O GLOBO - 23/03
Não se desconhece a precaridade da infraestrutura do país, causada pela falta de investimentos. O problema começou a ficar mais evidente no final do primeiro governo de Lula, no apagão aéreo, o acompanhou no segundo mandato, mas agora se apresenta em grandes proporções num curto-circuito rodoviário e portuário, no escoamento da supersafra de grãos.
Não atazana mais “apenas” usuários do transporte aéreo, motoristas estressados em engarrafamentos. Começa também, de forma clara, a prejudicar uma atividade econômica estratégica, com a ameaça de redução no fluxo de divisas para o país, num momento em que se acumulam déficits na balança comercial. Por ter entendido, afinal, o beco sem saída para onde o Brasil foi levado, a presidente Dilma procura recuperar terreno com acenos aos investidores privados. Mas o passivo acumulado pela leniência diante da deterioração geral e do surgimento de gargalos é muito grande, e levará tempo para ser eliminado.
O cancelamento da compra de 2 milhões de toneladas de soja pela grande importadora chinesa Sunrise, por atraso na entrega da carga, é apenas um caso — grave, é certo — entre tantos. Não vale argumentar que espertos chineses aproveitam o apagão rodoportuário para negociar preços mais baixos. Ora, se a esperteza oriental entrou em ação é porque o Brasil abriu um flanco.
As filas de mais de 20 quilômetros de caminhões às portas do Porto de Santos e, no mar, uma frota de 150 navios à espera de vaga nos terminais são sinônimo de prejuízos milionários. É até possível que as exportações de soja não superem as de minério de ferro, estimadas em US$ 30 bilhões. Os embarques do grão não devem chegar aos projetados US$ 33 bilhões.
Cai sobre o governo Dilma o resultado de uma mistura de prevenção ideológica contra o setor privado com falhas gerenciais. Não se deve menosprezar o resultado mortífero do cruzamento da incompetência com a ideologia.
O preconceito ideológico de alas petistas travou o quanto pôde a licitação de aeroportos, limitou a de rodovias e tentou tabelar para baixo a margem de rentabilidade de concessionários. Sempre com a ajuda de corporações sindicais, uma delas a de portuários, no momento na trincheira da resistência ao aperfeiçoamento da gestão dos terminais. Não por acaso, onde se dá parte do atual apagão.
Dilma, para resolver o problema, precisa, além de enfrentar aliados, contrariar a tradição petista de privilegiar os gastos em custeio e deixar os investimentos em segundo plano.
Há, também, compromissos políticos fisiológicos que conspiram contra a eficiência nos gastos.. Quinta-feira, a presidente recebeu o senador Alfredo Nascimento (PR-AM), afastado do ministério dos Transportes na “faxina ética”. Em sua gestão, muito dinheiro para a infraestrutura foi desviado em negociatas partidárias. Nessas conversas, a presidente não pode se esquecer do que acontece no momento em estradas e portos.
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