GAZETA DO POVO - PR - 08/04
A Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM) da Câmara dos Deputados não teve um dia de paz desde que o deputado Marco Feliciano (PSC-SP) foi confirmado como presidente do órgão. O parlamentar, que também é pastor da Assembleia de Deus, foi indicado por seu partido e vem sendo questionado por causa de uma série de declarações racistas e por já ter se declarado contrário ao casamento homossexual. Uma vez eleito e empossado, Feliciano só deixa a presidência da CDHM se renunciar.
Já houve de tudo nas sessões da CDHM, que ocorrem semanalmente: manifestantes subindo em mesas, deputados batendo boca e quase chegando à agressão, e até uma ordem de prisão, emitida (irregularmente, diga-se de passagem) por Feliciano contra uma pessoa que o acusou de racismo. Sessões foram suspensas quando dezenas de militantes, aos gritos, impediram os trabalhos. Agora, o deputado decidiu que as reuniões da comissão serão feitas com acesso restrito. Fora do Congresso, protestos de rua, abaixo-assinados e “beijaços” de artistas também vêm sendo empregados como meios de pressão.
Que Feliciano não tem nem de longe o perfil para presidir a CDHM esta Gazeta do Povo já disse em março. No entanto, no mesmo prédio onde militantes buscam remover o deputado-pastor da comissão, algo ainda pior ocorre sem que um único cartaz seja erguido, uma única palavra de ordem seja dita, uma única mesa seja escalada por um manifestante, um único beijo de protesto seja dado: referimo-nos à presença dos mensaleiros condenados João Paulo Cunha e José Genoino na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).
É verdade que nem Cunha nem Genoino presidem a comissão, e por isso eles têm menos influência sobre a condução dos trabalhos da CCJ em comparação com a que Feliciano tem sobre a CDHM. Ainda assim, o descaso com a moralidade fica nítido. A simples posse de Genoino, em janeiro – substituindo um deputado petista que havia vencido uma eleição para prefeito no interior de São Paulo –, já era um acinte, apesar de ter ocorrido segundo os trâmites legais. Mas é inaceitável que ele e Cunha tenham sido escolhidos pelo PT para fazer parte da comissão que analisa os aspectos legais de projetos, temas ligados aos direitos e garantias fundamentais e até a perda de mandato de deputados, situação que pode atingir os próprios Cunha e Genoino.
Diante de tamanho descalabro, é até possível se perguntar se todo o caso Feliciano não foi uma jogada de mestre do PT, que sempre manteve sob seu controle a Comissão de Direitos Humanos, mas desta vez abriu mão dela, entregando-a ao PSC já sabendo que a presença de Marco Feliciano atrairia todos os holofotes. Assim, o partido conseguiria colocar os mensaleiros na CCJ causando o mínimo de turbulência, já que toda a indignação popular estaria dirigida a Feliciano.
A revolta, no entanto, não exige exclusividade; os manifestantes que gritam contra Feliciano na Câmara podiam muito bem gritar também contra os mensaleiros; os artistas que se beijam em protesto contra o presidente da CDHM poderiam dedicar um selinho, ou pelo menos uma palavra, ao caso de Cunha e Genoino. Mas não é isso o que acontece. E, quando a revolta contra um parlamentar motivada por suas opiniões supera em muito a indignação ao ver criminosos condenados participando de uma comissão ainda mais importante, é sinal de que as prioridades estão invertidas no senso político nacional.
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