A continuidade política do último decênio não se reproduziu na política econômica. Na crise de 2002, para poder garantir condições mínimas de governabilidade, o presidente Lula foi forçado a romper com a política econômica historicamente defendida pelo PT e abraçar as políticas do governo anterior, até mesmo as aprofundando, como no caso do aumento da meta para o superávit primário. No dizer de um especialista, Lula viu o abismo, e dele sabiamente soube se afastar. Por ter a política econômica até 2005 dado seguimento ao que vinha sendo feito no governo anterior, a economia pôde surfar o tsunami de prosperidade que veio da China.
Infelizmente, assim que a pressão se reduziu, as politicamente custosas reformas estruturais que deveriam alavancar nosso crescimento foram colocadas de lado. Em vez de preparar para o inverno, passamos a maior parte do verão da economia mundial cantando, tal como a cigarra da fábula de La Fontaine. Tendo o verão chegado ao fim, nossos policy-makers, visivelmente atarantados, tentam sobreviver, aos trancos e barrancos, ao inverno de baixo crescimento com inflação. Culpam a crise externa, como se a chegada de invernos fosse algo novo. Até mesmo as formigas do continente, Chile, Colômbia, México e Peru, exibem robusto crescimento com inflação controlada, numa demonstração cabal de que teria sido possível trajetória bem melhor.
Mas, ao contrário do destino da cigarra na fábula, a vida continua. É, portanto, fundamental avaliar se estamos, ao menos, nos preparando bem para o futuro. Infelizmente, o quadro não se afigura alvissareiro.
Vale repassar os principais erros da política econômica recente. Muitos deles advêm do uso de ferramentas inadequadas para os fins almejados. No caso da política anti-inflacionária, o objetivo (correto) de baixar os juros, mas sem um correspondente ajuste fiscal, está produzindo inúmeras distorções. Cortam-se impostos para controlar a inflação. Conquanto o Brasil precise reduzir a carga tributária, corte (temporário?) de impostos não deveria fazer parte da política anti-inflacionária. Além disso, sem reduzir simultaneamente os gastos fiscais, o corte de impostos aumenta o déficit fiscal.
Aumentaram-se tarifas de importação para beneficiar a indústria, mas agora, devido ao previsível aumento de preços, ameaça-se com a baixa de tais tarifas. As tarifas não deveriam ser instrumentos anti-inflacionários, e tal tipo de política distorce o comportamento dos empresários, que passam a privilegiar o lobbying em Brasília, bem mais lucrativo do que o custoso e incerto investimento em aumento de produtividade.
Quer-se, corretamente, baixar o custo da indústria. Como uma desoneração mais abrangente é inviável, devido aos altos gastos fiscais, oferecem-se compensações via crédito barato, o que comprometerá orçamentos futuros, elevando o risco fiscal da economia.
Na verdade, o crédito subsidiado não devidamente reconhecido no orçamento tem-se tornado a panaceia da política econômica. Baixaram-se as tarifas de energia, mas o custo da utilização das usinas térmicas ameaça as distribuidoras de energia. Solução? crédito subsidiado. Concebe-se mal e tardiamente a privatização de serviços de infraestrutura, obrigando a que, mesmo em um mundo inundado por liquidez, o governo venha a oferecer crédito subsidiado para viabilizar os empreendimentos. Estamos voltando a criar os esqueletos fiscais que virão comprometer nosso crescimento futuro. Como até insuspeitos defensores da atual política econômica reconhecem, truques contábeis para falsear as estatísticas fiscais estão dilapidando a reputação do país, duramente construída.
Retornando à política monetária, práticas ultrapassadas, que se julgava bem enterradas, reaparecem como zumbis. Recentemente, o BC autorizou a liberação de parte dos depósitos compulsórios dos bancos para o financiamento de operações elegíveis pelo CMN, numa reedição do finado mecanismo de "crédito seletivo" dos anos 70. Compulsório é instrumento de política monetária. crédito subsidiado deve constar do orçamento fiscal. Não causaria grande espanto se o próximo desatino viesse a ser o uso das reservas internacionais para financiar projetos de investimento. Quem sabe até o BC, na contramão da história, viesse a ser reinvestido de sua função pregressa de banco de fomento, que teve até a criação da Secretaria do Tesouro e o fim da conta movimento, em meados dos anos 80, e até mesmo chegasse a criar uma diretoria de infraestrutura, como, no passado, existiu a Diretoria de crédito rural e Industrial (Dicri)!
Em suma, o abandono da agenda de reformas microeconômicas estruturais e, gradativamente, do tripé macroeconômico, vem transformando nossa política econômica num Frankenstein, no qual cada novo pedaço adicionado gera mais dano colateral do que benefício.
