FOLHA DE SP - 04/08
Diversas consultorias têm como ofício principal vender suas projeções, é difícil crer em manipulação
Uma questão que tem perpassado o debate atual é em que medida as opiniões do mercado financeiro podem influenciar as decisões de política econômica e a economia em geral, na direção que lhe interessa.
É comum, por exemplo, pensar-se que o mercado financeiro "força" o Banco Central a praticar juros elevados, manipulando os dados de expectativa de inflação da pesquisa Focus. As previsões de inflação das instituições financeiras seriam enviesadas para valores maiores, de forma a "forçar" o Banco Central a subir a taxa Selic. A alta da taxa aumentaria os lucros dos bancos. Este seria, simplificadamente, um dos mecanismo de manipulação.
A pesquisa Focus coleta semanalmente, entre as principais instituições financeiras e consultorias, a expectativa que elas têm para diversas variáveis econômicas relevantes, como inflação, crescimento, câmbio e taxa de juros.
A suspeita de manipulação não é muito convincente, pois as instituições desejam acertar as previsões. De fato, o Banco Central divulga diversas estatísticas associadas às previsões, dentre elas a previsão das cinco instituições que mais acertam, bem como a identidade destas casas. São os famosos top five do Focus. Diversas consultorias têm como ofício principal construir modelos de previsão e vender suas projeções. É difícil acreditar em manipulação nestas circunstâncias.
De qualquer forma, recente trabalho do departamento de pesquisa do Banco Central do Brasil mostrou, para o período de 2002 a 2012, que o mercado financeiro em geral erra a previsão da inflação para menos. O erro não é muito grande, na casa de -0,5 ponto percentual para a previsão seis meses à frente, mas é estatisticamente significante. A subestimação da inflação pelo mercado aumenta um pouco conforme o horizonte de previsão eleva-se.
Assim, não tem sustentação empírica a suspeita de manipulação para mais das projeções de inflação. Ocorre o contrário: a inflação acaba surpreendendo para mais os analistas, sendo, na média, 0,5 ponto percentual acima do que se imaginava.
Uma segunda "acusação" aos analistas é a de subestimar o crescimento da atividade, instaurando um clima de pessimismo que acaba contaminando a economia real. Como se supõe que economistas do mercado financeiro não vejam com bons olhos a atual política econômica, aquele suposto pessimismo propositado poderia ser considerado uma forma sutil de sabotagem.
O mencionado trabalho do Banco Central não investiga se o mercado é pessimista em relação ao crescimento da economia. A tabela acima, entretanto, sugere que esse não é o caso.
Na primeira coluna da tabela encontra-se a previsão do Focus (a mediana da pesquisa) para o crescimento ao longo do ano. A previsão foi coletada pela pesquisa Focus no mês de dezembro do ano anterior. Com exceção de 2010, em que houve o fortíssimo crescimento do PIB de 7,5%, em grande medida recuperação da queda do ano anterior, o mercado tem superestimado o crescimento da economia.
Ou seja, toda a fortíssima perda de dinamismo que tem ocorrido na economia brasileira não tem sido prevista pela pesquisa do Banco Central junto aos analistas. Tem ocorrido o contrário do que muitos acham: é o fraco desempenho da economia que tem surpreendido o mercado, e não o pessimismo do mercado que tem contribuído para piorar o desempenho da economia.
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