O Estado de S.Paulo - 23/10
Independentemente do resultado final da licitação do Campo de Libra, ficaram evidentes os problemas da atual modelagem.
O principal deles é a trombada de interesses entre governo e Petrobrás. Nas atuais regras do jogo, para o governo, tanto maior será o sucesso de um leilão do pré-sal quanto maior for a oferta em petróleo que o consórcio vencedor oferecer à União. Mas, nessas condições, poderá haver grave prejuízo para a Petrobrás.
No caso de Libra, por exemplo, a oferta mínima à União foi de 41,65% em petróleo e gás a serem produzidos. Houvesse concorrência, um consórcio agressivo poderia oferecer 60% ou 70%. Como a Petrobrás está obrigada a participar com pelo menos 30% e terá de ser a única operadora, a menor remuneração no lucro-óleo poderia inviabilizar o retorno da operação. Argumentado de outra forma, se um consórcio qualquer estivesse determinado a provocar avarias na Petrobrás, bastaria que fizesse uma proposta altamente benéfica à União e ao Tesouro. Na prática, poderia lesar a Petrobrás.
Há outras críticas. Uma delas é a de que não atinge os objetivos pelos quais foi criado. Depois de ter sido descoberta a área do pré-sal, o governo entendeu que o risco da produção nesse segmento havia caído substancialmente e que, mantido o sistema anterior, de concessões, os benefícios às empresas seriam excessivos. Por essa razão, foi instituído o regime de partilha. Nesse caso, o resultado da produção não pertence às produtoras, mas é dividido com a União, nas proporções pactuadas em contrato.
No regime de concessão, o risco e a propriedade do petróleo pertencem a quem o produz. Além do bônus de assinatura, o concessionário entrega ao setor público impostos, royalties e, no caso de reservatório altamente lucrativo, participações especiais, já previstas em lei.
Numa situação como a de agora, em que a Petrobrás já não dá conta do que tem de fazer, a exigência de participação mínima (30%) na exploração das reservas do pré-sal é problema, na medida em que pode impor sangria ao seu caixa. Também é questionável a obrigatoriedade de que seja a única operadora, especialmente quando se leva em conta o histórico de ineficiência da empresa, grande crítica feita pelo governo Dilma, que culminou com a demissão do presidente anterior, José Sergio Gabrielli.
As excessivas exigências de conteúdo local em fornecimentos e serviços também complicam. A indústria brasileira produtora de sondas, plataformas, navios, etc., opera com graves limites operacionais e custos altos demais quando comparados aos vigentes no mercado internacional. Não consegue observar prazos de entrega, provoca atrasos no início de produção e, nessas condições, produz avarias na rentabilidade do projeto. Desta vez, parece ter sido o principal fator que afastou gigantes do leilão de Libra, como Exxon, BP, Chevron e Statoil.
Argumentar que bastaria reduzir a velocidade da exploração do pré-sal para que boa parte dos problemas fosse evitada é hipotecar o futuro. Entre a descoberta de um reservatório e o início de sua produção vão sempre entre sete a dez anos, em desenvolvimento, licenciamento ambiental e investimentos em produção e logística. Imaginar que nova produção possa ser empurrada décadas à frente é brincar demais com o risco de inviabilizar o aproveitamento dessa riqueza, caso o aparecimento de novas fontes de energia e novas tecnologias venham a substituir o petróleo, como já começa a acontecer com a revolução do gás de xisto, nos Estados Unidos e no Canadá.
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