FOLHA DE SP -08/12
SÃO PAULO - Médicos adoram discordar uns dos outros. Isso vale para quase tudo, do diagnóstico do paciente às políticas para a saúde. A exceção é a ideia de que há escolas médicas demais, que formam muito mais profissionais do que seria necessário. Mas será que é verdade?
Tenho dúvidas. Para começar, a proporção de médicos por mil habitantes do Brasil não chega perto da de países desenvolvidos ou nem tanto. Nossa taxa é de 1,8 por mil, contra 2,4 dos EUA, 3,1 da Argentina, 4 da Bélgica ou 4,4 da Rússia. Temos problemas de distribuição, com forte concentração de profissionais nas áreas urbanas ricas e carência em zonas menos povoadas, mas isso ocorre em vários países democráticos. É um efeito colateral da liberdade.
O que mais me preocupa, entretanto, é que os médicos parecem ter chegado à convicção de que há profissionais em demasia sem se escudar num estudo mais consistente de demandas futuras (se existe um, não conheço, apesar de ter procurado).
Esse mesmo erro já foi cometido pelos americanos. Até os anos 90, eles projetavam, para o ano 2000, um excesso da ordem de 145 mil médicos. Para evitar desemprego, fecharam vagas nas residências, limitando o número de profissionais.
Veio o ano 2000 e não apenas as profecias não se realizaram -não é comum encontrar médicos dirigindo táxis em nenhuma parte dos EUA-como, hoje, se prevê um deficit de 85 mil a 200 mil profissionais em 2020.
O que deu errado com as primeiras projeções? Elas não levaram em conta fatores como o envelhecimento populacional (e, com ele, a maior prevalência de doenças crônicas) e o fato de que a demanda por serviços médicos cresce quase na mesma proporção do PIB. Se a sociedade fica mais rica, mais médicos, preferencialmente especialistas, são requisitados. Como formar um profissional leva ao menos dez anos, convém ter muita clareza de diagnóstico antes de definir as políticas públicas.
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