 seguido de 26 zeros, equivalente a 100 bilhões de bombas nucleares de um megaton cada. Essa potência toda vem de reações de fusão nuclear que ocorrem no centro do Sol, onde o hidrogênio se transforma em hélio. O Sol, agora em sua meia-idade, está passando por uma fase relativamente estável. Ninguém precisa começar a ter pesadelos achando que será frito amanhã.
Nos seus 4,5 bilhões de anos de vida, o Sol converteu apenas cerca de 5% de sua massa total em hélio.
Com o passar do tempo, mais hidrogênio vai sendo convertido, e a luminosidade solar, isto é, a energia total emitida pelo Sol, também aumenta. Em 1,1 bilhão de anos, a luminosidade será 10% maior e, em 3,4 bilhões de anos, 40% maior. Esse aumento de energia terá sérias consequências para o clima terrestre. Primeiro causando um "efeito estufa úmido", depois um efeito estufa descontrolado. A vida, ao menos como a conhecemos no momento, será impossível aqui.
Dado que a vida era impossível durante o primeiro bilhão de anos de existência da Terra -devido ao incessante bombardeio de cometas e asteroides- vemos que ela só é viável aqui por um período relativamente curto da existência do Sol, correspondendo a só 5 bilhões dos seus 10 bilhões de anos. Cada espécie que viveu e viverá na Terra é um fenômeno passageiro, parte do ciclo de vida e morte do Sol.
Sendo um otimista, tendo a acreditar que, ao vencermos nossos desafios climáticos mais imediatos (ligados aos combustíveis fósseis) e aprendermos com eles, conseguiremos encontrar uma outra casa para os seres vivos da Terra, ao menos para os que sobreviverem ao que andamos fazendo por aqui.
Posso até imaginar uma espécie de Arca de Noé espacial, transportando as formas de vida terrestre pelo espaço interestelar, em busca de um novo lar planetário.
Órfãos adultos - MARTHA MEDEIROS
ZERO HORA - 25/03/12
Era uma senhora alegre, faceira. Mas morreu, como acontece com todos. Sem salamaleques, sem longas internações. Morreu rápido, como muitos desejam, e viveu demoradamente, como se deseja também: tinha 99 anos.
Deixou três filhos, todos na faixa dos 70, pois na época em que essa senhora era jovem casava-se cedo. E foi então que, conversando com uma das filhas, de 75 anos, me deparei com uma questão sobre a qual eu nunca tinha pensado. Disse-me ela que estava muito magoada com a reação das pessoas: todos vinham abraçá-la, no enterro, como se ela estivesse de aniversário, como se fosse uma boda, uma promoção, um réveillon.
“Minha mãe, apesar da idade que tinha, não dava trabalho à família, era independente e gozou de boa saúde até o final. Porém, mesmo que tivesse dado trabalho, mesmo que eu e meus irmãos estivéssemos reféns de uma condição desfavorável, ora, perdi minha mãe. Por que isso seria menos doloroso a essa altura? Só porque também sou velha?”
Calei. Ela tinha total razão. É muito comum encararmos a morte de alguém bastante idoso como um alívio para a família – estivesse o defunto já doente ou não. Da mesma forma como nos chocamos quando alguém parte cedo, nos insensibilizamos diante dos que partem aos 95 anos, aos 99, aos 103 anos de idade. É como se estivéssemos aguardando a notícia do óbito para qualquer momento, e quando a notícia chega, tudo certo, cumpriu-se a ordem natural das coisas, é preciso morrer e, que dádiva, ao menos este viveu bastante.
Tudo certo quando se trata dos pais dos outros.
O que essa senhora de 75 me esclareceu é que ela tem, também, o direito de sentir-se órfã. É um engano achar que a orfandade é um sentimento exclusivo dos jovens. Ela tinha vontade de dizer, a todos aqueles que foram ao enterro apenas para cumprir uma formalidade social, sorridentes como quem vai a um shopping, que a sua capacidade de sentir dor não havia sido diluída pelos seus 75 anos, e que ela sentia falta daquela mãe tanto quanto a sua filha de 50 sentiria a sua, e tanto quanto a sua neta de 25 sentiria da mãe dela.
Essa história aconteceu alguns anos atrás, mas me veio à memória com clareza e força ao ler recentemente o livro Filosofia Emocional, do professor Frédéric Schiffter, que entre diversos assuntos aborda exatamente isso: a tristeza não é uma doença, muito menos uma doença exclusivamente infantil. O fato de sermos experientes, vividos, maduros e bem resolvidos não cria em nós uma blindagem contra os sentimentos. Ao menos, não diante de perdas tão significativas.
E se por um acaso for uma doença infantil, que respeite-se. Perder a mãe nos leva, a todos, de volta aos 10 anos de idade.
Era uma senhora alegre, faceira. Mas morreu, como acontece com todos. Sem salamaleques, sem longas internações. Morreu rápido, como muitos desejam, e viveu demoradamente, como se deseja também: tinha 99 anos.
Deixou três filhos, todos na faixa dos 70, pois na época em que essa senhora era jovem casava-se cedo. E foi então que, conversando com uma das filhas, de 75 anos, me deparei com uma questão sobre a qual eu nunca tinha pensado. Disse-me ela que estava muito magoada com a reação das pessoas: todos vinham abraçá-la, no enterro, como se ela estivesse de aniversário, como se fosse uma boda, uma promoção, um réveillon.
“Minha mãe, apesar da idade que tinha, não dava trabalho à família, era independente e gozou de boa saúde até o final. Porém, mesmo que tivesse dado trabalho, mesmo que eu e meus irmãos estivéssemos reféns de uma condição desfavorável, ora, perdi minha mãe. Por que isso seria menos doloroso a essa altura? Só porque também sou velha?”
Calei. Ela tinha total razão. É muito comum encararmos a morte de alguém bastante idoso como um alívio para a família – estivesse o defunto já doente ou não. Da mesma forma como nos chocamos quando alguém parte cedo, nos insensibilizamos diante dos que partem aos 95 anos, aos 99, aos 103 anos de idade. É como se estivéssemos aguardando a notícia do óbito para qualquer momento, e quando a notícia chega, tudo certo, cumpriu-se a ordem natural das coisas, é preciso morrer e, que dádiva, ao menos este viveu bastante.
Tudo certo quando se trata dos pais dos outros.
O que essa senhora de 75 me esclareceu é que ela tem, também, o direito de sentir-se órfã. É um engano achar que a orfandade é um sentimento exclusivo dos jovens. Ela tinha vontade de dizer, a todos aqueles que foram ao enterro apenas para cumprir uma formalidade social, sorridentes como quem vai a um shopping, que a sua capacidade de sentir dor não havia sido diluída pelos seus 75 anos, e que ela sentia falta daquela mãe tanto quanto a sua filha de 50 sentiria a sua, e tanto quanto a sua neta de 25 sentiria da mãe dela.
Essa história aconteceu alguns anos atrás, mas me veio à memória com clareza e força ao ler recentemente o livro Filosofia Emocional, do professor Frédéric Schiffter, que entre diversos assuntos aborda exatamente isso: a tristeza não é uma doença, muito menos uma doença exclusivamente infantil. O fato de sermos experientes, vividos, maduros e bem resolvidos não cria em nós uma blindagem contra os sentimentos. Ao menos, não diante de perdas tão significativas.
E se por um acaso for uma doença infantil, que respeite-se. Perder a mãe nos leva, a todos, de volta aos 10 anos de idade.
Dois atores em cena - DENISE ROTHENBURG
CORREIO BRAZILIENSE - 25/03/12
Aécio Neves, do PSDB, e Eduardo Campos, do PSB, passaram a ser vistos com mais consistência pela própria base governista para 2014. Ou um ou outro, ou os dois juntos. Falta combinar com o povo que, por hora, ainda está com Dilma
Se tem uma característica comum a todos os políticos, é o fato de tomar decisões hoje pensando no futuro distante. A maioria deles simplesmente não consegue exercitar a máxima “a cada dia a sua aflição”. Essa turma já vai logo pulando o calendário. E, quando veem uma crise política pela frente, esse pulo ultrapassa alguns anos. Especialmente, entre os deputados. Cientes de que têm o resto do mandato garantido, eles já estão pensando com quem se aliar na frente para obter o próximo. E, nesse sentido, ao se sentirem desprezados pela presidente Dilma, eles já começam se aquecer como parte da torcida de dois personagens ilustres da política atual: o senador Aécio Neves (PSDB-MG), considerado o nome mais forte da oposição hoje para concorrer ao Planalto, e o governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB-PE).
Os movimentos em direção a um e outro ainda são sutis. Mas existem e estão em todos os partidos da base aliada e não apenas dentro da óbvia oposição — PSDB, DEM e PPS —, talvez (apenas talvez!) engrossada por PR e outros partidos. O único que está fora desses cenários alternativos para o futuro, por enquanto, é o PT, que, detentor da presidência da República sob o comando de Dilma Rousseff, não tem como se mover em outras frentes. Não por acaso os ministros do PT são hoje os primeiros a sair a campo no sentido de estancar a crise política.
Por falar em PT…
Os petistas são os únicos que hoje não têm uma grande alternativa à presidente Dilma Rousseff. Precisam desesperadamente que Lula fique bom logo, plenamente recuperado para embalar multidões e, assim, ajudar o partido a criar outras lideranças. Hoje, eles têm plena consciência de que Dilma só ganhou a eleição por causa da transferência de votos feita por Lula e da ampla base que a popularidade do então presidente conseguiu manter gravitando em torno do PT. Mas, agora, como uma candidatura de Lula é coberta de incertezas e Dilma não se sente responsável pelos políticos que ajudaram a elegê-la nem demonstra paciência para aturá-los em seu gabinete ou chamar para uma sopinha no Alvorada — essa base começa a pensar em outro caminho longe do PT.
Por falar em caminhos…
É claro que essa migração não vai ocorrer da noite para o dia. Nem tampouco a base vai largar uma presidente com a popularidade gravitando em torno dos 80% para se lançar desde já nos braços seja de Aécio Neves ou de Eduardo Campos. Mas os dois são os nomes que hoje atraem os políticos, quando eles pensam no futuro — ou seja, sempre. E o poder de atração de um ou de outro dependerá do grau de felicidade da população com a presidente Dilma.
Os cenários de manutenção do status quo petista se dão em duas situações: se Dilma manter a sua popularidade nas alturas nos próximos dois anos e ela trabalha para isso, basta ver a reunião que manteve com empresários essa semana. Ou se Lula estiver em ponto de bala para uma campanha os petistas torcem mais por isso do que qualquer outra coisa. Se um ou outro não ocorrer, tchau mesmo. Hoje, nenhum aliado está ao lado de Dilma por amor à causa e os outros cenários são a torcida da base.
