FOLHA DE SP - 10/10
'Nova política econômica' murchou; precisamos de crise para nos mexermos?
A ÚLTIMA MUDANÇA relevante na política econômica ocorreu em 2008-09. Foi quando Lula pegou o bonde mundial das intervenções estatais contra a crise medonha que estourou em 2008, o que deu no desenvolvimentismo acidental dos anos recentes.
Os "experimentos" econômicos mundiais legitimaram medidas excepcionais anticrise que, enfim, se tornaram um programa de intervenções estatais mal-ajambradas, um desenvolvimentismo improvisado, acidental.
Vieram o financiamento estatal da criação de oligopólios e megaempresas privados, a estatização do crédito bancário e métodos inusuais de administração da moeda e do crédito (política monetária).
Mais tarde, Dilma Rousseff aumentaria a dose e a mistura dessa vitamina. Gastou mais, tentou controles mais ou menos indiretos de preços, "política de rendas", "gerenciamento" do investimento privado (via tapas e beijos) e outras expansões estatais (como no pré-sal).
O fiasco da tentativa de colocar a economia em marchinha forçada não produziu nem estrépito, nem crise, nem nada. Embora genuinamente espantado com o fiasco, o governo apenas começou a mudar de assunto.
Não trata mais de lucro e juro alto de banco. De inventar empresas "campeãs nacionais", as "múltis brasileiras". De turbinar bancos públicos por meio de endividamento público. De estropiar ainda mais as contas públicas. De enfiar estatais em concessões malfeitas ao setor privado, embora nesse caso o cachimbo ainda tenha deixado a boca bem torta.
Provavelmente, o governo jogou a toalha devido ao efeito pífio dos anabolizantes fiscais e de crédito, ao descrédito doméstico e externo da sua política e, enfim, à falta de meios para continuar na mesma toada.
O governo não tem como gastar muito mais sem risco de crise. A inflação ficou em torno de 6% e caiu na boca do povo. O deficit externo se aproxima do número mítico de 4% do PIB. Haverá menos capital barato no mundo. Acabou o gás.
Mas não há "crise", tumulto. O desemprego é baixo, a renda sobe, não estamos perto de colapso fiscal (governo sem crédito) ou externo (sem dólares). Um observador com pouca paciência poderia dizer que ainda podemos fazer besteira por algum tempo antes de nos metermos em convulsão.
O que vai nos tirar da modorra? Em geral, crises fazem o serviço. Porém, mesmo uma crise horrível, como a hiperinflação de 1981-94 num país mais desigual e que empobrecia, foi empurrada com a barriga. Isto é, com planos econômicos milagreiros, com a morfina da correção monetária e com esperanças de mudança imediata derivada da política (democratização, Constituição).
A crise financeira mundial de 1997-98, mais os desequilíbrios do real, produziu alguma mudança econômica sob FHC (desvalorização de 1999, metas de inflação e maior controle fiscal). As crises do apagão e de 2001, mais o medo de Lula, levaram ao colapso de 2002-03, que colocou o governo no trilho "ortodoxo" (em termos) de 2003-07. Como se escreveu acima, a crise de 2008 abriu a porteira para o desenvolvimentismo acidental.
Vamos precisar de outra crise a fim de nos mexermos?
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