O GLOBO - 01/09
Os mercados tendem a agravar a formação de expectativas negativas quando percebem que há ingerência política nas decisões das autoridades monetárias
O cenário da economia mundial, na qual a brasileira está inserida, não é exatamente de céu de brigadeiro ou mar de almirante, imagens que se costuma usar para descrever quadros de tranquilidade. O cenário é mais de turbulências e águas revoltas, que exigem das autoridades econômicas a tomada de decisões capazes de evitar tempestades.
Em face da conjugação de um cenário internacional adverso e de equívocos no plano doméstico, a economia brasileira tem se defrontado com uma conjuntura de baixo crescimento e inflação persistente. No médio e longo prazos, a saída decorrerá mais de um aumento de produtividade dos chamados fatores de produção, o que depende de investimentos em infraestrutura, inovação e capital humano.
Mas, no curto prazo, os problemas não podem deixar de ser enfrentados. Isso exige que em alguns momento as autoridades responsáveis pelo controle da moeda tenham que tomar decisões duras, e corretas, como a que foi adotada há poucos dias pelo Comitê de Política Monetária (Copom), que elevou as taxas básicas de juros em meio ponto percentual, atingindo o patamar de 9% ao ano.
Trata-se de um remédio em alta dose para neutralizar as pressões sobre a inflação, que podem se agravar, no primeiro momento, com a desvalorização do real frente ao dólar, fenômeno decorrente tanto desse cenário internacional confuso como do progressivo aumento do déficit nas transações correntes (que contabilizam o intercâmbio de mercadorias e serviços do país com o exterior). É aparentemente uma decisão controversa dado que a economia vem crescendo pouco. Mas só na aparência. Parece evidente que há no curto prazo uma escassez de fatores de produção que não só limitam esse crescimento como provocam pressões sobre preços, mesmo com uma demanda enfraquecida.
Os mercados não ignoram essas dificuldades e, na formação de expectativas, contribuem para agravar uma ou outra tendência negativa, o que é mais um obstáculo às tentativas para se contornar as tempestades. Essa reação se acentua quando o Banco Central, autoridade responsável pelo controle da moeda, se vê de mãos atadas ou sob ingerência política do próprio governo.
É para não alimentar a formação de expectativas negativas que os países de economias mais desenvolvidas perceberam no passado a importância de criar um arcabouço institucional que garanta independência ou autonomia do banco central. No Brasil, infelizmente, não se caminhou nessa mesma direção. O BC passou a ter mais autonomia operacional no segundo mandato de FH e durante a administração Lula. Mas houve um retrocesso no início do governo Dilma, e hoje a economia brasileira ainda paga um preço por isso, mesmo que agora o Copom venha tomando decisões mais fortes e adequadas. O tema merece voltar ao debate, no momento em que a inflação recebe o estímulo de um choque cambial.
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