Por falar em torcida…
Na hipótese de a popularidade de Dilma ou de seu governo cair diante das confusões e da paralisia governamental, crescem Aécio Neves ou Eduardo Campos. Eles são hoje os queridos do mundo político, citados em todas as conversas de futuro. E não se iluda achando que não querem concorrer: ambos estão em movimento. Se o governo despencar ao ponto de os aliados queimarem caravelas, Aécio terá mais poder de atração sobre os partidos. Se ficar no meio-termo, estará mais para Eduardo Campos, que tem até a simpatia de Lula como plano B para os petistas, se Dilma perder a vontade de concorrer. E não se espante, leitor, se Aécio e Eduardo fizerem uma aliança, o que hoje ainda é improvável. Afinal, a política é a arte não só do possível, como de tornar possível até o que alguns consideram impossível. E pode ter certeza: os dois são talentosos nessa praia.
No mais…
A partir de hoje, a turma que não embarcou para Índia com Dilma estará dedicada a ver como seguirão os pedidos de CPIs. Dilma não quer nenhuma aberta. Nem o PT. Mas, você sabe como é, água em mole em pedra dura… Mas essa é outra história.
Se tem uma característica comum a todos os políticos, é o fato de tomar decisões hoje pensando no futuro distante. A maioria deles simplesmente não consegue exercitar a máxima “a cada dia a sua aflição”. Essa turma já vai logo pulando o calendário. E, quando veem uma crise política pela frente, esse pulo ultrapassa alguns anos. Especialmente, entre os deputados. Cientes de que têm o resto do mandato garantido, eles já estão pensando com quem se aliar na frente para obter o próximo. E, nesse sentido, ao se sentirem desprezados pela presidente Dilma, eles já começam se aquecer como parte da torcida de dois personagens ilustres da política atual: o senador Aécio Neves (PSDB-MG), considerado o nome mais forte da oposição hoje para concorrer ao Planalto, e o governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB-PE).
Os movimentos em direção a um e outro ainda são sutis. Mas existem e estão em todos os partidos da base aliada e não apenas dentro da óbvia oposição — PSDB, DEM e PPS —, talvez (apenas talvez!) engrossada por PR e outros partidos. O único que está fora desses cenários alternativos para o futuro, por enquanto, é o PT, que, detentor da presidência da República sob o comando de Dilma Rousseff, não tem como se mover em outras frentes. Não por acaso os ministros do PT são hoje os primeiros a sair a campo no sentido de estancar a crise política.
Por falar em PT…
Os petistas são os únicos que hoje não têm uma grande alternativa à presidente Dilma Rousseff. Precisam desesperadamente que Lula fique bom logo, plenamente recuperado para embalar multidões e, assim, ajudar o partido a criar outras lideranças. Hoje, eles têm plena consciência de que Dilma só ganhou a eleição por causa da transferência de votos feita por Lula e da ampla base que a popularidade do então presidente conseguiu manter gravitando em torno do PT. Mas, agora, como uma candidatura de Lula é coberta de incertezas e Dilma não se sente responsável pelos políticos que ajudaram a elegê-la nem demonstra paciência para aturá-los em seu gabinete ou chamar para uma sopinha no Alvorada — essa base começa a pensar em outro caminho longe do PT.
Por falar em caminhos…
É claro que essa migração não vai ocorrer da noite para o dia. Nem tampouco a base vai largar uma presidente com a popularidade gravitando em torno dos 80% para se lançar desde já nos braços seja de Aécio Neves ou de Eduardo Campos. Mas os dois são os nomes que hoje atraem os políticos, quando eles pensam no futuro — ou seja, sempre. E o poder de atração de um ou de outro dependerá do grau de felicidade da população com a presidente Dilma.
Os cenários de manutenção do status quo petista se dão em duas situações: se Dilma manter a sua popularidade nas alturas nos próximos dois anos e ela trabalha para isso, basta ver a reunião que manteve com empresários essa semana. Ou se Lula estiver em ponto de bala para uma campanha os petistas torcem mais por isso do que qualquer outra coisa. Se um ou outro não ocorrer, tchau mesmo. Hoje, nenhum aliado está ao lado de Dilma por amor à causa e os outros cenários são a torcida da base.
Por falar em torcida…
Na hipótese de a popularidade de Dilma ou de seu governo cair diante das confusões e da paralisia governamental, crescem Aécio Neves ou Eduardo Campos. Eles são hoje os queridos do mundo político, citados em todas as conversas de futuro. E não se iluda achando que não querem concorrer: ambos estão em movimento. Se o governo despencar ao ponto de os aliados queimarem caravelas, Aécio terá mais poder de atração sobre os partidos. Se ficar no meio-termo, estará mais para Eduardo Campos, que tem até a simpatia de Lula como plano B para os petistas, se Dilma perder a vontade de concorrer. E não se espante, leitor, se Aécio e Eduardo fizerem uma aliança, o que hoje ainda é improvável. Afinal, a política é a arte não só do possível, como de tornar possível até o que alguns consideram impossível. E pode ter certeza: os dois são talentosos nessa praia.
No mais…
A partir de hoje, a turma que não embarcou para Índia com Dilma estará dedicada a ver como seguirão os pedidos de CPIs. Dilma não quer nenhuma aberta. Nem o PT. Mas, você sabe como é, água em mole em pedra dura… Mas essa é outra história.
Paradoxos - LUIZ FERNANDO VERISSIMO
O ESTADÃO - 25/03/12
Nossa biografia, nossos amores e vexames, nossos sonhos e brotoejas – nada disso interessa ao DNA
Tem duas coisas que não batem com a teoria de Darwin sobre a evolução das espécies. Uma é o altruísmo, que desmente a tese de que a seleção natural se faz pela competição entre genes egoístas. Outra é o veneno, que desmente a tese de que os bichos desenvolvem seus mecanismos de ataque e defesa na luta pela sobrevivência, já que o bicho venenoso é venenoso desde os seus primeiros ancestrais e portanto já nasce pronto para a guerra química.
As formigas e as abelhas são os exemplos mais conhecidos de bichos sociais com um comportamento altruísta. Nascem com sua função e seu destino já programados e estes podem incluir o sacrifício do indivíduo pelo grupo. O próprio Darwin reconheceu o paradoxo do altruísmo, que intrigou a ciência durante muito tempo – tanto tempo que só na metade do século 20 começaram a estudar o fenômeno a sério.
Se, segundo Darwin, você, eu e a minhoca estamos no mundo para obedecer o nosso gene egoísta e sobreviver para poder transmiti-lo a nossa prole, como se explica o comportamento altruísta de espécies inteiras?
Uma explicação fascinante que surgiu é assim: nossa missão na vida é transportar o DNA que recebemos dos nossos pais, que receberam dos nossos avós e assim por diante, desde as primeiras amebas da família.
Tudo o que somos e o que fazemos, nossa biografia, nossos amores e vexames, nossos sonhos e brotoejas – nada disso interessa ao DNA. Ele só está nos usando como transporte. Quer segurança e quer ser passado adiante com eficiência, e o mínimo que espera de nós é que sejamos bons reprodutores para ele não perder a viagem.
E em comunidades endógamas como as das formigas e das abelhas, onde todo o mundo é irmão ou no máximo primo, os DNAs se parecem. Existe até o que poderia ser chamado de um DNA coletivo. Assim, os altruístas não estão renunciando à sua missão. Estão assegurando que o DNA do grupo será passado adiante, com seu sacrifício. É o determinismo darwiniano funcionando por outros meios.
A teoria do DNA coletivo não é universalmente aceita entre os biólogos, mas, que eu saiba, não apareceu outra tão razoável. Formigueiros e colmeias são exemplos inspiradores de altruísmo e divisão de tarefas, muito citados como modelos para a humanidade, mas é bom não esquecer que se trata de monarquias não-parlamentares e escravocratas – e ainda por cima matriarcados!
Quanto aos bichos venenosos, nada os explica. Só uma teoria da maldade intrínseca, de um mau caráter nato e entranhado. É inimaginável que sua espécie tenha desenvolvido seu poder peçonhento como outros animais desenvolveram carapaças ou disfarces para se proteger de predadores ou enganar presas.
Os venenosos não produzem seu veneno num processo de tentativa e erro, o que os enquadraria no grande drama da competição em que os bichos, através dos séculos, vão aperfeiçoando as suas armas para a sobrevivência.
Nunca precisaram testar o produto da sua alquimia interna – este veneno mata em segundos, este só paralisa, etc - antes de usá-lo. Já nascem sabendo o que podem. O que explica aquela empáfia da primeira serpente da Terra, na sua representação bíblica. Ela se sabia o Mal irresistível, e conhecia todos os seus próprios venenos. Que viesse a seleção natural do Darwin – ela estava pronta.
Nossa biografia, nossos amores e vexames, nossos sonhos e brotoejas – nada disso interessa ao DNA
Tem duas coisas que não batem com a teoria de Darwin sobre a evolução das espécies. Uma é o altruísmo, que desmente a tese de que a seleção natural se faz pela competição entre genes egoístas. Outra é o veneno, que desmente a tese de que os bichos desenvolvem seus mecanismos de ataque e defesa na luta pela sobrevivência, já que o bicho venenoso é venenoso desde os seus primeiros ancestrais e portanto já nasce pronto para a guerra química.
As formigas e as abelhas são os exemplos mais conhecidos de bichos sociais com um comportamento altruísta. Nascem com sua função e seu destino já programados e estes podem incluir o sacrifício do indivíduo pelo grupo. O próprio Darwin reconheceu o paradoxo do altruísmo, que intrigou a ciência durante muito tempo – tanto tempo que só na metade do século 20 começaram a estudar o fenômeno a sério.
Se, segundo Darwin, você, eu e a minhoca estamos no mundo para obedecer o nosso gene egoísta e sobreviver para poder transmiti-lo a nossa prole, como se explica o comportamento altruísta de espécies inteiras?
Uma explicação fascinante que surgiu é assim: nossa missão na vida é transportar o DNA que recebemos dos nossos pais, que receberam dos nossos avós e assim por diante, desde as primeiras amebas da família.
Tudo o que somos e o que fazemos, nossa biografia, nossos amores e vexames, nossos sonhos e brotoejas – nada disso interessa ao DNA. Ele só está nos usando como transporte. Quer segurança e quer ser passado adiante com eficiência, e o mínimo que espera de nós é que sejamos bons reprodutores para ele não perder a viagem.
E em comunidades endógamas como as das formigas e das abelhas, onde todo o mundo é irmão ou no máximo primo, os DNAs se parecem. Existe até o que poderia ser chamado de um DNA coletivo. Assim, os altruístas não estão renunciando à sua missão. Estão assegurando que o DNA do grupo será passado adiante, com seu sacrifício. É o determinismo darwiniano funcionando por outros meios.
A teoria do DNA coletivo não é universalmente aceita entre os biólogos, mas, que eu saiba, não apareceu outra tão razoável. Formigueiros e colmeias são exemplos inspiradores de altruísmo e divisão de tarefas, muito citados como modelos para a humanidade, mas é bom não esquecer que se trata de monarquias não-parlamentares e escravocratas – e ainda por cima matriarcados!
Quanto aos bichos venenosos, nada os explica. Só uma teoria da maldade intrínseca, de um mau caráter nato e entranhado. É inimaginável que sua espécie tenha desenvolvido seu poder peçonhento como outros animais desenvolveram carapaças ou disfarces para se proteger de predadores ou enganar presas.
Os venenosos não produzem seu veneno num processo de tentativa e erro, o que os enquadraria no grande drama da competição em que os bichos, através dos séculos, vão aperfeiçoando as suas armas para a sobrevivência.
