Mais uma do Pai dos Pobres e Mãe da Banca
O GLOBO 17/05/09
A ekipekonômica e o comissariado de informações do governo conseguiram transformar a limonada da remuneração das cadernetas de poupança num limão azedo. O que é uma questão ainda remota virou grande barafunda.
Querem cobrar Imposto de Renda de quem tem mais de R$ 50 mil na caderneta, mas pretendem baixar em 30% o mesmo tributo para quem tem dinheiro aplicado em fundos de investimento.
Algumas mudanças vêm logo; outras, só ano que vem. Alguns descontos serão feitos na fonte; outros, nas declarações de renda. Como se isso fosse pouco, a oposição diz que a medida tunga a classe média. Quem mantém R$ 100 mil numa caderneta durante um ano não pode ser chamado de especulador, mas, com esse saldo, que lhe concede um rendimento mensal de R$ 575, pagará R$ 13,75 ao Imposto de Renda. Isso não o mandará ao andar de baixo.
Como há 90 milhões de cadernetas de poupança e só 1% dos aplicadores tem depósitos superiores a R$ 50 mil, pode-se dizer que a confusão está restrita ao andar de cima. Falso. Sempre que a caderneta ameaçar o cofre dos fundos de investimento, coisa que ainda não ocorreu, a ekipekonômica avançará sobre o seu rendimento. Fará isso porque o governo inovou a piada do pudim. Ele quer comê-lo (pedindo dinheiro aos bancos para financiar suas despesas), guardá-lo (garantindo a renda dos pequenos depositantes) e vendê-lo (protegendo as taxas cobradas pelos administradores dos fundos).
Os sábios querem preservar a convivência irracional de duas taxas de remuneração dos investimentos, a Bolsa Copom (8% líquidos ao ano) e o rendimento das cadernetas (cerca de 7,5%, em valores de hoje).
Enquanto esse regime remunerou o andar de cima, tudo bem. Agora que as quedas da Selic aproximam as taxas, o céu ameaça cair. O problema continua do mesmo tamanho: juros flutuantes só podem conviver com remunerações tabeladas se uma se destinar a cevar os cavalcantis e outra a ferrar os cavalgados. O rendimento das contas do FGTS continua negativo, mas falar no pecúlio compulsório da patuleia é falta de educação.
Todo mundo quer juros baixos para seus empréstimos e taxas altas para suas aplicações. O papel do governo é reconhecer que esse jogo não existe. O atrelamento da renda das cadernetas à Selic é inevitável.
Por enquanto, o que a ekipekonomica quer é preservar o brilho do rentismo que financia as arcas do governo. Seus sábios protegem os fundos sabendo que a Caixa Econômica cobra apenas 1,5% de taxa de administração, enquanto os bancos cobram, na média, acima de 2%. (O Tesouro Direto, do Banco Central, remunera pela Selic e cobra 0,4% no primeiro ano e 0,3% daí em diante.)
Se o problema estivesse na defesa do rendimento dos 45 milhões de cadernetas com até R$ 100 no saldo, o governo não precisaria fabricar uma barafunda. Nosso Guia poderia fazer o que bem entendesse, distribuindo um rendimento adicional de 10% sobre os saldos de todas essas cadernetas e o mimo custaria, no máximo, R$ 450 milhões por ano.
Reduzindo em 30% o imposto de renda dos aplicadores em fundos de investimento, a ekipekonômica impõe à Viúva uma renúncia fiscal estimada cerca de R$ 3 bilhões.
O comissariado de informações do governo tem uma opção preferencial pela construção de realidades virtuais. Desta vez, transformaram as cadernetas em ameaça. Há um mês, com algum sucesso, converteram dissimulação em transparência. Em abril montaram um teatro, fingindo que a ministra Dilma Rousseff anunciou seu câncer linfático logo depois da confirmação do diagnóstico. Lorota. Quando a ministra revelou a doença, os repórteres Mônica Bergamo e Diógenes Campanha já haviam contado que ela colocara um cateter para receber medicação quimioterápica. Pior: em seguida a repórter Adriana Dias Lopes mostrou que o tratamento da ministra começara quatro dias antes. Há algo de compulsivo na enganação. Na quinta-feira, a agenda da doutora dizia que durante a manhã ela se ocupara com “despachos internos”. Já o Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo, informou que ela passou pela segunda sessão de quimioterapia.
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Ação e reação
A demonstração de simpatia pelo voto de lista do governador José Serra, candidato a presidente da República, deverá acionar a Lei de Newton. Numa reação igual e contrária, o deputado Ciro Gomes deve baixar em Brasília para combater a iniciativa. Em 2007, quando o voto de lista foi mandado ao sarcófago, Ciro perguntava: “Amanhã, quando chegar a notícia de que o eleitor não vai mais votar nas pessoas, mas nos partidos, qual será a reação da população?”.
Casca de coco
São poderosos os argumentos dos defensores do voto lista. Já apareceu até a ideia de que se deve “experimentar” esse modelo (como se pode experimentar sorvete de casca de coco, basta querer). O que falta explicar é por que os doutores querem impor esse sistema eleitoral aos brasileiros por maioria simples. Nessa conta, basta que 129 deputados votem a favor, numa sessão que tenha a presença de 257 parlamentares. Repetindo: esse é o quorum pedido para a criação do Dia da Brotoeja. Caso se queira mudar para qualquer outro sistema, inclusive o do voto distrital, serão necessários os três quintos exigidos para as reformas constitucionais (308 dos 513 deputados).
D. Helder triste
Diante da bancarrota da ekipekonômica da Arquidiocese do Rio, que comprou um apartamento de R$ 2,2 milhões, dom Hélder Câmara foi visto no Palácio São Joaquim cantando uma paródia de uma velha marcha de carnaval composta em sua homenagem: “Obrigado, reverendo, Deus lá do céu está vendo. A nossa decepção.”
Perigo à vista
O ministro Fernando Haddad, da Educação, caminha para uma armadilha. Ele quer substituir o massacre do vestibular pela prova do Enem. Até aí, tudo bem, mas sua burocracia diz que neste ano a experiência, inédita, só permitirá a aplicação de uma prova, em outubro, ao velho estilo tudo ou nada. Os educatecas prometem que no ano que vem a garotada poderá testar seu conhecimento em dois exames, em meses diferentes. Quem vai explicar aos estudantes que, logo no primeiro ano da novidade, eles só terão uma chance? Nos Estados Unidos, um sistema semelhante oferece sete oportunidades anuais aos candidatos.
Pedra cantada
A governadora Yeda Crusius talvez não saiba, mas já no dia de sua eleição o alto tucanato achava que seu governo seria um desastre. Menos de um ano depois, a previsão piorou: ela teria dificuldade para chegar ao fim do mandato.
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