FOLHA DE SP - 04\11
Brás Cubas, o defunto escritor criado por Machado de Assis, já advertia o leitor dos perigos de uma ideia fixa. Pois fixou-se na presidente Dilma Rousseff -desde 2007, quando chefiava a Casa Civil no governo Lula- a ideia de implantar o trem-bala entre São Paulo e Rio.
A locomotiva que, rasgando o Vale do Paraíba a 350 km/h, conectaria as duas maiores cidades do país em 93 minutos custa, entretanto, a sair do papel. Depois de o leilão ter fracassado em junho de 2011, por falta de interessados, o Planalto adiou novamente o processo -um edital estava previsto para ser publicado nesta semana- a pretexto de remodelar a proposta e evitar a repetição do fiasco.
A fim de atrair grupos privados, o governo assumirá mais uma fatia do risco do projeto, cujo custo, grosseiramente estimado, ronda R$ 50 bilhões. Enquanto o volume de passageiros transportados for insuficiente para ressarcir a despesa com a iniciativa, o Planalto arcará com a diferença. Vai tirar o dinheiro de toda população, via impostos, e transferir para o consórcio responsável pela obra.
O estratagema, argumenta o governo, deve exigir subsídios no início, quando a procura pela ferrovia for incipiente. Mas essa despesa pública seria compensada nos 30 ou 40 anos de vigência do contrato, com o fluxo de passageiros próximo da capacidade total.
A verdade é que as principais incógnitas do projeto continuam sem elucidação, a começar do custo real. Um projeto detalhado, básico para estimar com precisão o valor, só virá após a primeira fase da licitação, a ocorrer na melhor hipótese em meados de 2013, para definir operador e tecnologia.
Se tudo correr bem -algo raro, se não inédito no setor público brasileiro-, as obras só começariam ao final de 2014, início de 2015. As primeiras viagens, restritas a alguns trechos, ocorreriam em 2018.
As dificuldades para uma obra desse porte, como os intermináveis trâmites das licenças ambientais e desapropriações, não recomendam otimismo quanto a prazos e valores. Só de túneis o projeto original prevê mais de 100 km. Em 40 anos de obras, o metrô de São Paulo não atingiu essa marca.
De certo e imediato resta só a disposição, impingida ao velho BNDES, de desembolsar até R$ 25 bilhões para bancar a ideia fixa da presidente. Na depauperada infraestrutura nacional, há carências bem mais prementes. O metrô em grandes cidades é uma delas.
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