FOLHA DE SP - 10/10
Projeto de lei que inibe criação de partidos políticos é bem-vindo, mas Congresso precisa ir além e instituir uma cláusula de desempenho
Não chega a ser a salvação da lavoura em que se cultivam as legendas de aluguel, mas o projeto de lei que inibe a criação de partidos políticos e o troca-troca entre as agremiações tem seus méritos.
Aprovado anteontem no Senado, o texto --que segue para sanção presidencial-- deixa claro que os recursos do Fundo Partidário, assim como o tempo de propaganda política no rádio e na televisão, serão divididos entre as siglas de maneira proporcional ao número de deputados federais eleitos no pleito imediatamente anterior.
Trata-se de mudança significativa em relação às regras atuais. Hoje, quando um deputado migra de uma agremiação para outra, ele leva consigo uma fatia do latifúndio das benesses partidárias.
O entendimento, nada explícito na lei sobre partidos políticos, foi consagrado no ano passado pelo Tribunal Superior Eleitoral durante julgamento de demanda do PSD.
A sigla então recém-criada pelo ex-prefeito de São Paulo Gilberto Kassab conseguiu, na prática, transformar Fundo Partidário e propaganda eleitoral em atributos pessoais de cada deputado --e não da legenda, como deveria ser.
O projeto ora aprovado pelo Congresso Nacional corrige essa evidente distorção, que vinha distribuindo recursos públicos volumosos a agremiações antes mesmo de elas passarem pelo teste das urnas --casos do próprio PSD, do Pros (Partido Republicano da Ordem Social) e do Solidariedade.
Seria ingênuo supor que a nova lei estabelecerá um regime de plena fidelidade partidária no Brasil. Eliminará, porém, boa parte dos estímulos existentes para a criação de novas legendas.
É razoável supor que, na próxima quadratura, somente grupos que têm verdadeira pretensão de representar algum segmento populacional se arriscarão a lançar suas sementes --como parece ser o caso da Rede Sustentabilidade, de resto atingida pelas novas regras.
Além disso, a lei desestimulará o bandeamento de deputados. Das quase 60 migrações registradas na Câmara neste ano, 37 referem-se a parlamentares que se filiaram ao Solidariedade ou ao Pros. Nos Estados, foram 139 transferências, 53 das quais para as novas siglas --isentas das normas da fidelidade.
É preciso ir além, contudo. As benesses eleitorais são pagas pelos contribuintes. Não faz sentido que a elas tenham pleno direito partidos sem representatividade.
Insista-se: passou da hora de o Congresso aprovar uma cláusula de desempenho, restringindo Fundo Partidário e tempo de TV às agremiações de fato apoiadas pelos eleitores. A política brasileira precisa deixar de ser campo fértil para ervas daninhas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário