O GLOBO - 12/09
A hipótese, contida na última ata do Copom, de que a política fiscal (receitas x gastos) está deixando de ser expansionista para ser neutra não confere com os fatos
O Brasil tem taxas de juros mais elevadas que as de economias mais desenvolvidas ou mesmo as emergentes. Além de questões estruturais ainda não resolvidas, uma das principais razões para os juros altos no país está no grau de responsabilidade da política monetária na dura tarefa de conter a inflação. Os demais instrumentos de política econômica que poderiam colaborar no esforço de combate à inflação acabam contribuindo menos do que deveriam, e, por isso, as atenções dos mercados sempre estão voltadas para o Banco Central.
Com a inflação flutuando perigosamente no topo (6,5%) da meta estabelecida pelo governo, a falta de uma reação mais vigorosa por parte do BC chegou a ser interpretada, meses atrás, como decorrência de alguma injunção política sobre as autoridades monetárias. Juros mais compatíveis com os vigentes no mundo são uma antiga aspiração do setor produtivo no Brasil, e, de fato, durante um período, foi possível reduzir as taxas e testar patamares até então inéditos no país. No entanto, o governo acabou tomando isso como bandeira política, sem dar o devido respaldo, por meio de outros instrumentos, à política monetária. Assim, infelizmente, esses patamares mais baixos de juros não se sustentaram, e o Banco Central teve de de voltar a elevá-los, para desarmar as expectativas muito negativas que vinham se formando em torno dos índices de inflação. Na última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), o Banco Central optou por mais uma alta de 0,5 ponto percentual, e os juros básicos chegaram a 9%, afastando-se dos 7,25% ao ano em que permaneceram por alguns meses.
A inflação arrefeceu, mas ainda se mantém acima do ponto central (4,5%) da meta. Não chegou o momento de afrouxamento da política monetária. Daí, os mercados projetarem alta dos juros básicas em próximas reuniões do Copom. No entanto, a mais recente ata do Comitê revelou uma avaliação das autoridades que, se não for bem esclarecida, pode ser preocupante. Segundo a ata, os dirigentes do BC consideram que a política fiscal (resultando das trajetórias de receitas e despesas do setor público) está deixando de ser expansionista e caminha para “a neutralidade”. É uma avaliação que não tem a concordância dos demais observadores da economia, a não ser que o BC disponha de dados que não foram divulgados.
O que se percebe é a dificuldade do setor público, com papel preponderante do governo federal, para alcançar as metas de superávit primário, mesmo reduzidas. Não há evidências que o rumo da política fiscal tenha se alterado substancialmente. Se o BC toma como parâmetro o discurso governamental e não os fatos, retornará à situação perigosa de ficar sujeito a injunções de ordem políticas, e não técnicas. A proximidade do ano eleitoral torna a questão mais preocupante, por haver a suspeita de que não interessaria à campanha de reeleição que os juros voltassem aos dois dígitos. Será dramático se o BC não puder combater a inflação como deve.
Nenhum comentário:
Postar um comentário