O desce e sobe
MIRIAM LEITÃO
O GLOBO - 08/07/11
O Banco Central continua mantendo o discurso de combate aos preços. Certo. Já o ministro Guido Mantega disse que não perde o sono com a inflação. Deveria. As projeções do gráfico abaixo, feito pelo economista-chefe do Banco ABC Brasil, Luis Otávio Leal, mostram que a inflação em 12 meses vai continuar subindo até agosto e vai atingir 7,2%, um número que tiraria o sono de ministro da Fazenda de qualquer país. No último quadrimestre, as taxas comparadas ao mês anterior devem subir, mas como no ano passado elas foram muito altas, há chance de que aconteça o que está nesta previsão: o acumulado vai cair. Apesar disso, continuaria acima do centro da meta.A expectativa de inflação para o ano já foi muito pior. Melhorou porque o BC venceu as ambiguidades e dúvidas do início do governo.
- O Banco Central está acertando porque mantém a intensidade do discurso mesmo com a queda da inflação mensal e isso afeta favoravelmente as expectativas e se reflete nos juros futuros e nos contratos - explicou o chefe da divisão econômica da Confederação Nacional do Comércio (CNC) e ex-diretor do Banco Central, Carlos Thadeu de Freitas.
A inflação em junho caiu de 0,47% para 0,15% porque houve uma queda no item alimentos e bebidas e nos transportes. Mesmo assim, o álcool caiu menos nas bombas e a inflação de serviços continuou alta. Os combustíveis recuaram 4,25%, mas esperava-se redução de 4,6%.
O consumo continua muito forte pelo aumento do número de carros em circulação. Isso e a produção menor de álcool do que o previsto dificultam a queda do preço, mesmo na safra de cana-de-açúcar.
- Enquanto a produção de cana-de-açúcar se manteve estável este ano, na comparação com o ano passado, o consumo de combustíveis aumentou muito, refletindo os incentivos do governo para venda de veículos. Além disso, o frio mais intenso no país é uma ameaça ao plantio e há relatos de que usineiros estão fazendo estoques para o período de entressafra do final do ano - disse Luis Otávio Leal.
Nos seis primeiros meses deste ano, as vendas de veículos cresceram 10% em relação ao mesmo período de 2010, segundo dados da Anfavea, apesar de haver um acúmulo de estoques das montadoras. A importação no período cresceu 38%. A economia está transitando para um outro ritmo: cresce, mas em velocidade menor. Mesmo assim, o bom momento do mercado de trabalho e a renda mantêm o consumo. Uma demonstração disso é que a inflação de serviços - sem competição externa - está num nível muito alto. Em junho, ela subiu 0,60%, indo para 8,74% na taxa acumulada.
A avaliação dos economistas do Bank of America é de que a inflação continuará na tela do radar. Eles explicam que ainda há uma série de fatores que justificam as incertezas: a queda da inflação nesta época do ano é sazonal; existe uma concentração de reajustes salariais de várias categorias no final do ano; as expectativas de inflação para 2012 continuam acima de 5%; a inflação de serviços está muito acima do centro da meta. Além disso, haverá um forte reajuste do salário mínimo, de 14%, no ano que vem, que sozinho será responsável por uma alta de 0,8% no IPCA.
O índice de confiança da indústria está em queda e o dos consumidores, em ligeira queda. Na visão do economista Sérgio Vale, da MB Associados, a economia brasileira continuou crescendo bem no segundo trimestre. O dado ainda não foi divulgado, mas ele acredita que só no fim do ano haverá desaceleração.
- A sensação é de economia aquecida ainda. Projetamos expansão do PIB de 1,1% no 2º trimestre, em relação ao 1º tri, mais baixo do que o começo do ano, mas ainda um número forte. O terceiro trimestre pode ser ainda mais forte, com expansão acima de 1,5%, e só no final do ano podemos ver crescimento abaixo de 1%. Isso daria 4,2% de expansão em 2011, uma taxa alta depois de um crescimento tão forte como o do ano passado - disse Sérgio Vale.
O sono do ministro Guido Mantega é perturbado, segundo ele, pela alta do real. É verdade que o dólar caiu demais, mas se ele subir certamente vai impactar a inflação e a taxa continuaria acima do teto da meta. O mais sensato é o Ministério da Fazenda ficar sempre alerta ao risco inflacionário, num país como o Brasil. De dia e de noite.
A inflação agora está caindo e subindo; depois vai subir e cair. Exatamente isso. Parece estranho, mas é assim: o IPCA de junho, divulgado ontem, teve queda, mas o acumulado de 12 meses subiu para 6,7% e vai continuar em alta. De setembro em diante, o movimento será inverso: subirá no dado mensal, mas cairá ligeiramente no acumulado do ano.
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