O GLOBO - 19/06
O Brasil, como líder do grupo preocupado com a construção de paz em Guiné-Bissau, tem uma oportunidade nos próximos dias de influenciar os debates no Conselho de Segurança sobre a nova missão da ONU neste momento critico na triste história daquele país. Se o Conselho não aprovar uma missão robusta que poderia ajudar a Guiné-Bissau a transformar-se em estado legitimo e responsável, há grande risco que cairá numa síndrome permanente de estado falido, cujos lideres se enriquecem no tráfico de drogas e armas em vez da atuarem na construção de um país com instituições democráticas, prestação de serviços básicos ao seu povo, e oportunidades de parcerias econômicas com países vizinhos e lusófonos..
Voltei há pouco da Guiné-Bissau. Fui lá a pedido de José Ramos Horta, Prêmio Nobel da paz, ex-presidente do Timor-Leste, e agora representante especial do secretário-geral da ONU para o país. Ramos Horta assumiu uma tarefa complicada: reorganizar a missão da ONU e mobilizar as parcerias bilaterais, inclusive com o Brasil, para impulsionar o governo de transição e os militares para a a construção do estado constitucional.
A escolha do Ramos Horta, que com os líderes de Resistência Timorense levou o Timor Leste à independência, é acertada e comovente. Com muita ajuda internacional, inclusive do Brasil, os timorenses estão hoje construindo um estado democrático, abrindo os caminhos para o povo sair da pobreza e desfrutar de direitos negados durante séculos de colonialismo português e duas décadas de ocupação indonésia. Além da inspiração que Timor-Leste oferece, Ramos-Horta trouxe aos guineenses a promessa de US$ 2 milhões do povo timorense para projetos de desenvolvimento comunitário! O que foi realizado em Timor Leste também pode ser feito em Guine- Bissau. Com um mandato sério e bem estruturado, Ramos Horta poderia guiar a missão da ONU na preparação de uma nova geração de lideres guineenses, na formação de servidores públicos, e na capacitação de instituições estatais para prestar serviços básicos e abrir oportunidades econômicas para o povo.
Guiné-Bissau, como estado legítimo, poderia ser um centro de desenvolvimento econômico importante na África Ocidental - um "hub" entre os países como Senegal, Nigéria, Angola e Brasil. Guiné-Bissau tem riquezas não exploradas em agronegócio, minerais, madeiras, petróleo, pesca e recursos humanos, setores nos quais o Brasil tem vasta experiência e capacidade de investir, como faz em Moçambique e Angola. O Brasil poderia ajudar na construção da infraestrutura e na educação, duas áreas mais carentes no país.
Após o último golpe de estado de 2012, o Brasil - em solidariedade à Comunidade Europeia e aos países lusófonos - suspendeu seus modestos programas de ajuda ao país, focada até agora na reforma de uma escola de treinamento da polícia guineense. O Brasil também retirou o seu embaixador, deixando a responsabilidade nas mãos de um dedicado encarregado de negócios, cuja atuação está limitada pela atual política abstencionista do Itamaraty. O Brasil tem a oportunidade agora de mostrar uma liderança ao nível da sua aspiração para um lugar permanente no Conselho da Segurança.
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