O Estado de S.Paulo - 10/10
Ao levantar a bandeira (eleitoral) da mobilidade urbana, o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, e o secretário municipal de Transportes, Jilmar Tatto, assumiram o papel de defensores dos sem-carro e passaram a combater, sem pensar nas consequências, a multidão dos que se atrevem a sair às ruas em seus automóveis, mesmo tendo de enfrentar grandes congestionamentos todos os dias. Os congestionamentos são cada vez maiores, mas a dupla já começa a acumular resultados "positivos" nessa batalha, mais do que ousada, demagógica.
Ela deve melhorar a arrecadação da Prefeitura com o aumento das multas de trânsito e, assim, ajudar a pagar os subsídios às empresas de ônibus, que, com o congelamento da tarifa, devem atingir no próximo ano a impressionante quantia de R$ 1,65 bilhão.
Estima-se que os recursos provenientes das multas crescerão 22% em 2014, atingindo R$ 1,2 bilhão, um novo recorde. Nos primeiros oito meses deste ano, dos 6,4 milhões de multas aplicadas aos motoristas que circulam pela capital, 352,5 mil foram flagrantes de invasões em corredores e faixas exclusivas de ônibus, registrados por um exército de 1,5 mil fiscais de trânsito da CET e mais 690 da São Paulo Transportes (SPTrans).
Os donos dos 7 milhões de veículos da capital parecem não ter importância. Eles seriam apenas pessoas egoístas que rejeitam o transporte público. É como se não tivessem compromissos diários, serviços a prestar e nenhuma relevância para a vida econômica e social da cidade.
Tanto é assim que, nas próximas semanas, aos marronzinhos se somarão 200 novos radares para ajudar na batalha contra esses paulistanos que não resistem à tentação de circular pelos corredores e faixas de ônibus - espaços em grande parte vazios -, para tentar chegar a tempo aos seus compromissos.
Essa má vontade com o transporte individual prejudica a cidade. Não se discute a necessidade de dar prioridade ao transporte público e, no caso dos ônibus, de aumentar sua velocidade.
Mas não é preciso fazer isso criando dificuldades para os que usam o carro como instrumento de trabalho. Especialmente para aqueles - como médicos e enfermeiros, para citar dois exemplos - cuja profissão tem exigências que o transporte público não consegue atender.
Portanto, em vez de tratar o transporte individual como egoísta e elitista, é preciso estudar a fundo o papel que ele desempenha na vida de grande parte da população. Quanto aos paulistanos que usam ônibus, seus problemas são a falta de conforto, de itinerários que atendam a suas necessidades e a lentidão.
Por isso, entre ficar espremidos em ônibus superlotados, depois de longa espera nas filas dos pontos, e suportar os congestionamentos, os que podem preferem esta última opção.
No lugar de implantar, sem planejamento e a toque de caixa, as faixas exclusivas que servirão de cenários para os próximos programas eleitorais do PT na campanha para o governo do Estado, Haddad e Tatto deveriam adotar um plano capaz de harmonizar a utilização de carros com o transporte público, de acordo com as necessidades das várias regiões da cidade.
Antes de reduzir o espaço destinado aos carros para forçar seus proprietários a deixá-los nas garagens, é preciso criar mais vagas de estacionamento para eles, com a construção - há muito prometida e nunca concretizada - de garagens subterrâneas. E seria bom também retomar o plano de transporte do governo Marta Suplicy que deixava os corredores apenas para os ônibus maiores. Os veículos de média e pequena capacidade seriam os alimentadores dessas linhas-tronco.
Hoje, o que se vê são todos esses veículos, às vezes quase vazios, disputando entre si aquele espaço. E muitos invadem as poucas faixas destinadas aos carros para fugir do congestionamento nos corredores e faixas.
É preciso, em suma, mais planejamento e menos demagogia.
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