Nunca precisaram testar o produto da sua alquimia interna – este veneno mata em segundos, este só paralisa, etc - antes de usá-lo. Já nascem sabendo o que podem. O que explica aquela empáfia da primeira serpente da Terra, na sua representação bíblica. Ela se sabia o Mal irresistível, e conhecia todos os seus próprios venenos. Que viesse a seleção natural do Darwin – ela estava pronta.
Sem medo da inflação - AMIR KHAIR
O ESTADÃO - 25/03/12
O fantasma da inflação começa a aparecer em algumas análises. Basta ensaiar alguma recuperação econômica que os guardiões da inflação começam a prever nuvens negras a caminho da retomada do processo inflacionário. O boletim Focus, porta-voz do mercado financeiro, prevê inflação de 5,27% para este ano e 5,50% para 2013. Prevê o PIB crescendo 3,3% neste ano e 4,2% para o próximo, ou seja, se crescer vai ter inflação. Essas previsões falham até para o próprio mês. Por exemplo, para este mês o Focus previu no dia 16 inflação de 0,49% e a prévia do IPCA no dia 22 deu 0,25%, metade! E ainda fazem previsão para 2013.
Esse fantasma é o principal causador do voo de galinha, que caracteriza a evolução da economia. Se há perspectiva de crescimento econômico essas análises propõem abatê-lo em prol da inflação. O pior é que essas análises têm dominado a formulação da política econômica. Quem as conduz é o Banco Central (BC) que, para combater a inflação, mantém o crédito restrito, com o depósito compulsório dos bancos no BC elevado, com Selic alta para valorizar o real, barateando os produtos importados e, não se preocupa com a agiotagem bancária, que corre solta no País.
A ameaça mais comum, que subsidia essas análises, é no uso da inflação dos serviços (médico, dentista, pedreiro, manicure, empregada doméstica, aluguel, etc.), que não sofre concorrência externa e, assim, tende a crescer acima da inflação medida pelo IPCA, caso o poder aquisitivo cresça. Preveem inflação de 9% neste ano para os serviços e daí concluem que a inflação irá crescer.
A análise mais completa da inflação envolve, além dos serviços, os preços dos produtos importados e os preços administrados (definidos pelo governo). Na composição do IPCA, metade é influenciada pelo preço do produto importado, 30% pelos preços administrados (combustíveis, energia elétrica, comunicações, tarifa de fornecimento de água, tarifa do transporte coletivo, etc.) e 20% pelo preço dos serviços. Assim, caso os serviços atinjam a inflação de 9% neste ano, irão contribuir com 1,8 ponto para a inflação (20% de 9%). Como os preços dos produtos importados estão estagnados desde março de 2011, devido à crise que atinge a Europa, é de se esperar contribuição nula ou no máximo de 1 ponto para a inflação. Os preços administrados, especialmente, em época eleitoral evoluem abaixo da inflação. Supondo que cresçam 4% neste ano sua contribuição para a inflação será de 1,2 ponto (30% de 4%). Assim, a inflação do ano seria, no máximo, de 4% (1,8 + 1,0 + 1,2).
É importante caracterizar a evolução e perspectiva desses componentes da inflação:
1. Preço dos produtos importados. Comparando com março de 2011 o preço dos produtos importados destinados ao consumo (bens não duráveis) caiu 6,0% e sua quantidade importada cresceu 10,0% e o preço das matérias primas, que impacta o custo da produção ficou estabilizado.
A razão disso reside no fato estar ocorrendo super oferta de produtos no mercado internacional, deprimindo seu preço. Isso é consequência da crise, que reduziu o poder aquisitivo da população dos países desenvolvidos, diminuiu o ritmo de crescimento da China e inundou o mercado de moedas emitidas pelos bancos centrais dos países desenvolvidos. O resultado foi uma alteração profunda no comércio internacional, elevando a pressão exportadora desses países para os países emergentes. A China irá manter essa pressão para compensar a redução de suas exportações aos países desenvolvidos e, enquanto sua política de priorizar o mercado interno não conseguir absorver a perda ocorrida. Os países desenvolvidos, como estão com mercado interno deprimido precisam exportar e para disso desvalorizaram suas moedas para ganhar competitividade na exportação. Esses são fatos que devem perdurar pelos próximos anos até a crise europeia permitir a retomada do crescimento da região.
Assim, o principal fator que influencia a inflação brasileira, que é o preço dos produtos importados, tende a ajudar a contê-la nos próximos anos.
2. Preços administrados. Independem do BC e obedecem a decisões governamentais. Desde 1995 até 2006 a inflação dos preços administrados foi superior à inflação medida pelo IPCA. A partir de 2007 isso se inverteu, sendo possível que esses preços passaram a ser mais bem controlados pelos governos federal, estaduais e municipais. Assim, neste e nos próximos anos, as perspectivas para os preços administrados são favoráveis para a contenção da inflação.
3. Serviços. Desde 1997 até 2004 os preços dos serviços tiveram reajuste abaixo do IPCA e a partir de 2005 a situação se inverteu, provavelmente pelo aumento do poder aquisitivo das pessoas, que passaram a demandar mais serviços. A perspectiva de crescer acima da inflação com o aumento do poder aquisitivo é provável, pois não estão sujeitos à concorrência internacional. Deve estar ocorrendo maior demanda do que oferta de serviços e isso pode sinalizar mais empresas entrando nesse setor elevando a oferta. Isso no médio prazo pode permitir um comportamento de preços dos serviços mais próximo do IPCA.
4. Intenção. O governo não pretende repetir o baixo crescimento de 2011 e, para isso, já removeu quase inteiramente as medidas macroprudenciais, que encareceram o crédito, e anunciou que irá reduzir a taxa de juro ao consumo de 106,9% ao ano em fevereiro, segundo a Associação Nacional de Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), usando o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal para estimular a precária concorrência bancária.
5. Perspectivas. Se o governo não ficar novamente refém do fantasma da inflação, poderá baixar a taxa de juro ao consumidor de 106,9% rumo a 10% que é a praticada nos países emergentes. Já anunciou que vai baixar, mas de quanto é o que importa. Com 106,9% ao ano de juro para o consumo, vê-se que fica reduzido à metade o poder de compra pelo crediário. Esse é o freio da economia, que precisa ser removido.
Recompor uma parte da perda desse poder aquisitivo irá ativar o consumo, expandir o comércio e daí aumentar a produção e o investimento. O caminho natural é esse e não o contrário, implorando aos empresários para investir se eles não esperam perspectiva de crescimento do consumo.
Chega de ser pilotado pelo fantasma da inflação, que vem impedindo o deslanche natural da economia. É necessário que o governo atue rápido e com força para a redução da taxa de juro dos bancos. Caso isso ocorra creio que está garantido a abertura da estrada para usufruir do nível de crescimento que o País precisa. Vamos acompanhar.
O fantasma da inflação começa a aparecer em algumas análises. Basta ensaiar alguma recuperação econômica que os guardiões da inflação começam a prever nuvens negras a caminho da retomada do processo inflacionário. O boletim Focus, porta-voz do mercado financeiro, prevê inflação de 5,27% para este ano e 5,50% para 2013. Prevê o PIB crescendo 3,3% neste ano e 4,2% para o próximo, ou seja, se crescer vai ter inflação. Essas previsões falham até para o próprio mês. Por exemplo, para este mês o Focus previu no dia 16 inflação de 0,49% e a prévia do IPCA no dia 22 deu 0,25%, metade! E ainda fazem previsão para 2013.
Esse fantasma é o principal causador do voo de galinha, que caracteriza a evolução da economia. Se há perspectiva de crescimento econômico essas análises propõem abatê-lo em prol da inflação. O pior é que essas análises têm dominado a formulação da política econômica. Quem as conduz é o Banco Central (BC) que, para combater a inflação, mantém o crédito restrito, com o depósito compulsório dos bancos no BC elevado, com Selic alta para valorizar o real, barateando os produtos importados e, não se preocupa com a agiotagem bancária, que corre solta no País.
A ameaça mais comum, que subsidia essas análises, é no uso da inflação dos serviços (médico, dentista, pedreiro, manicure, empregada doméstica, aluguel, etc.), que não sofre concorrência externa e, assim, tende a crescer acima da inflação medida pelo IPCA, caso o poder aquisitivo cresça. Preveem inflação de 9% neste ano para os serviços e daí concluem que a inflação irá crescer.
A análise mais completa da inflação envolve, além dos serviços, os preços dos produtos importados e os preços administrados (definidos pelo governo). Na composição do IPCA, metade é influenciada pelo preço do produto importado, 30% pelos preços administrados (combustíveis, energia elétrica, comunicações, tarifa de fornecimento de água, tarifa do transporte coletivo, etc.) e 20% pelo preço dos serviços. Assim, caso os serviços atinjam a inflação de 9% neste ano, irão contribuir com 1,8 ponto para a inflação (20% de 9%). Como os preços dos produtos importados estão estagnados desde março de 2011, devido à crise que atinge a Europa, é de se esperar contribuição nula ou no máximo de 1 ponto para a inflação. Os preços administrados, especialmente, em época eleitoral evoluem abaixo da inflação. Supondo que cresçam 4% neste ano sua contribuição para a inflação será de 1,2 ponto (30% de 4%). Assim, a inflação do ano seria, no máximo, de 4% (1,8 + 1,0 + 1,2).
É importante caracterizar a evolução e perspectiva desses componentes da inflação:
1. Preço dos produtos importados. Comparando com março de 2011 o preço dos produtos importados destinados ao consumo (bens não duráveis) caiu 6,0% e sua quantidade importada cresceu 10,0% e o preço das matérias primas, que impacta o custo da produção ficou estabilizado.
A razão disso reside no fato estar ocorrendo super oferta de produtos no mercado internacional, deprimindo seu preço. Isso é consequência da crise, que reduziu o poder aquisitivo da população dos países desenvolvidos, diminuiu o ritmo de crescimento da China e inundou o mercado de moedas emitidas pelos bancos centrais dos países desenvolvidos. O resultado foi uma alteração profunda no comércio internacional, elevando a pressão exportadora desses países para os países emergentes. A China irá manter essa pressão para compensar a redução de suas exportações aos países desenvolvidos e, enquanto sua política de priorizar o mercado interno não conseguir absorver a perda ocorrida. Os países desenvolvidos, como estão com mercado interno deprimido precisam exportar e para disso desvalorizaram suas moedas para ganhar competitividade na exportação. Esses são fatos que devem perdurar pelos próximos anos até a crise europeia permitir a retomada do crescimento da região.
Assim, o principal fator que influencia a inflação brasileira, que é o preço dos produtos importados, tende a ajudar a contê-la nos próximos anos.
2. Preços administrados. Independem do BC e obedecem a decisões governamentais. Desde 1995 até 2006 a inflação dos preços administrados foi superior à inflação medida pelo IPCA. A partir de 2007 isso se inverteu, sendo possível que esses preços passaram a ser mais bem controlados pelos governos federal, estaduais e municipais. Assim, neste e nos próximos anos, as perspectivas para os preços administrados são favoráveis para a contenção da inflação.
3. Serviços. Desde 1997 até 2004 os preços dos serviços tiveram reajuste abaixo do IPCA e a partir de 2005 a situação se inverteu, provavelmente pelo aumento do poder aquisitivo das pessoas, que passaram a demandar mais serviços. A perspectiva de crescer acima da inflação com o aumento do poder aquisitivo é provável, pois não estão sujeitos à concorrência internacional. Deve estar ocorrendo maior demanda do que oferta de serviços e isso pode sinalizar mais empresas entrando nesse setor elevando a oferta. Isso no médio prazo pode permitir um comportamento de preços dos serviços mais próximo do IPCA.
4. Intenção. O governo não pretende repetir o baixo crescimento de 2011 e, para isso, já removeu quase inteiramente as medidas macroprudenciais, que encareceram o crédito, e anunciou que irá reduzir a taxa de juro ao consumo de 106,9% ao ano em fevereiro, segundo a Associação Nacional de Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), usando o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal para estimular a precária concorrência bancária.
5. Perspectivas. Se o governo não ficar novamente refém do fantasma da inflação, poderá baixar a taxa de juro ao consumidor de 106,9% rumo a 10% que é a praticada nos países emergentes. Já anunciou que vai baixar, mas de quanto é o que importa. Com 106,9% ao ano de juro para o consumo, vê-se que fica reduzido à metade o poder de compra pelo crediário. Esse é o freio da economia, que precisa ser removido.
Recompor uma parte da perda desse poder aquisitivo irá ativar o consumo, expandir o comércio e daí aumentar a produção e o investimento. O caminho natural é esse e não o contrário, implorando aos empresários para investir se eles não esperam perspectiva de crescimento do consumo.
Chega de ser pilotado pelo fantasma da inflação, que vem impedindo o deslanche natural da economia. É necessário que o governo atue rápido e com força para a redução da taxa de juro dos bancos. Caso isso ocorra creio que está garantido a abertura da estrada para usufruir do nível de crescimento que o País precisa. Vamos acompanhar.
Chávez em Cuba ou Cuba em Chávez - YOANI SÁNCHEZ
O ESTADÃO - 25/03/12
"Essas são as últimas balinhas! Portanto, aproveitem!", gritou Olga - apelidada de La Guajira - no dormitório da nossa escola do ensino médio, no interior. Minha colega de quarto revendia os alimentos que ganhava dos técnicos soviéticos que os compravam nas lojas onde os cubanos não eram admitidos. Estávamos nos últimos meses de 1990 e a comunidade de "camaradas" russos que se misturava à realidade cubana começava a fazer as malas. Por toda a cidade, numerosas casas ficavam vazias diante do êxodo desses moradores estrangeiros, enquanto definhava o mercado negro fomentado por eles. Aquela guloseima embrulhada num papel tosco foi para mim o primeiro sinal de que o subsídio enviado pela URSS seria cortado abruptamente. O arauto das más notícias apresentou-se ao meu paladar jovem na forma de um doce que se perdia para sempre.
Mais de 20 anos depois, há indícios um tanto amargos de outro possível colapso material. Desta vez, o risco não emana do Kremlin e sim de um palácio mais próximo, o de Miraflores. Hugo Chávez esteve em Cuba e são tecidas infinitas especulações envolvendo a saúde dele, assim como alguns alarmantes cenários futuros. Os mais de 100 mil barris diários de petróleo que importamos da Venezuela poderiam desaparecer tão rápido quanto um doce se desfazendo na boca caso o presidente deste país morra.
Nas ruas de Havana, as perguntas vão além da morbidez dos termos médicos, convertendo-se em preocupantes previsões para o futuro. Uma mulher cujo rosto exibe os traços do desgaste cotidiano diz brevemente a outra: "Se algo ocorrer com Chávez, voltaremos a outro período especial". E a ênfase que ela aplica a cada sílaba me lembra daquela adolescente anunciando os últimos doces enviados da União Soviética. A história é mesmo cheia de caprichos, repetindo-se às vezes coberta de mel e, às vezes, de fel.
Tivemos a dolorosa oportunidade de aprender - como país - a lição da dependência; de termos prometido a nós mesmos que nunca mais deixaríamos o futuro dessa ilha depender de um presidente estrangeiro ou de um partido estrangeiro. Mas, no início de 1999, quando Hugo Chávez assumiu o poder, tornou-se claro que a autonomia econômica seria apenas uma fantasia nacional adiada de novo e de novo. O desequilibrado intercâmbio comercial entre Cuba e Venezuela permitiu que o governo de Raúl Castro evitasse o colapso apesar da improdutividade do país. Mesmo assim, esse subsídio também produz uma alarmante fragilidade, pois pode ser cortado a qualquer momento.
O importantíssimo paciente operado em Havana representa a principal garantia de que as reformas de Raúl possam manter seu tímido ritmo de avanço e o objetivo da permanência no poder. Mostrar Chávez na televisão e anunciar nos jornais sua pronta recuperação é como apresentar uma prova de que o castrismo segue vivo. Quando nos apresentam o rosto sorridente do presidente venezuelano, não esperam que leiamos nos traços dele apenas o estado de saúde de um homem, mas também o prognóstico político de dois países. É por isso que a propaganda oficial se mostra ansiosa em associar a suposta "vitória" de Chávez sobre o tumor físico com o triunfo de uma ideologia.
Os líderes sustentados e os regimes subsidiados têm a falsa ilusão de que poderão aprender a viver sem seus mecenas. Alardeiam que serão capazes de dar seus passos por conta própria uma vez que chegue ao fim o apoio vindo de fora. Na realidade, durante o longo período da dependência eles só aprenderam a buscar uma nova fonte da qual beber, um novo sócio para espoliar. Sua disfunção econômica não pode ser reparada no intervalo de tempo durante o qual as células malignas avançam por um organismo. Um sistema no qual a ineficiência produziu uma metástase até na produção de batatas, tijolos e detergente sabe que cada passo dado sozinho é um passo em direção ao fim. Fica assim claro que Chávez veio a Cuba para tratar de sua enfermidade física porque as garantias de discrição a respeito do sua saúde são também garantias de silêncio a respeito do estado real de Cuba.
Assim sendo, cá estamos nós outra vez, numa situação que conhecemos bem. Cai o Muro de Berlim ou então instala-se o câncer no corpo de um homem. A glasnost revela o lixo de 70 anos ou um médico comete uma imprudência com um paciente. Uma jovem adverte que os doces made in URSS se acabarão em breve ou uma senhora desiludida comenta a possibilidade de outro colapso material. Um presidente vê como o mapa de um bloco político se desfaz ou um líder cada vez mais enfraquecido olha assustado para o laudo de um exame.
Da fala ao grunhido - FERREIRA GULLAR
FOLHA DE SP - 25/03/12
De que adianta escrever o que escrevo aqui se a televisão continuará a difundir a fala errada?
DESCONFIO QUE, depois de desfrutar durante quase toda a vida da fama de rebelde, estou sendo tido, por certa gente, como conservador e reacionário. Não ligo para isso e até me divirto, lembrando a célebre frase de Millôr Fernandes, segundo o qual "todo mundo começa Rimbaud e acaba Olegário Mariano".
Divirto-me porque sei que a coisa é mais complicada do que parece e, fiel ao que sempre fui, não aceito nada sem antes pesar e examinar. Hoje é comum ser a favor de tudo o que, ontem, era contestado. Por exemplo, quando ser de esquerda dava cadeia, só alguns poucos assumiam essa posição; já agora, quando dá até emprego, todo mundo se diz de esquerda.
De minha parte, pouco se me dá se o que afirmo merece essa ou aquela qualificação, pois o que me importa é se é correto e verdadeiro. Posso estar errado ou certo, claro, mas não por conveniência. Está, portanto, implícito que não me considero dono da verdade, que nem sempre tenho razão porque há questões complexas demais para meu entendimento. Por isso, às vezes, se não concordo, fico em dúvida, a me perguntar se estou certo ou não.
Cito um exemplo. Outro dia, ouvi um professor de português afirmar que, em matéria de idioma, não existe certo nem errado, ou seja, tudo está certo. Tanto faz dizer "nós vamos" como "nós vai".
Ouço isso e penso: que sujeito bacana, tão modesto que é capaz de sugerir que seu saber de nada vale. Mas logo me indago: será que ele pensa isso mesmo ou está posando de bacana, de avançadinho?
E se faço essa pergunta é porque me parece incongruente alguém cuja profissão é ensinar o idioma afirmar que não há erros. Se está certo dizer "dois mais dois é cinco", então a regra gramatical, que determina a concordância do verbo com o sujeito, não vale. E, se não vale essa nem nenhuma outra -uma vez que tudo está certo-, não há por que ensinar a língua.
A conclusão inevitável é que o professor deveria mudar de profissão porque, se acredita que as regras não valem, não há o que ensinar.
Mas esse vale-tudo é só no campo do idioma, não se adota nos demais campos do conhecimento. Não vejo um professor de medicina afirmando que a tuberculose não é doença, mas um modo diferente de saúde, e que o melhor para o pulmão é fumar charutos.
É verdade que ninguém morre por falar errado, mas, certamente, dizendo "nós vai" e desconhecendo as normas da língua, nunca entrará para a universidade, como entrou o nosso professor.
Devo concluir que gente pobre tem mesmo que falar errado, não estudar, não conhecer ciência e literatura? Ou isso é uma espécie de democratismo que confunde opinião crítica com preconceito?
As minorias, que eram injustamente discriminadas no passado, agora estão acima do bem e do mal. Discordar disso é preconceituoso e reacionário.
E, assim como para essa gente avançada não existe certo nem errado, não posso estranhar que a locutora da televisão diga "as milhares de pessoas" ou "estudou sobre as questões" ou "debateu sobre as alternativas" em vez de "os milhares de pessoas", " estudou as questões" e "debateu as alternativas".
A palavra "sobre" virou uma mania dos locutores de televisão, que a usam como regência de todos os verbos e em todas as ocasiões imagináveis.
Sei muito bem que a língua muda com o passar do tempo e que, por isso mesmo, o português de hoje não é igual ao de Camões e nem mesmo ao de Machado de Assis, bem mais próximo de nós.
Uma coisa, porém, é usar certas palavras com significados diferentes, construir frases de outro modo ou mudar a regência de certos verbos. Coisa muito distinta é falar contra a lógica natural do idioma ou simplesmente cometer erros gramaticais primários.
Mas a impressão que tenho é de que estou malhando em ferro frio. De que adianta escrever essas coisas que escrevo aqui se a televisão continuará a difundir a fala errada cem vezes por hora para milhões de telespectadores?
Pode o leitor alegar que a época é outra, mais dinâmica, e que a globalização tende a misturar as línguas como nunca ocorreu antes. Isso de falar correto é coisa velha, e o que importa é que as pessoas se entendam, ainda que apenas grunhindo.
De que adianta escrever o que escrevo aqui se a televisão continuará a difundir a fala errada?
DESCONFIO QUE, depois de desfrutar durante quase toda a vida da fama de rebelde, estou sendo tido, por certa gente, como conservador e reacionário. Não ligo para isso e até me divirto, lembrando a célebre frase de Millôr Fernandes, segundo o qual "todo mundo começa Rimbaud e acaba Olegário Mariano".
