Controvérsia sobre recuo da manufatura no país não pode ser desqualificada, pois há risco real e não só lamúria de empresários ineficientes
A fraqueza da produção manufatureira, nos últimos meses e anos, aqueceu o debate sobre o risco de desindustrialização no Brasil.
No ano passado, seu crescimento foi de apenas 0,3%, uma ninharia em comparação com a alta de 6,7% no varejo. Mesmo que se considere um período mais longo, a diferença continua dramática: a manufatura está no nível do início de 2008, contra quase 35% de aumento nas vendas de varejo.
Espera-se alguma retomada para este ano. Uma parte da desaceleração de 2011 decorreu da diminuição de estoques em alguns setores, como o automobilístico, pressionados por importações crescentes e vendas internas estagnadas. Feito o ajuste, a produção pode retornar ao nível normal.
Não se deve, no entanto, confundir recuperação de curto prazo com desafios estruturais. Durante anos, foi comum desqualificar a preocupação com a indústria como lamúria de empresários interessados em favores do governo.
Hoje não é mais assim. A pura negação, contudo, deu lugar à resignação. Muitos analistas consideram o fenômeno consequência inevitável da mudança nas condições externas e internas.
Do lado externo, os altos preços das matérias-primas exportadas pelo Brasil encorpam a entrada de divisas e valorizam o real. Internamente, a renda do trabalho ampliada por políticas salariais e previdenciárias generosas estimula o consumo e o setor de serviços.
O resultado seria a especialização da economia nos setores primário e terciário, com forte geração de emprego, em troca de menor competitividade industrial. A perda de mercado para importações, por sua vez, não seria um problema, prossegue o argumento, já que boa parte delas seriam compras de bens de capital para investimento e modernização do parque industrial.
Essa análise peca por considerar que exportações de poucos produtos primários sejam confiáveis, pois uma inversão de preços traria ao país altos deficit nas contas externas. No que se refere às importações de bens de capital, é fato que o uso de equipamentos importados melhora a produtividade, mas a perda da base de conhecimento ("know-how") por fornecedores de bens finais brasileiros é uma ameaça para o futuro do país.
É temerário considerar que um país de renda média e com baixa escolaridade, como o Brasil, possa manter tal padrão de crescimento. Serviços que geram renda, hoje, são atividades complexas como design industrial e marketing, de alto conteúdo intelectual.
Sem um sistema de ensino melhor, a produtividade em serviços não crescerá o suficiente para dar emprego e renda para cerca de 150 milhões de brasileiros adultos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário