VALOR ECONÔMICO - 03/01
Aproveito esta primeira coluna de 2013 para retornar a um tópico que havia tangenciado no fim do ano passado: a queda do investimento. Assim como no caso do Produto Interno Bruto (PIB), o Brasil tem apresentado um desempenho muito aquém de seus pares na América Latina. Em particular, o investimento vem caindo em termos absolutos desde o segundo trimestre de 2011, recuando para pouco mais de 18% do PIB no terceiro trimestre do ano passado de 19,4% do PIB em seu pico mais recente.
Dada a forte queda da taxa real de juros no período, tal desempenho é surpreendente, no mau sentido da palavra. Isto obviamente não quer dizer que os juros não tenham qualquer efeito sobre o investimento, mas implica concluir que há provavelmente outros elementos atuando no sentido contrário e com maior intensidade.
Tenho chamado a atenção para a pesada intervenção governamental e sua orientação antilucro como possíveis fatores que contribuem para a perda de atratividade do investimento, mas confesso que ainda não consegui dar uma expressão quantitativa a esta hipótese, que permanece como conjectura não testada.
Há, porém, outra possibilidade, que me foi levantada pela entrevista do secretário de Política Econômica no Valor. Questionado sobre a possibilidade da desvalorização da moeda ter encarecido os bens de capital, o secretário alegou que "[a] taxa de câmbio (...) foi corrigida para um nível que não afeta o custo de importação dessas máquinas".
Esta afirmação pode ser confrontada facilmente com os fatos. A Funcex estima os preços, em dólares, dos bens de capital importados. Este índice, multiplicado pela taxa de câmbio, nos fornece uma estimativa de quanto tais bens custam em moeda local. Uma vez corrigindo estes dados pela inflação (o deflator do PIB) temos uma ideia da evolução dos preços reais dos bens de capital importados (ou do preço destes bens relativamente ao PIB, que é a mesma coisa).
O gráfico revela sua evolução desde 2004, mostrando queda apreciável destes preços no período, com uma breve, ainda que intensa, interrupção em 2008-09, dada a forte depreciação da moeda em seguida à crise internacional. Mais recentemente, porém, os preços reverteram este comportamento, aumentando 16% a partir do terceiro trimestre de 2011, já deduzida a inflação.
Dado que preços em dólares permaneceram praticamente estáveis no período, a única conclusão possível foi que o encarecimento dos bens de capital importados reflete a desvalorização do real face ao dólar. Como, porém, estes bens são competidores potenciais de produtos locais, seus custos mais altos tendem a se traduzir na elevação dos preços da produção nacional, fato que é comprovado, por exemplo, pela evolução dos itens máquinas e material de transporte (exceto automóveis) no Índice de Preços ao Produtor do IBGE.
Ocorre que preços mais elevados de bens de capital devem necessariamente reduzir o retorno do investimento, pois obrigam a desembolsos maiores nas fases iniciais dos projetos. Em teoria, ao menos, o aumento do preço dos bens de capital importados deve implicar redução do investimento. O gráfico ilustra precisamente este processo, muito embora esteja longe de ser a palavra final sobre o assunto.
É possível aprofundar o estudo, na prática estimando um modelo que explica o desempenho do investimento como função dos custos de bens de capital (capturando seu impacto no desembolso inicial), da taxa real de juros, assim como de outras variáveis macroeconômicas (hiato do produto, crescimento e preços de commodities), que afetam diretamente o lucro dos projetos.
Conforme esperado, o modelo sugere que taxas de juros e o custo dos bens de capital são negativamente associados ao investimento (sua redução eleva o investimento), enquanto as demais têm uma relação direta com a inversão.
O modelo pode então ser usado para chegarmos a uma conclusão reveladora: caso os preços dos bens de capital importados tivessem se mantido em níveis observados no terceiro trimestre de 2011, antes da depreciação da moeda, o investimento teria atingido ao redor de 19,5% do PIB no terceiro trimestre de 2012, perto do pico anterior e bem acima dos valores observados naquele momento.
Posto de outra forma, a política do enfraquecimento deliberado da moeda teve um efeito negativo substancial sobre o investimento, sem contar potenciais efeitos indiretos por meio das variáveis acima listadas. Conforme alertado por vários economistas, a mudança do regime de política trouxe de fato crescimento mais baixo, mas para uma equipe econômica vacinada contra a evidência empírica nada disso importa.
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