Enquanto se perde safra no campo por falta de estradas e de portos, o governo segue inchando sua máquina burocrática
O governo anunciou que a presidente Dilma está terminando estudos para criar mais uma empresa estatal federal: a Hidrobrás, encarregada de projetar, construir, operar, manter e restaurar a estrutura de navegação em rios, hoje muito abaixo de suas possibilidades e do potencial do país. A nova empresa terá também a tarefa de cuidar dos portos fluviais, hidrovias e eclusas do país, assumindo assim funções do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit). Será a quinta empresa estatal criada em 25 meses de governo, com a promessa de modernizar o setor em que ela vai atuar.
Adicionadas as estatais instituídas no governo Lula, num total de cinco, o PT brindará a sociedade brasileira com dez empresas estatais novas somente no governo federal. Lula criou suas cinco em oito anos de mandato, enquanto Dilma soma cinco em pouco mais de dois anos de governo. As novas estatais de Dilma são a Infraero Serviços, a Amazônia Azul Tecnologias de Defesa, a Agência Brasileira Gestora de Fundos Garantidores e Garantias, a Empresa Brasileira de Planejamento e Logística (EPL) – destinada a planejar e articular ações na área de transportes – e a Hidrobrás, por enquanto apenas anunciada.
A notícia de mais uma estatal vem exatamente no momento em que o país vive um colapso econômico com a incapacidade dos portos de escoar a safra de soja. O Brasil está se apresentando ao mundo como um vexame internacional nesse aspecto, cujo exemplo mais robusto foi o cancelamento, por uma empresa chinesa, de um contrato de compra de 2 milhões de toneladas de soja em função da incapacidade de carregar os navios. O colapso dos portos e da malha rodoviária atingiu níveis dramáticos.
O problema rodoviário e portuário do Brasil assume dimensões de tragédia econômica quando se soma ao fato de haver outro estrangulamento: a capacidade de armazenagem nacional. Nos Estados Unidos, a capacidade de armazenagem nas lavouras é de 65% da safra. No Brasil, os silos rurais não conseguem suportar mais que 15% da colheita, e o produto está sendo abandonado e perdido no pé por incapacidade de armazenar, transportar e embarcar a mercadoria. Isso é algo inaceitável num país pobre e num mundo faminto.
A reação do governo é a de sempre: cria-se mais um órgão, agora uma empresa estatal, quando, na prática, o país deveria encarar o assunto como calamidade pública e crime contra a economia popular. Não dá mais para aceitar que uma situação dessas seja tratada como se fora um problema menor, algo a ser deixado a cargo de uma nova estatal que nem saiu do papel e já está sendo objeto de disputa de políticos e partidos da base aliada. O Brasil precisa recuperar a capacidade de se indignar e de se mobilizar. Se um drama econômico dessa envergadura não for capaz de criar uma comoção entre os setores produtivos e a sociedade, então é o caso de aceitar que, no Brasil, os avanços andarão a passos de tartaruga.
A Constituição Federal permite que o Estado explore diretamente atividades econômicas quando necessário aos imperativos de segurança nacional ou relevante interesse coletivo. O problema está em saber quem decide e como se definem “imperativos de segurança nacional e relevante interesse coletivo”. No caso das rodovias e dos portos, esses setores estão nas mãos do governo e ele é o responsável pelo descalabro e pelo colapso que aí estão. O governo vem e usa a Constituição para criar seus órgãos e suas empresas, mas as soluções ficam na promessa... e os dramas continuam.
No caso específico da incapacidade de escoar safras, seria mais lógico e o interesse público estaria mais bem atendido se o governo descomplicasse a legislação e abrisse logo o setor para o investimento privado nacional e estrangeiro. A Hidrobrás pode ser um tiro a sair pela culatra, pois pode dificultar ainda mais a participação do setor privado nos portos. A razão é simples: é mais uma burocracia estatal e uma estrutura pública com interesses corporativos próprios.
Como agravante, nos últimos tempos os políticos e os partidos tomaram de assalto a gestão das empresas estatais e as submeteram muito mais aos interesses eleitorais e corporativos do que ao interesse nacional. Um bom exemplo disso é a maior empresa do país: a Petrobras, cujo declínio econômico-financeiro tem sido observado pela nação e pelos analistas internacionais. Enquanto se perde safra no campo por falta de estradas e de portos, o governo segue inchando sua máquina burocrática e criando mais ministérios e mais estatais.
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