segunda-feira, dezembro 26, 2011

Amadorismo, não - RICARDO NOBLAT

O GLOBO - 26/12/11

Onde vige o regime presidencialista de governo, o presidente da República pode muito. Mas embora possa, nem mesmo o presidente dos Estados Unidos, por exemplo, pode tudo. Esbarra em um Congresso ciente de sua força e em uma sociedade um pouco mais amadurecida. Entre nós, não. O presidente só não pode desrespeitar as leis. O resto, ele pode.

Dilma dá por findo seu primeiro ano de governo sem parecer ter entendido que renunciar a impor a sua vontade é também um meio de exercer o poder. E, com frequência, um meio inteligente e admirável, capaz de evitar desgastes e de consolidar apoios.

Seis ministros
 pediram as contas em sete meses, chamuscados por suspeitas de toda ordem. Recentemente, Fernando Pimentel, do Desenvolvimento, sugeriu a Dilma que o mais sensato a fazer seria ir embora. Não tem como justificar sua experiência como consultor de empresas.

Foram R$ 2 milhões
 embolsados em dois anos, via quatro contratos — três deles feitos de boca. O maior, assinado com a Federação das Indústrias de Minas, exigiu palestras em dez unidades regionais da Federação. Pois bem: O GLOBO bateu à porta das dez unidades.

Em nove delas,
 ninguém ouviu falar da passagem por ali de Pimentel na condição de palestrante. Provocado a respeito, o atual presidente da Federação suplicou: “Por favor, me deem um tempo para pensar. O assunto é muito delicado”. Pensa há mais de 15 dias. Delicado? Como assim?

Pimentel foi
 companheiro de Dilma na luta armada contra a ditadura militar de 1964. É o único ministro com autoridade para dizer, se quiser, que ama Dilma. E para supor que, por ela, é amado. Foi um dos coordenadores de sua campanha.

Por acaso, Dilma
 não se deu conta da encrenca em que Pimentel se meteu? Desconhece que doravante, por mais que cale ou fuja, ele será perseguido pela história do consultor bem pago e dispensado de dar consultoria?A imprensa não o deixará em paz. A oposição também não.

Por que Dilma
 mantém Pimentel no governo? Porque gosta dele? Não é suficiente. Porque não gosta quando a imprensa lhe cobra qualquer coisa? Também não é suficiente — e chega a ser tolo. Porque faz questão de mostrar que manda tanto a ponto de desafiar a lógica? Pois é. Pode ser.

Na verdade,
 Dilma está sendo vítima da doença infantil do amadorismo.

Faça sua escolha 
Quem você apontaria como o autor da declaração mais insólita de 2011? Carlos Lupi, ex-ministro do Trabalho, que para garantir o emprego, proclamou: “Dilma, eu te amo”? Dilma, que para defender o ministro Fernando Pimentel, enrascado com consultorias suspeitas, decretou: “É um problema pessoal dele”? Ou o senador cassado Luiz Estevão, que justificou assim o fato de dirigir, sem carteira de habilitação, uma Ferrari desprovida de placa e carente de documentos: “Eu vim fazer ginástica. Não tinha nem bolso. Então, nem trouxe carteira de motorista”?

Ex-companheiros
Em meio à eleição do ano passado, quando o sigilo fiscal de Verônica Serra foi quebrado por encomenda do jornalista Amaury Ribeiro, o problema a separar José Serra de Aécio Neves deixou de ser político e passou a ser pessoal. Serra concluiu que Amaury estava, de fato, a serviço de Aécio. Em seu livro “A privataria tucana”, Amaury confessa que espionou o esquema de espionagem de Serra a pedido de Aécio. Serra acalenta o sonho de ser de novo candidato a presidente. Se não der, tudo fará para que Aécio, uma vez candidato, não se eleja. O PT agradece.

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