O Estado de S.Paulo - 19/01
A cada verão pipocam na imprensa notícias sobre colapsos no abastecimento de água, especialmente em cidades litorâneas. É também a temporada em que parte da população percebe que tem gente que está mantendo abertas demais as torneiras, no chuveiro, no jardim ou até mesmo nas lavagens de calçadas.
E, no entanto, os dirigentes das empresas responsáveis pelo abastecimento de água já não se importam mais a conclamar a população a poupar água. A Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp), por exemplo, enterrou numa gaveta qualquer a velha e bem-sucedida campanha de esclarecimento que tinha por mote "sabendo usar, não vai faltar". E isso está acontecendo provavelmente porque hoje seus dirigentes só pensam em faturar, não se importando se o uso do líquido, que um dia já foi considerado precioso, é adequado ou não.
A população brasileira ainda mantém hábitos perdulários. Quilômetros e quilômetros de calçadas seguem sendo lavados, por vezes diariamente, até que a última folhinha caída da árvore próxima seja empurrada por jatos de mangueira ao meio-fio.
Nem sempre o consumidor tem o cuidado de impedir vazamentos em aparelhos sanitários ou torneiras. Inúmeros postos de combustíveis oferecem duchas gratuitas como brinde para quem se reabastece por lá, com água extraída dos lençóis freáticos para os quais não pagam tarifa de esgoto. E, há uma semana, esta Coluna advertiu que a exigência de lavagem do lixo a ser reciclado também leva a desperdícios. A própria Sabesp reconhece que para a lavagem de um copo são necessários pelo menos outros dois copos de água.
Esses hábitos são considerados "absurdos" pelo professor Geraldo Silveira, do Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). "A água que sai da torneira tem requisitos de qualidade elevados para ser potável", argumenta. O ideal nesses casos seria o uso da chamada "água cinza", reaproveitada do escoamento das chuvas.
O presidente da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental em São Paulo (ABES-SP), Alceu Bittencourt, adverte que a água tratada "é um bem econômico obtido a custos cada vez mais altos. No entanto, a população segue imaginando que água é de graça".
A direção da Sabesp parece pensar diferentemente. O superintendente de Desenvolvimento Operacional da Sabesp, Eric Carozzi, apresenta outras justificativas: "Aquilo que é desperdiçado após a distribuição já está pago pelo cliente, não gera perdas no abastecimento nem prejuízo para a empresa".
No passado, as campanhas de economia foram mais valorizadas. A redução mensal do consumo de 70 milhões de litros de água, gerada com ações da Sabesp em 600 escolas estaduais em 2009, equivale a um volume suficiente para abastecer 16 mil habitantes por um mês. Por outro lado, após uma redução de 22% entre 1998 e 2004, o consumo médio residencial de água na Grande São Paulo permanece o mesmo há quase dez anos (veja o gráfico acima).
Ainda é possível reduzir mais o consumo no âmbito doméstico. Silveira entende que a melhor maneira de combater o desperdício é adotar sistemas individualizados de medição. Onde isso ocorre, o consumo de água tende a cair 30%. Hoje, a grande maioria dos condomínios residenciais mantém uma conta comum de água e nem sempre o morador olha para o volume consumido.
O problema é que a medição individualizada em construções antigas exige reforma em todas as instalações hidráulicas, o que nem sempre é viável, pela sua execução complexa e seus altos custos.
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