O Estado de S.Paulo - 23/10
O Brasil entrou em novo ciclo de expansão, com ênfase no investimento e menor dependência do consumo, disse várias vezes o ministro da Fazenda, Guido Mantega, e repetiu nessa terça-feira o secretário executivo interino do Ministério, Dyogo Oliveira. A notícia é ótima. Só falta descobrir onde está esse investimento e como evoluirá nos próximos anos. Brasília ganhou há muitos anos o apelido de Ilha da Fantasia. Hoje mais do que nunca merece também o nome de capital de um País de Fantasia, muito mais bem governado, produtivo e competitivo que o Brasil conhecido no dia a dia das pessoas comuns. Nesse país imaginário, "o pacto pela responsabilidade fiscal é a mãe dos outros pactos", proclamou a presidente Dilma Rousseff, embora o resultado formal das contas públicas dependa cada vez mais de receitas não recorrentes, como o bônus do leilão do Campo de Libra, e de uma internacionalmente famosa contabilidade criativa.
Segundo o secretário Dyogo Oliveira, o recente ciclo de crescimento dependeu de "renda, exportações e crédito". Há uma certa liberdade poética na referência a algum crescimento nos últimos anos - 2,7% em 2011 e 0,9% em 2012. Por enquanto, as projeções para 2013 indicam 2,5%. Também é difícil de descobrir a função dinamizadora das exportações em queda.
No ano passado o Brasil exportou US$ 242,6 bilhões, bem menos que em 2011 (US$ 256 bilhões), e em 2013, até a terceira semana de outubro, US$ 177,4 bilhões, 1,6% menos que em igual período do ano anterior. Curiosamente, o clima propício à fabulação, em Brasília, induz até a negação de números produzidos por entidades do próprio governo, como o Ministério do Desenvolvimento, responsável pelas estatísticas de exportação e de importação.
A ideia de uma expansão econômica puxada pelo investimento também é estranha, quando as projeções ainda apontam uma relação muito modesta entre o valor destinado à formação bruta de capital fixo e o dos bens e serviços finais produzidos no País.
Governo e setor privado aplicaram em máquinas, equipamentos, instalações e obras de infraestrutura apenas 18,1% do PIB, uma proporção menor que a de 2011. Para este ano, a expectativa é de uma relação próxima de 19%, talvez pouco superior.
Com as concessões de infraestrutura, a taxa de investimento poderá chegar a 22,8% do PIB em 2018, segundo projeção da Área de Acompanhamento e Pesquisa Econômica do BNDES. No cenário desenhado, o crescimento econômico será de 4% ao ano. Sem as concessões, o total investido ficará em 20,6% do PIB, de acordo com as estimativas. E nada garante, por enquanto, o sucesso do programa, especialmente na área de logística.
No ano passado, outros emergentes apresentaram taxas de investimento bem superiores à do Brasil. Exemplos: México, 20,7%; Uruguai, 21,4%; Colômbia, 23,9%; Chile, 24,1%; Equador, 26,5%; Peru, 26,6%. De modo geral, apresentaram também crescimento econômico muito maior, como já havia ocorrido e ainda ocorrerá, segundo as previsões, por vários anos. Todos acumularam desajustes, mas só o Brasil acumulou estagnação, inflação alta e baixa formação de capital fixo.
Se as projeções mais otimistas do governo se confirmarem, em 2018 o País ainda investirá menos, proporcionalmente, do que aqueles outros emergentes investiram no ano passado.
O ministro Guido Mantega também repetiu nessa terça-feira um de seus mantras favoritos. Segundo ele, o Brasil tem tido, há muitos anos, superávit primário (usado para o pagamento de juros) maior que o da maior parte dos outros países. Contabilidade criativa à parte, um grande superávit primário é mais necessário ao Brasil que à maior parte dos emergentes, por causa da dívida pública. Mesmo a dívida líquida, em torno de 35%, foi muito maior que a da média dos países da mesma categoria, de 24,7% no ano passado. Na América Latina, a média ficou em 31%, informou o FMI. Bravata pode funcionar como insumo eleitoral. Na economia, o jogo é diferente.
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