Divirto-me porque sei que a coisa é mais complicada do que parece e, fiel ao que sempre fui, não aceito nada sem antes pesar e examinar. Hoje é comum ser a favor de tudo o que, ontem, era contestado. Por exemplo, quando ser de esquerda dava cadeia, só alguns poucos assumiam essa posição; já agora, quando dá até emprego, todo mundo se diz de esquerda.
De minha parte, pouco se me dá se o que afirmo merece essa ou aquela qualificação, pois o que me importa é se é correto e verdadeiro. Posso estar errado ou certo, claro, mas não por conveniência. Está, portanto, implícito que não me considero dono da verdade, que nem sempre tenho razão porque há questões complexas demais para meu entendimento. Por isso, às vezes, se não concordo, fico em dúvida, a me perguntar se estou certo ou não.
Cito um exemplo. Outro dia, ouvi um professor de português afirmar que, em matéria de idioma, não existe certo nem errado, ou seja, tudo está certo. Tanto faz dizer "nós vamos" como "nós vai".
Ouço isso e penso: que sujeito bacana, tão modesto que é capaz de sugerir que seu saber de nada vale. Mas logo me indago: será que ele pensa isso mesmo ou está posando de bacana, de avançadinho?
E se faço essa pergunta é porque me parece incongruente alguém cuja profissão é ensinar o idioma afirmar que não há erros. Se está certo dizer "dois mais dois é cinco", então a regra gramatical, que determina a concordância do verbo com o sujeito, não vale. E, se não vale essa nem nenhuma outra -uma vez que tudo está certo-, não há por que ensinar a língua.
A conclusão inevitável é que o professor deveria mudar de profissão porque, se acredita que as regras não valem, não há o que ensinar.
Mas esse vale-tudo é só no campo do idioma, não se adota nos demais campos do conhecimento. Não vejo um professor de medicina afirmando que a tuberculose não é doença, mas um modo diferente de saúde, e que o melhor para o pulmão é fumar charutos.
É verdade que ninguém morre por falar errado, mas, certamente, dizendo "nós vai" e desconhecendo as normas da língua, nunca entrará para a universidade, como entrou o nosso professor.
Devo concluir que gente pobre tem mesmo que falar errado, não estudar, não conhecer ciência e literatura? Ou isso é uma espécie de democratismo que confunde opinião crítica com preconceito?
As minorias, que eram injustamente discriminadas no passado, agora estão acima do bem e do mal. Discordar disso é preconceituoso e reacionário.
E, assim como para essa gente avançada não existe certo nem errado, não posso estranhar que a locutora da televisão diga "as milhares de pessoas" ou "estudou sobre as questões" ou "debateu sobre as alternativas" em vez de "os milhares de pessoas", " estudou as questões" e "debateu as alternativas".
A palavra "sobre" virou uma mania dos locutores de televisão, que a usam como regência de todos os verbos e em todas as ocasiões imagináveis.
Sei muito bem que a língua muda com o passar do tempo e que, por isso mesmo, o português de hoje não é igual ao de Camões e nem mesmo ao de Machado de Assis, bem mais próximo de nós.
Uma coisa, porém, é usar certas palavras com significados diferentes, construir frases de outro modo ou mudar a regência de certos verbos. Coisa muito distinta é falar contra a lógica natural do idioma ou simplesmente cometer erros gramaticais primários.
Mas a impressão que tenho é de que estou malhando em ferro frio. De que adianta escrever essas coisas que escrevo aqui se a televisão continuará a difundir a fala errada cem vezes por hora para milhões de telespectadores?
Pode o leitor alegar que a época é outra, mais dinâmica, e que a globalização tende a misturar as línguas como nunca ocorreu antes. Isso de falar correto é coisa velha, e o que importa é que as pessoas se entendam, ainda que apenas grunhindo.
Perigo anunciado - DANUZA LEÃO
FOLHA DE SP - 25/03/12
Se já tem tanta violência, imagine uma briga por um impedimento mal marcado, com os torcedores bebendo
AFINAL, OS torcedores vão poder beber sua cervejinha nos estádios durante a Copa, sim ou não?
O problema entre a base aliada e a oposição, Código Florestal etc., é uma coisa, mas vamos falar de outra: o compromisso que o governo assinou com a Fifa, liberando a venda de bebida alcoólica nos estádios durante a Copa.
Se já acontece tanta violência entre as torcidas em tempos normais, imagine uma briga por um impedimento mal marcado, com os torcedores bebendo. Mas os dirigentes da Fifa e da cervejaria patrocinadora não estão nem aí, é apenas um problema de $$, e a responsabilidade sobre qualquer tumulto será totalmente do governo.
O Brasil tem que honrar o compromisso que assinou? Tem. Mas foi certo ter concordado com a liberação da bebida? No meu entender, não. E por que então assinou? Porque a Fifa quis, porque a cervejaria que patrocina quis, e as autoridades brasileiras não tiveram coragem de dizer não. O Brasil quis posar de bacana, sediar a Copa e a Olimpíada mostraria ao mundo como somos importantes etc. etc. Que herança, hein, presidente Dilma?
Os que são a favor da medida argumentam dizendo que até o Qatar, país onde é proibida a bebida alcoólica e que será sede da Copa de 2022 -a escolha aconteceu em meio a escândalos de suborno, propinas etc.-, aceitou que o álcool role durante os jogos; pois fez muito mal o Qatar.
Por duas vezes a Fifa foi deselegante com o Brasil -para não dizer moleque. A primeira quando Valcke, seu secretário-geral, disse que o Brasil precisava levar um chute no traseiro para agilizar as obras e garantir a aprovação da Lei Geral da Copa; ele até tem razão, mas escolheu mal as palavras. Dilma não gostou, o ministro Aldo Rebelo declarou que não aceitaria mais Valcke como interlocutor e até pediu que ele fosse trocado. Valcke se defendeu dizendo que foi erro de tradução.
A segunda foi quando, dias depois de ter sido recebido por Dilma, Blatter confirmou que Valcke continua não só como secretário-geral do evento, mas como responsável pela organização da Copa -é o homem forte do Mundial.
Aguarda-se agora a próxima visita de Valcke ao Brasil, considerado persona non grata pelo ministro do Esporte, Aldo Rebelo.
No nosso país a corrupção nas licitações é normal; quando uma obra atrasa -e as obras da Copa estão atrasadíssimas-, tem que ser feita em caráter emergencial, e esse é o caminho mais curto para roubalheiras escandalosas, o que saberemos pela imprensa, claro.
Vamos nos preparar para ouvir que nunca se roubou tanto nesse país, e só quero ver o que vão achar os torcedores quando souberem o quanto vão ter que pagar para verem um jogo em outra cidade; a passagem aérea no Brasil é a mais cara do mundo, uma Rio/SP/Rio custa em volta de R$ 1.000.
Torcida de futebol com álcool liberado é uma dobradinha que não pode dar certo. Não ter enfrentado a Fifa e dizer um solene NÃO, quanto à liberação das bebidas, foi fruto de nosso complexo de vira-lata. E ninguém sabe o que mais foi combinado -e assinado- entre o Brasil e a Fifa, que se acha a dona do mundo.
O Carnaval hoje é totalmente dominado pelas cervejarias; agora elas começam a mandar também no futebol.
Se já tem tanta violência, imagine uma briga por um impedimento mal marcado, com os torcedores bebendo
AFINAL, OS torcedores vão poder beber sua cervejinha nos estádios durante a Copa, sim ou não?
O problema entre a base aliada e a oposição, Código Florestal etc., é uma coisa, mas vamos falar de outra: o compromisso que o governo assinou com a Fifa, liberando a venda de bebida alcoólica nos estádios durante a Copa.
Se já acontece tanta violência entre as torcidas em tempos normais, imagine uma briga por um impedimento mal marcado, com os torcedores bebendo. Mas os dirigentes da Fifa e da cervejaria patrocinadora não estão nem aí, é apenas um problema de $$, e a responsabilidade sobre qualquer tumulto será totalmente do governo.
O Brasil tem que honrar o compromisso que assinou? Tem. Mas foi certo ter concordado com a liberação da bebida? No meu entender, não. E por que então assinou? Porque a Fifa quis, porque a cervejaria que patrocina quis, e as autoridades brasileiras não tiveram coragem de dizer não. O Brasil quis posar de bacana, sediar a Copa e a Olimpíada mostraria ao mundo como somos importantes etc. etc. Que herança, hein, presidente Dilma?
Os que são a favor da medida argumentam dizendo que até o Qatar, país onde é proibida a bebida alcoólica e que será sede da Copa de 2022 -a escolha aconteceu em meio a escândalos de suborno, propinas etc.-, aceitou que o álcool role durante os jogos; pois fez muito mal o Qatar.
Por duas vezes a Fifa foi deselegante com o Brasil -para não dizer moleque. A primeira quando Valcke, seu secretário-geral, disse que o Brasil precisava levar um chute no traseiro para agilizar as obras e garantir a aprovação da Lei Geral da Copa; ele até tem razão, mas escolheu mal as palavras. Dilma não gostou, o ministro Aldo Rebelo declarou que não aceitaria mais Valcke como interlocutor e até pediu que ele fosse trocado. Valcke se defendeu dizendo que foi erro de tradução.
A segunda foi quando, dias depois de ter sido recebido por Dilma, Blatter confirmou que Valcke continua não só como secretário-geral do evento, mas como responsável pela organização da Copa -é o homem forte do Mundial.
Aguarda-se agora a próxima visita de Valcke ao Brasil, considerado persona non grata pelo ministro do Esporte, Aldo Rebelo.
No nosso país a corrupção nas licitações é normal; quando uma obra atrasa -e as obras da Copa estão atrasadíssimas-, tem que ser feita em caráter emergencial, e esse é o caminho mais curto para roubalheiras escandalosas, o que saberemos pela imprensa, claro.
Vamos nos preparar para ouvir que nunca se roubou tanto nesse país, e só quero ver o que vão achar os torcedores quando souberem o quanto vão ter que pagar para verem um jogo em outra cidade; a passagem aérea no Brasil é a mais cara do mundo, uma Rio/SP/Rio custa em volta de R$ 1.000.
Torcida de futebol com álcool liberado é uma dobradinha que não pode dar certo. Não ter enfrentado a Fifa e dizer um solene NÃO, quanto à liberação das bebidas, foi fruto de nosso complexo de vira-lata. E ninguém sabe o que mais foi combinado -e assinado- entre o Brasil e a Fifa, que se acha a dona do mundo.
O Carnaval hoje é totalmente dominado pelas cervejarias; agora elas começam a mandar também no futebol.
A Copa e os leões africanos - CARLOS HEITOR CONY
FOLHA DE SP - 25/03/12
RIO DE JANEIRO - Faltam ainda dois anos para a Copa de 2014 e, de minha parte, declaro que já estou de saco cheio de tudo o que está sendo discutido, prometido, negado e negociado a respeito dela.
