FOLHA DE SP - 19/04
Nos 14 anos da Presidência de Chávez, a Assembleia nunca votou contra suas iniciativas na Venezuela
Cena 1: No domingo passado, Carmen sentiu-se esgotada, mas muito satisfeita. Esgotada porque 15 horas de viagem de ônibus são muitas para uma pessoa de 78 anos. E satisfeita por ter votado para eleger o próximo presidente da Venezuela.
Para fazê-lo, ela teve que se deslocar de Miami, onde vive há três anos, até Nova Orleans, a cidade mais próxima onde podem votar os venezuelanos residentes na Flórida. A longa viagem se deve ao fato de Hugo Chávez ter decidido fechar o consulado venezuelano em Miami.
Assim, os 20 mil venezuelanos que ali vivem (muitos deles partidários da oposição) tiveram que optar entre não votar ou ir até Nova Orleans. Milhares deles embarcaram em ônibus ou foram de avião ou em seus carros para votar.
O fizeram na eleição presidencial de outubro e novamente na de domingo passado. A TV mostrou jovens, casais com bebês e idosos, todos fazendo o que fosse preciso.
Cena 2: William Dávila é deputado da oposição na Assembleia Nacional da Venezuela. Nas eleições de 2010, a oposição obteve a maioria dos votos (52%), mas o governo mudou as regras e, apesar de ter conseguido menos votos, obteve o maior número de deputados, desse modo se assegurando do controle da Assembleia.
Nos 14 anos da Presidência de Chávez, a Assembleia nunca votou contra as iniciativas dele e, com frequência, lhe deu poderes absolutos que lhe permitiam governar por decreto e sem consulta.
Em 16 de abril, o deputado Dávila estava denunciando na Assembleia milhares de irregularidades documentadas que ocorreram nas eleições, quando vários deputados do governo se aproximaram dele e o agrediram no rosto com um objeto pesado. Ele precisou de 14 pontos.
Cena 3: Na campanha eleitoral recente, Nicolás Maduro teve cobertura maciça e desproporcional da mídia, enquanto a visibilidade e as mensagens de seu rival, Henrique Capriles, foram fortemente limitadas pelo governo.
Uma das mensagens mais enfáticas de apoio a Maduro foi a de Lula. Depois de ressalvar que não é correto interferir nos assuntos internos de outro país, Lula explicou por que admira Nicolás Maduro e por que os venezuelanos devem apoiá-lo.
Cena 4: O tenente Diosdado Cabello participou do golpe militar de 1992 liderado por Hugo Chávez. Posteriormente, e graças ao êxito político de Chávez, ele alcançou os mais altos cargos no governo. Agora é presidente da Assembleia Nacional.
Na segunda-feira passada, quando um deputado da oposição pediu a palavra, Cabello lhe perguntou: "O sr. aceita que Nicolás Maduro é o presidente legitimamente aceito?" O deputado tentou responder, mas Cabello o interrompeu: "Me diga, sim ou não? Não vou dar a palavra a nenhum deputado que não aceite aqui que Maduro será o presidente". A oposição pediu a recontagem dos votos, conforme previsto na lei. O governo rejeita.
Cena 5: O Brasil reconheceu imediatamente a vitória de Maduro, e Dilma Rousseff está em Caracas hoje para assistir à sua posse como presidente da Venezuela até 2019. A sra. Carmen não está festejando.
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