Qual a chance de retornarmos ao bom caminho que trilhamos até 2005? Infelizmente, muito pequena. Ao contrário de Lula, treinado no mundo sindical na busca de resultados concretos, a presidente Dilma é herdeira de ampla bagagem ideológica da esquerda pré-queda do Muro de Berlim. Além disso, nossa confortável situação atual, inclusive com quase US$ 400 bilhões de reservas internacionais, é muito distinta do abismo de 2002. A política econômica atual é a da presidente. Não é provável que venha a sofrer grandes modificações.
Infelizmente, assim que a pressão se reduziu, as politicamente custosas reformas estruturais que deveriam alavancar nosso crescimento foram colocadas de lado. Em vez de preparar para o inverno, passamos a maior parte do verão da economia mundial cantando, tal como a cigarra da fábula de La Fontaine. Tendo o verão chegado ao fim, nossos policy-makers, visivelmente atarantados, tentam sobreviver, aos trancos e barrancos, ao inverno de baixo crescimento com inflação. Culpam a crise externa, como se a chegada de invernos fosse algo novo. Até mesmo as formigas do continente, Chile, Colômbia, México e Peru, exibem robusto crescimento com inflação controlada, numa demonstração cabal de que teria sido possível trajetória bem melhor.
Mas, ao contrário do destino da cigarra na fábula, a vida continua. É, portanto, fundamental avaliar se estamos, ao menos, nos preparando bem para o futuro. Infelizmente, o quadro não se afigura alvissareiro.
Vale repassar os principais erros da política econômica recente. Muitos deles advêm do uso de ferramentas inadequadas para os fins almejados. No caso da política anti-inflacionária, o objetivo (correto) de baixar os juros, mas sem um correspondente ajuste fiscal, está produzindo inúmeras distorções. Cortam-se impostos para controlar a inflação. Conquanto o Brasil precise reduzir a carga tributária, corte (temporário?) de impostos não deveria fazer parte da política anti-inflacionária. Além disso, sem reduzir simultaneamente os gastos fiscais, o corte de impostos aumenta o déficit fiscal.
Aumentaram-se tarifas de importação para beneficiar a indústria, mas agora, devido ao previsível aumento de preços, ameaça-se com a baixa de tais tarifas. As tarifas não deveriam ser instrumentos anti-inflacionários, e tal tipo de política distorce o comportamento dos empresários, que passam a privilegiar o lobbying em Brasília, bem mais lucrativo do que o custoso e incerto investimento em aumento de produtividade.
Quer-se, corretamente, baixar o custo da indústria. Como uma desoneração mais abrangente é inviável, devido aos altos gastos fiscais, oferecem-se compensações via crédito barato, o que comprometerá orçamentos futuros, elevando o risco fiscal da economia.
Na verdade, o crédito subsidiado não devidamente reconhecido no orçamento tem-se tornado a panaceia da política econômica. Baixaram-se as tarifas de energia, mas o custo da utilização das usinas térmicas ameaça as distribuidoras de energia. Solução? crédito subsidiado. Concebe-se mal e tardiamente a privatização de serviços de infraestrutura, obrigando a que, mesmo em um mundo inundado por liquidez, o governo venha a oferecer crédito subsidiado para viabilizar os empreendimentos. Estamos voltando a criar os esqueletos fiscais que virão comprometer nosso crescimento futuro. Como até insuspeitos defensores da atual política econômica reconhecem, truques contábeis para falsear as estatísticas fiscais estão dilapidando a reputação do país, duramente construída.
Retornando à política monetária, práticas ultrapassadas, que se julgava bem enterradas, reaparecem como zumbis. Recentemente, o BC autorizou a liberação de parte dos depósitos compulsórios dos bancos para o financiamento de operações elegíveis pelo CMN, numa reedição do finado mecanismo de "crédito seletivo" dos anos 70. Compulsório é instrumento de política monetária. crédito subsidiado deve constar do orçamento fiscal. Não causaria grande espanto se o próximo desatino viesse a ser o uso das reservas internacionais para financiar projetos de investimento. Quem sabe até o BC, na contramão da história, viesse a ser reinvestido de sua função pregressa de banco de fomento, que teve até a criação da Secretaria do Tesouro e o fim da conta movimento, em meados dos anos 80, e até mesmo chegasse a criar uma diretoria de infraestrutura, como, no passado, existiu a Diretoria de crédito rural e Industrial (Dicri)!
Em suma, o abandono da agenda de reformas microeconômicas estruturais e, gradativamente, do tripé macroeconômico, vem transformando nossa política econômica num Frankenstein, no qual cada novo pedaço adicionado gera mais dano colateral do que benefício.
Qual a chance de retornarmos ao bom caminho que trilhamos até 2005? Infelizmente, muito pequena. Ao contrário de Lula, treinado no mundo sindical na busca de resultados concretos, a presidente Dilma é herdeira de ampla bagagem ideológica da esquerda pré-queda do Muro de Berlim. Além disso, nossa confortável situação atual, inclusive com quase US$ 400 bilhões de reservas internacionais, é muito distinta do abismo de 2002. A política econômica atual é a da presidente. Não é provável que venha a sofrer grandes modificações.
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