Em 1950, na Copa daquele ano que marcou a inauguração do estádio Mário Filho, houve mais trabalho do que conversa para enxugar gelo. Lembro o violento debate na Câmara Municipal entre os vereadores Carlos Lacerda, que desejava o estádio em Jacarepaguá, e Ary Barroso, que lutou e venceu pelo Maracanã.
Mas o assunto foi resolvido a tempo e a hora sem encher a paciência de ninguém. Daqui a pouco, antes mesmo da Copa, todo mundo estará tão farto dela que acreditará no absurdo: mesmo sem ter sido realizada, ela já aconteceu, todos falarão em antes e depois da Copa, no gol de Neymar contra a Argentina e na expulsão de Ronaldinho Gaúcho.
Coisas muito anunciadas não precisam acontecer. Há o caso de Tartarin, personagem de Alphonse Daudet, presidente de um clube de caça em Tarascon, sul da França. Ele avisou que iria caçar leões na África, passava as noites com os sócios do clube, explicava as dificuldades, os perigos, a fúria dos animais que se recusavam a serem caçados.
Passaram-se exatos dois anos em que Tartarin, todas as noites, vinha com novidades, os preparativos, as armas, as tendas a serem montadas nas vastidões africanas.
Até que um dia, sem qualquer combinação prévia, toda a Tarascon acreditou que Tartarin já tinha ido caçar leões e já voltara, coberto de glória e troféus.
No início, o próprio Tartarin ficou meio desconfiado, mas acabou aceitando como fato consumado sua heroica façanha. Todas as noites, no clube de caça, os tarasconeses se reuniam para ouvir as fantásticas aventuras de Tartarin contra os leões.
RIO DE JANEIRO - Faltam ainda dois anos para a Copa de 2014 e, de minha parte, declaro que já estou de saco cheio de tudo o que está sendo discutido, prometido, negado e negociado a respeito dela.
Em 1950, na Copa daquele ano que marcou a inauguração do estádio Mário Filho, houve mais trabalho do que conversa para enxugar gelo. Lembro o violento debate na Câmara Municipal entre os vereadores Carlos Lacerda, que desejava o estádio em Jacarepaguá, e Ary Barroso, que lutou e venceu pelo Maracanã.
Mas o assunto foi resolvido a tempo e a hora sem encher a paciência de ninguém. Daqui a pouco, antes mesmo da Copa, todo mundo estará tão farto dela que acreditará no absurdo: mesmo sem ter sido realizada, ela já aconteceu, todos falarão em antes e depois da Copa, no gol de Neymar contra a Argentina e na expulsão de Ronaldinho Gaúcho.
Coisas muito anunciadas não precisam acontecer. Há o caso de Tartarin, personagem de Alphonse Daudet, presidente de um clube de caça em Tarascon, sul da França. Ele avisou que iria caçar leões na África, passava as noites com os sócios do clube, explicava as dificuldades, os perigos, a fúria dos animais que se recusavam a serem caçados.
Passaram-se exatos dois anos em que Tartarin, todas as noites, vinha com novidades, os preparativos, as armas, as tendas a serem montadas nas vastidões africanas.
Até que um dia, sem qualquer combinação prévia, toda a Tarascon acreditou que Tartarin já tinha ido caçar leões e já voltara, coberto de glória e troféus.
No início, o próprio Tartarin ficou meio desconfiado, mas acabou aceitando como fato consumado sua heroica façanha. Todas as noites, no clube de caça, os tarasconeses se reuniam para ouvir as fantásticas aventuras de Tartarin contra os leões.
Desalento - ELIANE CANTANHÊDE
FOLHA DE SP - 25/03/12
BRASÍLIA - Difícil descrever o estado de ânimo dos senadores estreantes Pedro Taques (PDT-MT) e Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) diante das relações perigosas do colega Demóstenes Torres (DEM-GO) com o bicheiro Carlinhos Cachoeira.
Perplexidade? Decepção? Irritação? Talvez um pouco de tudo isso.
Taques, procurador, e Randolfe, senador mais jovem (38 anos) e professor de direito constitucional, formavam um trio com o veterano Demóstenes, promotor. Eles conhecem o sistema, apresentavam projetos, sugeriam mudanças. Para dar nisso?
O "ético" Demóstenes tem de explicar três mimos recebidos de Cachoeira. Primeiro, o fogão e a geladeira importados, de presente de casamento. Depois, um telefone Nextel, aparentemente imune a grampos (para fugir da polícia?). Agora, o pedido de R$ 3.000 para pagar o aluguel de um jatinho.
Isso, de um lado. Do outro, a PF gravou conversas em que, segundo seus relatórios, Demóstenes repassava informações sigilosas para o amigão bicheiro -que, aliás, está preso. Fechando as duas pontas, tudo indica intimidade e sugere toma lá dá cá.
Com os políticos sob profundo descrédito, o Congresso em pé de guerra com o governo, Dilma mais ocupada em reuniões com empresários, Demóstenes é mais um que cai, deixando um rastro de desânimo.
Pedro Taques e Randolfe, como muitos de variados partidos, candidataram-se e elegeram-se com o discurso de que a política move o mundo e transforma a realidade. Mas estão vendo, na prática, que o poder também corrompe e deforma.
Multiplicam-se as histórias de jovens promissores e idealistas que se desvirtuaram tanto a ponto de se tornarem irreconhecíveis até no próprio espelho.
Demóstenes coloca Taques, Randolfe e um punhado de estreantes diante de três opções: resistir bravamente, desistir da política ou aderir ao jogo -como a maioria.
BRASÍLIA - Difícil descrever o estado de ânimo dos senadores estreantes Pedro Taques (PDT-MT) e Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) diante das relações perigosas do colega Demóstenes Torres (DEM-GO) com o bicheiro Carlinhos Cachoeira.
Perplexidade? Decepção? Irritação? Talvez um pouco de tudo isso.
Taques, procurador, e Randolfe, senador mais jovem (38 anos) e professor de direito constitucional, formavam um trio com o veterano Demóstenes, promotor. Eles conhecem o sistema, apresentavam projetos, sugeriam mudanças. Para dar nisso?
O "ético" Demóstenes tem de explicar três mimos recebidos de Cachoeira. Primeiro, o fogão e a geladeira importados, de presente de casamento. Depois, um telefone Nextel, aparentemente imune a grampos (para fugir da polícia?). Agora, o pedido de R$ 3.000 para pagar o aluguel de um jatinho.
Isso, de um lado. Do outro, a PF gravou conversas em que, segundo seus relatórios, Demóstenes repassava informações sigilosas para o amigão bicheiro -que, aliás, está preso. Fechando as duas pontas, tudo indica intimidade e sugere toma lá dá cá.
Com os políticos sob profundo descrédito, o Congresso em pé de guerra com o governo, Dilma mais ocupada em reuniões com empresários, Demóstenes é mais um que cai, deixando um rastro de desânimo.
Pedro Taques e Randolfe, como muitos de variados partidos, candidataram-se e elegeram-se com o discurso de que a política move o mundo e transforma a realidade. Mas estão vendo, na prática, que o poder também corrompe e deforma.
Multiplicam-se as histórias de jovens promissores e idealistas que se desvirtuaram tanto a ponto de se tornarem irreconhecíveis até no próprio espelho.
Demóstenes coloca Taques, Randolfe e um punhado de estreantes diante de três opções: resistir bravamente, desistir da política ou aderir ao jogo -como a maioria.
Jacaré e cobra d"água - DORA KRAMER
O ESTADÃO - 25/03/12
A cada eleição fica pior: os partidos se juntam em alianças desprovidas de sentido programático, presididas exclusivamente pelo afã de conquistar tempo de televisão na propaganda eleitoral obrigatória.
Com isso instala-se um ambiente onde vale tudo. Só não vale o respeito ao direito de escolha do eleitor. Chega às urnas às tontas, privado que foi durante as campanhas do embate coerente de conteúdo. Instrumento essencial para a confrontação de propósitos, ideias e modos de agir de cada um dos partidos ou candidatos.
A consequência mais visível, e danosa, é o aumento da rejeição à política, atividade por meio da qual se exerce a democracia. Ou pelo menos deveria ser exercida tal como é entendida no conceito maior de República.
No Brasil de exotismos partidários não é assim: a sociedade acaba sendo mera espectadora de um jogo cujo roteiro original lhe reservava o papel principal.
Digam com franqueza o senhor e a senhora alheios ao ofício da militância cega se são capazes de distinguir, no mérito, as propostas que os partidos apresentam para as próximas eleições municipais ou se conseguem compreender quem é amigo ou inimigo político de quem.
Tomemos um pequeno pedaço do drama só para ilustrar: em São Paulo o PSD é parceiro do PSDB, cujo adversário principal é o PT com quem faz aliança em Salvador na oposição ao PMDB. Em Recife se alia ao PSB que em Belo Horizonte está junto com o PSDB que tenta seduzir o PT.
Uma corrente sem lógica na qual pouco importa se o aliado de ontem é o adversário de hoje ou o companheiro de amanhã.
A Justiça bem que tentou organizar o ambiente quando, em 2002, tomou por base o caráter nacional dos partidos expresso na Constituição e estabeleceu a regra da "verticalização", obrigando as alianças partidárias a seguir um critério mínimo de uniformidade nos âmbitos nacional, estadual e municipal.
Em 2006, o Congresso votou emenda constitucional para derrubar a norma e institucionalizar a balbúrdia ora em vigor.
Efeito cascata. Fato raro, a rejeição de indicações presidenciais de nomes para compor as agências reguladoras - como ocorreu com o indicado pela presidente Dilma à Agência Nacional de Transportes Terrestres há pouco mais de dez dias - não é inédita no Senado.
Lula passou por isso. Em julho de 2009 foi rejeitada a indicação de Bruno Pagnoccheschi para uma diretoria da Agência Nacional de Águas (ANA) alegadamente porque o então presidente havia reagido à criação da CPI da Petrobrás dizendo que os senadores eram "bons pizzaiolos".
Antes, em 2003, havia sido recusada a nomeação de Luiz Salomão para a Agência Nacional de Petróleo e depois, também em 2009, a de Paulo Rodrigues Vieira, para a ANA, cujo nome foi apresentado de novo e aprovado devido a um acordo de Lula com José Sarney.
Novidade, portanto, não há. A diferença é que aquelas rejeições representavam insatisfações isoladas e delas não decorreu uma crise.
Agora, a recusa do nome de Bernardo Figueiredo ocorreu concomitantemente à divulgação de um manifesto da bancada do PMDB na Câmara que explicitamente reclamava do PT e implicitamente expressava a contrariedade com o modo Dilma de se relacionar com sua base.
A intenção foi dolosa e a reação do governo deu-se no mesmo padrão. Resultado: já são 20 dias de conflitos ininterruptos a tomar tempo e a interditar a resolução de questões importantes como a Lei da Copa, o Código Florestal, a distribuição dos royalties do petróleo e a mudança de sistemática na tramitação das medidas provisórias.
Não há clima para nada. Nem para ações decorrentes do Executivo, como a formação da Comissão da Verdade e a execução da Lei de Acesso à Informação, que obriga o poder público a abrir os dados oficiais à sociedade e entra em vigor daqui a menos de dois meses.
Temas de interesse público a respeito dos quais o Congresso teria papel crucial na conjugação do verbo parlamentar.
