O Estado de S.Paulo - 23/10
A mudança de perspectiva adotada pelas empresas de rating em relação à economia brasileira somente ratifica o processo de piora de avaliação dos agentes econômicos quanto ao País e seus fundamentos.
A chacoalhada na economia brasileira teve início em maio deste ano, quando o Fed anunciou a provável redução no programa de estímulos monetários, ainda que tal ação tenha sido postergada. O dólar ganhou valor em relação às principais moedas do globo. Os emergentes não escaparam e o real destacou-se como uma das que mais se desvalorizaram. Tais pressões no real continuaram, mesmo após o governo ter revogado os impedimentos à entrada de capitais (IOF) e também sobre os derivativos adotados desde o começo de 2012. O Banco Central (BC) foi chamado a intervir com vendas maciças de swaps cambiais, para tentar evitar uma sobredepreciação da moeda. Desde agosto, o BC já vendeu liquidamente US$ 60 bilhões.
Por que voltamos a ser o "patinho feio" entre os países emergentes?
Isso está relacionado ao fato de o governo brasileiro ter adotado medidas do tipo "tapa-buraco", quando os problemas econômicos são estruturais. No arcabouço desse modelo, podemos listar os fatores que têm gerado os atuais desequilíbrios macro e microeconômicos e a consequente perda generalizada de credibilidade:
Protecionismo, por meio de barreiras tarifárias e preferência por compra de produtos nacionais em suposta defesa da indústria nacional (fechamento da economia);
Adoção de medidas impeditivas (IOF) à entrada de dólares no âmbito da suposta guerra cambial, para promover a desvalorização do câmbio. Ainda que diante da pressão recente as medidas tenham sido revertidas, há a desconfiança de que sempre podem voltar;
Uso de instrumentos parafiscais para incentivar o consumo e o investimento. Capitalização de instituições públicas para fornecerem crédito subsidiado, elegendo alguns privilegiados;
Processo de "estatização" do crédito. A participação das instituições públicas no mercado total de crédito passou de 34,1%, em 2007, para 50,7%, neste ano, com riscos de inadimplência elevada lá na frente;
Geração de superávits primários com base na contabilidade criativa, minando a confiança dos agentes neste indicador;
Controle de preços, por meio de desonerações fiscais ou reduções "forçadas" de preços que afetam os índices, mas não alteram a sua dinâmica. A inflação de preços livres está em 7,4%, enquanto a de administrados está em 1,1% em 12 meses;
Falta de independência jurídica e operacional do BC, o que explica o fato de a inflação estar persistentemente flertando com o teto da meta;
Deterioração do saldo da balança comercial, de um superávit de US$ 29,8 bilhões em 2011 para os estimados US$ 2,5 bilhões neste ano, reflexo da política econômica adotada. O déficit em conta corrente deve atingir 3,4% do PIB este ano, o pior resultado em 11 anos;
Perda de competitividade do produto nacional, dada a reduzida produtividade do trabalho e o seu aumento do custo. Segundo o Conference Board, em 2012, a produtividade do trabalho do Brasil foi apenas 18,4% da americana, enquanto a da Europa foi 69,3%. Nesse quesito, enquadra-se o cada vez mais claro esgotamento da infraestrutura, uma vez que há estímulos ao aumento da demanda, mas não ao crescimento da oferta desses serviços;
Mudanças constantes nas regras do jogo, em contratos já firmados, como ocorreu no setor de energia elétrica.
O cenário prospectivo aponta baixo crescimento com inflação elevada, uma evidência da falência do atual modelo econômico. O fato é que estamos a um ano da eleição e nada indica que o governo irá editar uma nova Carta ao Povo Brasileiro, que aponte a retomada do tripé de política econômica. Os custos de reversão da atual política serão cada vez maiores e a conta chegará já a partir de 2015. O nacional desenvolvimentismo de direita custou uma década e meia ao País, agora, resta saber quanto custará o nacional desenvolvimentismo de esquerda.
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