FOLHA DE SP - 05/07
SÃO PAULO - A Suprema Corte dos EUA, em decisão que redefine as fronteiras entre liberdade religiosa e obrigações legais de empresas, estabeleceu que pequenas firmas familiares podem recusar-se a pagar a seus funcionários seguros de saúde que cubram métodos contraceptivos aos quais façam restrições morais.
Embora eu seja um defensor intransigente das liberdades em geral, considero essa decisão um tanto bizarra. Planos de saúde, afinal, são mais bem descritos como uma modalidade de salário indireto do que como benefícios discricionários que patrões oferecem a empregados. Se a moda pega, empresas dirigidas por evangélicos poderiam exigir que seus funcionários não utilizassem seus vencimentos para consumir álcool ou comprar pornografia.
E, mesmo quem entende o seguro saúde como um pacote de favores que companhias concedem a seus colaboradores, é complicado vincular questões de saúde a visões religiosas. Pela lógica da maioria dos ministros da corte, uma firma comandada por testemunhas de Jeová, por exemplo, teria o direito de excluir procedimentos médicos que envolvam transfusões sanguíneas.
Faz muito mais sentido apenas exigir que as empresas paguem o plano e deixar que autoridades sanitárias, que combinam o saber técnico com certa legitimidade política (elas são nomeadas por gestores eleitos), definam o que ele deve incluir.
Mesmo para um ateu, a liberdade religiosa é um valor a preservar. Mas ela é só materializa de forma democrática quando fica restrita à esfera do estritamente pessoal. Isso significa que esse gênero de liberdade deve ser forte no que diz respeito a escolhas individuais, mas perde toda legitimidade quando se transforma em imposições a terceiros. É perfeitamente razoável que o dono da empresa não queira usar determinados métodos contraceptivos, mas não que pretenda estender suas escolhas a seus empregados.
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