Ordem no ninho - VERA MAGALHÃES - PAINEL
FOLHA DE SP - 25/03/12
Encerrada a maratona das prévias, que despertou rivalidades internas adormecidas desde 2008, a ordem no PSDB é apostar na pacificação interna. Se confirmada hoje a vitória do favorito José Serra, José Aníbal e Ricardo Tripoli já se comprometeram com a direção municipal a subir ao palco montado na Câmara paulistana pouco depois das 16h para um ato de apoio.
Caberá ao governador Geraldo Alckmin fazer um discurso pregando a conciliação e a união a tucanos incitados por sete meses a "oxigenar" o partido -e que assistiram à inscrição de Serra na undécima hora ante o aceno de Gilberto Kassab ao PT de Fernando Haddad.
Pose para foto FHC e Sérgio Guerra também devem subir ao palanque decorado com banners e balões nas cores azul e amarela. Os pré-candidatos devem aguardar a proclamação do resultado na liderança do partido.
Making of Imagens do evento serão captadas pela GW, produtora que fará a campanha do PSDB.
Yin e Yang O esforço de convivência harmônica entre os grupos de Serra e Alckmin passa pela montagem de equipe de campanha que mescle auxiliares de ambos. A mediação será dos secretários Edson Aparecido (Desenvolvimento Metropolitano) e Andrea Matarazzo (Cultura).
Cotas A minirreforma do primeiro escalão paulista, motivada pelas desincompatibilizações eleitorais, refletirá o rearranjo. Serristas cobram a indicação do sucessor de Matarazzo, que deve deixar o governo em abril. A sucessão na Secretaria de Desenvolvimento Econômico também é parte do xadrez.
Muy amigo O QG de Fernando Haddad não digeriu a brincadeira de Vicente Cândido (PT-SP), que chamou Gabriel Chalita (PMDB) de "meu prefeito" ao encontrá-lo na Câmara. O deputado reivindica a coordenação da campanha petista, mas não topa cuidar do programa de governo. Agora, o clima azedou.
Compensação Na conversa de quinta-feira, Kassab e Dilma Rousseff trataram de alianças fora de São Paulo. Amarrado a Serra, o prefeito ofereceu ajuda do PSD em capitais nas quais o PT enfrenta problemas mais agudos na montagem de coalizões.
Hora extra Dilma Rousseff mandou todos os ministros informarem seus e-mails pessoais para que ela consiga fazer contato com os auxiliares a qualquer momento, incluindo fins de semana.
Verde desbotado A presidente confessou a interlocutores estranhar o silêncio das ONGs ambientalistas e de ícones do setor em apoio à posição do governo de não ceder às exigências dos ruralistas no Código Florestal.
Freio Após as derrotas do governo na Câmara na semana passada, o ministro José Eduardo Cardozo (Justiça) conversou com Ideli Salvatti (Relações Institucionais) para que o governo reabra discussão com a base aliada e evite que a PEC que transfere aos Estados a demarcação de áreas indígenas avance.
Oráculo 1 Virou piada entre os senadores a comissão de notáveis, na qual pontifica o ex-ministro do STF Nelson Jobim, criada pelo presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP), para estudar a revisão do pacto federativo.
Oráculo 2 Nas comissões, diante de um impasse, os senadores ironizam: "Antes de votar, temos de ouvir o que pensam os notáveis". Os que mais se divertem são os presidentes da CAE, Delcídio Amaral (PT-MS), e da CCJ, Eunício Oliveira (PMDB-CE).
com FÁBIO ZAMBELI e ANDRÉIA SADI
tiroteio
"Eduardo Braga está garantindo que o PMDB está pacificado. Só se o conceito de paz dele for o mesmo do presidente Barack Obama a respeito do Iraque."
DO DEPUTADO LÚCIO VIEIRA LIMA (PMDB-BA), ironizando declaração do novo líder do governo no Senado em meio à crise de relacionamento da presidente Dilma Rousseff com sua base de sustentação no Congresso.
contraponto
Amnésia seletiva
Demitido do Ministério das Cidades por Dilma Rousseff, Mário Negromonte (PP-BA) conversava no plenário da Câmara quando encontrou Cândido Vaccarezza (PT-SP), também destituído da liderança do governo na Casa.
-Vaccarezza, agora que estamos fora do governo deveríamos escrever um livro juntos!
Escaldado pela crise na base e pela disputa interna de grupos no PT, o paulista se fez de rogado:
-Mário, livro só sobre o Império Romano! Além do mais, estou muito novo para escrever minhas memórias.
Encerrada a maratona das prévias, que despertou rivalidades internas adormecidas desde 2008, a ordem no PSDB é apostar na pacificação interna. Se confirmada hoje a vitória do favorito José Serra, José Aníbal e Ricardo Tripoli já se comprometeram com a direção municipal a subir ao palco montado na Câmara paulistana pouco depois das 16h para um ato de apoio.
Caberá ao governador Geraldo Alckmin fazer um discurso pregando a conciliação e a união a tucanos incitados por sete meses a "oxigenar" o partido -e que assistiram à inscrição de Serra na undécima hora ante o aceno de Gilberto Kassab ao PT de Fernando Haddad.
Pose para foto FHC e Sérgio Guerra também devem subir ao palanque decorado com banners e balões nas cores azul e amarela. Os pré-candidatos devem aguardar a proclamação do resultado na liderança do partido.
Making of Imagens do evento serão captadas pela GW, produtora que fará a campanha do PSDB.
Yin e Yang O esforço de convivência harmônica entre os grupos de Serra e Alckmin passa pela montagem de equipe de campanha que mescle auxiliares de ambos. A mediação será dos secretários Edson Aparecido (Desenvolvimento Metropolitano) e Andrea Matarazzo (Cultura).
Cotas A minirreforma do primeiro escalão paulista, motivada pelas desincompatibilizações eleitorais, refletirá o rearranjo. Serristas cobram a indicação do sucessor de Matarazzo, que deve deixar o governo em abril. A sucessão na Secretaria de Desenvolvimento Econômico também é parte do xadrez.
Muy amigo O QG de Fernando Haddad não digeriu a brincadeira de Vicente Cândido (PT-SP), que chamou Gabriel Chalita (PMDB) de "meu prefeito" ao encontrá-lo na Câmara. O deputado reivindica a coordenação da campanha petista, mas não topa cuidar do programa de governo. Agora, o clima azedou.
Compensação Na conversa de quinta-feira, Kassab e Dilma Rousseff trataram de alianças fora de São Paulo. Amarrado a Serra, o prefeito ofereceu ajuda do PSD em capitais nas quais o PT enfrenta problemas mais agudos na montagem de coalizões.
Hora extra Dilma Rousseff mandou todos os ministros informarem seus e-mails pessoais para que ela consiga fazer contato com os auxiliares a qualquer momento, incluindo fins de semana.
Verde desbotado A presidente confessou a interlocutores estranhar o silêncio das ONGs ambientalistas e de ícones do setor em apoio à posição do governo de não ceder às exigências dos ruralistas no Código Florestal.
Freio Após as derrotas do governo na Câmara na semana passada, o ministro José Eduardo Cardozo (Justiça) conversou com Ideli Salvatti (Relações Institucionais) para que o governo reabra discussão com a base aliada e evite que a PEC que transfere aos Estados a demarcação de áreas indígenas avance.
Oráculo 1 Virou piada entre os senadores a comissão de notáveis, na qual pontifica o ex-ministro do STF Nelson Jobim, criada pelo presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP), para estudar a revisão do pacto federativo.
Oráculo 2 Nas comissões, diante de um impasse, os senadores ironizam: "Antes de votar, temos de ouvir o que pensam os notáveis". Os que mais se divertem são os presidentes da CAE, Delcídio Amaral (PT-MS), e da CCJ, Eunício Oliveira (PMDB-CE).
com FÁBIO ZAMBELI e ANDRÉIA SADI
tiroteio
"Eduardo Braga está garantindo que o PMDB está pacificado. Só se o conceito de paz dele for o mesmo do presidente Barack Obama a respeito do Iraque."
DO DEPUTADO LÚCIO VIEIRA LIMA (PMDB-BA), ironizando declaração do novo líder do governo no Senado em meio à crise de relacionamento da presidente Dilma Rousseff com sua base de sustentação no Congresso.
contraponto
Amnésia seletiva
Demitido do Ministério das Cidades por Dilma Rousseff, Mário Negromonte (PP-BA) conversava no plenário da Câmara quando encontrou Cândido Vaccarezza (PT-SP), também destituído da liderança do governo na Casa.
-Vaccarezza, agora que estamos fora do governo deveríamos escrever um livro juntos!
Escaldado pela crise na base e pela disputa interna de grupos no PT, o paulista se fez de rogado:
-Mário, livro só sobre o Império Romano! Além do mais, estou muito novo para escrever minhas memórias.
Uma base ingovernável - JOÃO BOSCO RABELLO
O Estado de S.Paulo - 25/03/12
É provavelmente um descuido identificar na atual relação do governo com sua base aliada uma crise nova. A crise é a mesma desde o início da gestão da presidente Dilma Rousseff e tem mais de uma raiz. A primeira, e mais óbvia, é a inviabilidade de se governar com uma base de voracidade infinita, cuja dimensão se aproxima da totalidade dos congressistas, se considerada a parceria amistosa oferecida pelo novo partido - o PSD.
A outra raiz está no critério estritamente fisiológico com o qual essa base foi montada no governo do ex-presidente Lula - arregimentar uma força hegemônica capaz de eliminar qualquer esforço de oposição. Na verdade, melhor sem ela, não importa o custo. Com isso, a presidente Dilma é obrigada a lidar com aliados que integram, na prática, um grande bloco que bem poderia chamar-se o bloco do "quero mais".
Reformar essa obra de Lula não é tarefa fácil. Ainda mais se levada em conta a falta de historicidade partidária da presidente e sua notória impaciência com o exercício da política. Prosseguir com a estrutura herdada é ingovernável.
Dilma tenta com movimentos pouco sutis exibir resistência ao apetite dessa base, mas só terá alguma chance de êxito se correr deliberadamente o risco de reduzi-la, trocando maioria excessiva por mais qualificação e fidelidade.
O que só é possível, por sua vez, mediante compromisso programático com metas definidas, que ofereçam rumos ao País. A premissa, falsa em seu governo, é ter um programa. Atuando no varejo, sua submissão a uma base fisiológica é questão de tempo. Mais exatamente o tempo em que a economia lhe garantir a popularidade atual.
Com prazo de validade
A Lei Geral da Copa como instrumento de chantagem parlamentar é precária e tem prazo de validade. Afeta o interesse geral de Estados e municípios e agrava os conflitos entre o País e a Fifa, portanto é obstrução de vida curta e, nesse momento, serve mais ao governo que precisa adiar a votação do Código Florestal para evitar críticas dos ambientalistas na Rio+20, em junho. O governo opera com a perspectiva de esgotar o prazo da prorrogação da suspensão da lei ambiental velha, em abril, que põe na ilegalidade 90% dos produtores, para ter sobre estes um instrumento de pressão. Já tentou isso antes e o risco é ter uma obstrução suprapartidária permanente de 400 deputados.
