O GLOBO - 08/04
Mudanças urbanísticas invariavelmente implicam algum grau de sacrifício para a população, tanto maior quanto mais densamente povoadas são as áreas sob intervenção. Se, adicionalmente, as alterações ocorrem numa metrópole sem uma política de ocupação planejada, como o Rio, potencializam-se os transtornos. Mas não há outra saída. É o que vem ocorrendo em diversos pontos da cidade, que passa por uma frenética fase de transformações, causa de não poucas irritações em razão da profusão de canteiros de obras em diversos bairros.
Na Zona Portuária dá-se a junção de todos esses ingredientes. Ali, a prefeitura viu-se obrigada a recorrer a projetos radicais para recuperar uma área submetida a décadas de degradação, em face do abandono a que foi condenada por políticas urbanas que alijaram a região dos programas de melhorias, preservação e modernização. O mais importante deles é a própria decisão de contrabalançar o eixo de crescimento da cidade, transferindo para o Porto e suas adjacências investimentos em obras públicas que, mudando o perfil físico dos bairros locais, os reintegrarão ao mapa de ocupação da cidade.
Como decorrência dessa opção pela recuperação de uma área de grande potencial econômico, de lazer e habitacional — até então mantida em virtual adormecimento —, tornou-se necessário incluir no programa de resgate projetos adjacentes de efeitos profundos na cidade. Caso da remoção da parte do Elevado da Perimetral que costeia a região em processo de resgate urbanístico. Ao ser construído, o viaduto foi uma solução para desafogar o trânsito de uma região da cidade que começava a se ressentir de demandas de um tráfego pressionado por sucessivos aumentos da frota em circulação. De fato, a Perimetral cumpriu esse papel, mas, ao virtualmente seccionar da dinâmica do município a Zona Portuária, agravou a deterioração do Porto.
O Porto Maravilha não pode prescindir do desmonte da Perimetral. O elevado é incompatível com o espírito modernizante e de resgate paisagístico de um programa que, tanto quanto alterar a circulação viária, pretende valorizar o potencial urbanístico da região onde está parte importante da história do Rio. O viaduto tirou da população a vista da Baía de Guanabara, deixando, em troca, uma blindagem de cimento e ferro.
São argumentos consideráveis, mas cujo destino seriam as gavetas das boas intenções se não estivessem ancorados em sólidos projetos de rearrumação do sistema viário da Zona Portuária, em curso. É fato que, dentro do perfil anterior do Porto, o elevado ocupava um papel crucial para o escoamento do trânsito de passagem pela região. Uma questão a ser resolvida com as intervenções em andamento, como se prevê. Com transtornos pontuais, mas, a médio prazo, com o benefício da reinserção ao mapa da cidade de uma área- chave para o crescimento equilibrado do município e resgate da história.
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