FOLHA DE SP - 02/02
SÃO PAULO - Por ocasião do Dia do Holocausto, o rabino Michel Schlesinger e o cardeal dom Odilo Scherer publicaram na edição de segunda desta Folha um interessante artigo em que levantam uma questão que há séculos atormenta religiosos: como conciliar a ideia de um deus bom com o sofrimento de inocentes. "Como se pode ainda acreditar em Deus depois de Auschwitz?", escreveram.
Schlesinger e Scherer concluem que o Holocausto não foi obra de Deus, mas de homens e suas ideologias. Como não acredito em Deus, concordo, mas, para os que creem, receio que não seja tão fácil assim limpar a barra do Criador. O problema do mal, conhecido como teodiceia, constitui uma dificuldade filosófica real, e as respostas até hoje oferecidas deixam muito a desejar.
O argumento antiteísta é simples. Se há um deus onisciente, onipotente e benevolente, então não existe mal. Ora, há mal no mundo. Portanto, um deus onisciente, onipotente e benevolente não existe. A forma lógica do raciocínio, "modus tollens", é impecável. Se as premissas são verdadeiras, a conclusão necessariamente também o é. Daí que, para esboçar uma resposta, é preciso negar a onipotência/onisciência de Deus, sua benevolência ou a existência do mal.
Todas foram tentadas. Especialmente os cristãos gostam de afirmar que Deus renunciou a interferir em ações humanas para nos dar o livre-arbítrio. Outra saída popular é dizer que, ao contrário de Deus, nós não temos todas as informações e é possível que o que nos pareça um mal ou uma injustiça sejam, na verdade, um meio para produzir um bem maior.
Tais respostas permitem um rico debate filosófico, mas não me convencem. Por que então Deus não criou homens incapazes de fazer o mal, para início de conversa? A hipótese mais simples, de que não há um deus com os três atributos, me parece infinitamente mais plausível. E também torna mais fácil responsabilizar os homens por suas ações.
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