Questão 'de mérito'
Para esses 400 parlamentares, mudar o texto do Senado é questão "de mérito". Acham que a iniciativa do novo código é do Congresso e não cabe ao Executivo a palavra final. E até idealizam batizá-lo com o nome do deputado Moacir Micheletto (PMDB-PR), morto em janeiro.
Novo lance
Anunciada com estrondo e frases de efeito, a prometida oposição do PR, até aqui, vai se caracterizando como um blefe aos moldes do jogo de pôquer. A bancada ainda não criou dificuldades para o governo em votações, mas agora faz suspense sobre sua adesão à CPI da Saúde proposta pelo PSDB. Esta tem 16 assinaturas, mas só tem chance de chegar às 27 necessárias com os sete votos do PR. O partido promete decidir na terça-feira, prazo em que espera um "gesto" do Planalto.
Caminho aberto
O governo agiu para contornar o conflito de interesses alegado pelo senador Blairo Maggi (PR-MT) para não assumir o Ministério dos Transportes. O impedimento de Maggi se deve aos recursos do Fundo da Marinha Mercante que financiam empresas de sua família. O governo transferiu a gestão desses recursos para a Receita Federal, mas não adiantou.
MARIA CRISTINA FRIAS - MERCADO ABERTO
FOLHA DE SP - 25/03/12
Alta do petróleo refletirá em maio na petroquímica
O aumento de 11,6% registrado neste ano no preço do petróleo deve impactar o segmento petroquímico a partir do próximo mês.
A nafta, principal matéria-prima do setor, tem seu valor calculado pela média do preço do petróleo dos três meses anteriores.
Na Europa, o valor do produto já aumentou 28,6% em 2012 e a tonelada dele alcançou US$ 1.080 neste mês, segundo Solange Stumpf, sócia-executiva da Maxiquim, consultoria da área.
"No Brasil, até agora, o incremento foi de 2%, mas, em maio, poderá ser de até 10%", afirma Stumpf.
A indústria plástica, porém, já sentiu incremento de 8% a 10% no preço da resina (feita a partir da nafta e do gás natural), diz o presidente da Abiplast (Associação Brasileira da Indústria do Plástico), José Ricardo Roriz Coelho.
"As empresas [do setor plástico] estão tentando repassar o custo, mas fica difícil com a queda de demanda decorrente da crise."
O segmento deve ter retração de 2,5% a 3% nos primeiros três meses deste ano, na comparação com o último trimestre de 2011.
"Havendo aumento no custo do petróleo, a alta é transferida para a nafta e acaba pressionando a indústria do plástico", diz a diretora de economia da Abiquim (Associação Brasileira da Indústria Química), Fátima Giovanna Ferreira.
Na semana passada, a diretora-gerente do FMI, Christine Lagarde, afirmou que o preço do petróleo pode subir até 30% se as exportações do Irã reduzirem drasticamente.
O Ocidente está diminuindo as importações do país, que enfrenta sanções internacionais por causa de seu programa nuclear.
Os estoques americanos de petróleo também caíram, pressionando ainda mais os preços.
O que estou lendo
Gustavo Marin, presidente do Citi no Brasil
Depois de visitar com os filhos o memorial do campo de concentração de Dachau, perto de Munique, na Alemanha, Gustavo Marin, presidente do Citibank no Brasil, passou pela livraria e comprou "The Wages of Destruction", de Adam Tooze.
A obra trata da criação e da destruição da economia do regime nazista.
"O autor é um historiador que recebeu o prêmio Wolfson", diz Marin, que gosta de livros de história e ficou entusiasmado com a leitura do texto.
Cobre roubado
O prejuízo da indústria do cobre com o roubo do metal voltou a assustar o setor no início deste ano.
Apenas em fevereiro, a indústria registrou perda de R$ 1,8 milhão com o desvio do metal. Foram levadas 100 toneladas de fios, cabos e semimanufaturados de cobre em 11 ocorrências, segundo o Sindicel (Sindicato da Indústria de Condutores Elétricos, Trefilação e Laminação de Metais Não Ferrosos do Estado de São Paulo).
Nos dois primeiros meses deste ano, o prejuízo supera R$ 2 milhões, ante apenas R$ 131 mil em igual período do ano passado.
Os assaltos a cargas e fábricas, que ficaram mais frequentes entre 2006 e 2007, vinham em trajetória de queda nos últimos anos.
Na avaliação de dirigentes do sindicato, é preciso intensificar a fiscalização sobre a origem dos materiais vendidos no comércio de sucata e do metal em geral.
Rumo aos EUA
A TAM aumentará a sua oferta de assentos para Miami a partir de 12 de novembro. O trajeto passará a ser realizado por uma aeronave maior, o Boeing-777/300. Com isso, o número de lugares por voo passará dos atuais 223 para 362.
Desembarque
Após abrir sua primeira loja no Brasil, cuja inauguração ocorreu na semana passada, em São Paulo, a marca de bagagens e assessórios Tumi pretende começar a operar também na cidade do Rio de Janeiro.
Direção Centro-Oeste A Ativa, operadora logística de medicamentos e cosméticos que teve faturamento de R$ 105 milhões em 2011, abrirá neste ano filiais em Goiás e no Distrito Federal.
Nova leitura
O empresário Antonio Camarotti se prepara para lançar no Brasil, em junho, a edição brasileira da revista "Forbes". A publicação, que terá conteúdo nacional e estrangeiro, já teve passagem pelo país, pelas mãos de outros investidores, mas foi fechada e deixou de circular.
Molécula de memória
A nova molécula para o tratamento de Alzheimer da farmacêutica americana Eli Lilly está em fase de testes em seres humanos.
O medicamento que pode resultar da pesquisa deve ser lançado no Brasil em 2015, segundo a empresa.
A unidade brasileira, que está entre as cinco maiores da companhia no mundo, colabora com os estudos, segundo o presidente da Eli Lilly do Brasil, Antonio Alas.
No país há 400 centros de pesquisas parceiros e 3.000 pacientes que participam de estudos de novos tratamentos, segundo a empresa.
"Temos investimentos em pesquisas aqui no Brasil. O país participa não só nessa, mas também em outras moléculas", afirma Alas.
"Aproximadamente 6% dos idosos no país sofrem de Alzheimer", diz.
Alta do petróleo refletirá em maio na petroquímica
O aumento de 11,6% registrado neste ano no preço do petróleo deve impactar o segmento petroquímico a partir do próximo mês.
A nafta, principal matéria-prima do setor, tem seu valor calculado pela média do preço do petróleo dos três meses anteriores.
Na Europa, o valor do produto já aumentou 28,6% em 2012 e a tonelada dele alcançou US$ 1.080 neste mês, segundo Solange Stumpf, sócia-executiva da Maxiquim, consultoria da área.
"No Brasil, até agora, o incremento foi de 2%, mas, em maio, poderá ser de até 10%", afirma Stumpf.
A indústria plástica, porém, já sentiu incremento de 8% a 10% no preço da resina (feita a partir da nafta e do gás natural), diz o presidente da Abiplast (Associação Brasileira da Indústria do Plástico), José Ricardo Roriz Coelho.
"As empresas [do setor plástico] estão tentando repassar o custo, mas fica difícil com a queda de demanda decorrente da crise."
O segmento deve ter retração de 2,5% a 3% nos primeiros três meses deste ano, na comparação com o último trimestre de 2011.
"Havendo aumento no custo do petróleo, a alta é transferida para a nafta e acaba pressionando a indústria do plástico", diz a diretora de economia da Abiquim (Associação Brasileira da Indústria Química), Fátima Giovanna Ferreira.
Na semana passada, a diretora-gerente do FMI, Christine Lagarde, afirmou que o preço do petróleo pode subir até 30% se as exportações do Irã reduzirem drasticamente.
O Ocidente está diminuindo as importações do país, que enfrenta sanções internacionais por causa de seu programa nuclear.
Os estoques americanos de petróleo também caíram, pressionando ainda mais os preços.
O que estou lendo
Gustavo Marin, presidente do Citi no Brasil
Depois de visitar com os filhos o memorial do campo de concentração de Dachau, perto de Munique, na Alemanha, Gustavo Marin, presidente do Citibank no Brasil, passou pela livraria e comprou "The Wages of Destruction", de Adam Tooze.
A obra trata da criação e da destruição da economia do regime nazista.
"O autor é um historiador que recebeu o prêmio Wolfson", diz Marin, que gosta de livros de história e ficou entusiasmado com a leitura do texto.
Cobre roubado
O prejuízo da indústria do cobre com o roubo do metal voltou a assustar o setor no início deste ano.
Apenas em fevereiro, a indústria registrou perda de R$ 1,8 milhão com o desvio do metal. Foram levadas 100 toneladas de fios, cabos e semimanufaturados de cobre em 11 ocorrências, segundo o Sindicel (Sindicato da Indústria de Condutores Elétricos, Trefilação e Laminação de Metais Não Ferrosos do Estado de São Paulo).
Nos dois primeiros meses deste ano, o prejuízo supera R$ 2 milhões, ante apenas R$ 131 mil em igual período do ano passado.
Os assaltos a cargas e fábricas, que ficaram mais frequentes entre 2006 e 2007, vinham em trajetória de queda nos últimos anos.
Na avaliação de dirigentes do sindicato, é preciso intensificar a fiscalização sobre a origem dos materiais vendidos no comércio de sucata e do metal em geral.
Rumo aos EUA
A TAM aumentará a sua oferta de assentos para Miami a partir de 12 de novembro. O trajeto passará a ser realizado por uma aeronave maior, o Boeing-777/300. Com isso, o número de lugares por voo passará dos atuais 223 para 362.
Desembarque
Após abrir sua primeira loja no Brasil, cuja inauguração ocorreu na semana passada, em São Paulo, a marca de bagagens e assessórios Tumi pretende começar a operar também na cidade do Rio de Janeiro.
Direção Centro-Oeste A Ativa, operadora logística de medicamentos e cosméticos que teve faturamento de R$ 105 milhões em 2011, abrirá neste ano filiais em Goiás e no Distrito Federal.
Nova leitura
O empresário Antonio Camarotti se prepara para lançar no Brasil, em junho, a edição brasileira da revista "Forbes". A publicação, que terá conteúdo nacional e estrangeiro, já teve passagem pelo país, pelas mãos de outros investidores, mas foi fechada e deixou de circular.
Molécula de memória
A nova molécula para o tratamento de Alzheimer da farmacêutica americana Eli Lilly está em fase de testes em seres humanos.
O medicamento que pode resultar da pesquisa deve ser lançado no Brasil em 2015, segundo a empresa.
A unidade brasileira, que está entre as cinco maiores da companhia no mundo, colabora com os estudos, segundo o presidente da Eli Lilly do Brasil, Antonio Alas.
No país há 400 centros de pesquisas parceiros e 3.000 pacientes que participam de estudos de novos tratamentos, segundo a empresa.
"Temos investimentos em pesquisas aqui no Brasil. O país participa não só nessa, mas também em outras moléculas", afirma Alas.
"Aproximadamente 6% dos idosos no país sofrem de Alzheimer", diz.
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