O GLOBO - 11/07
A Espanha passará por um Proer. Como no Brasil, os maiores bancos serão fiscalizados, saneados, capitalizados. Os ativos podres serão separados para limpar os balanços das instituições. A diferença é que o Proer deles será feito com ajuda externa de 100 bilhões de euros. Ontem, foi anunciado o adiantamento de 30 bilhões de euros. Enquanto isso, a Organização Internacional do Trabalho anunciou um quadro de devastação do emprego na Zona do Euro.
Desde o começo da crise, foram perdidos 3,5 milhões de empregos na Zona do Euro. Em 2012, a destruição de postos de trabalho voltou a aumentar, e a OIT prevê perdas de mais 4,5 milhões de empregos, se o crescimento não for retomado.
A instituição que defende o emprego não acusa os governos de estarem derramando essa dinheirama nos bancos, em vez de investirem na economia produtiva, uma comparação feita com frequência. Pelo contrário, segundo a OIT, o caminho é resolver os problemas do mercado financeiro o mais rapidamente possível, para que os bancos possam voltar a emprestar e, assim, sustentar o investimento. Se forem “restaurados os canais de crédito” para sustentar “um investimento de 1% do PIB a mais”, isso permitiria a “criação líquida de 1,4 milhão de empregos durante dois anos”.
Esse é o ponto dramático de uma crise bancária. Mesmo quando os bancos são responsáveis pelas crises, por práticas irregulares ou até fraudes, eles acabam resgatados porque, na maioria das vezes, seu colapso tem efeitos terríveis na economia.
No Brasil, os bancos dependiam da inflação. Quando ela caiu, descobriu-se que havia muito ativo podre em alguns dos maiores bancos do país. Foi preciso intervir nas instituições, tomar de seus controladores, separar ativos líquidos daqueles que não eram fáceis de cobrar, vender a instituição para outro banco e emprestar recursos que permitiam a absorção do banco falido.
Na opinião do ex-presidente do Banco Central, Gustavo Loyola, que comandou o programa de reestruturação dos bancos no Brasil, o Proer, ainda não estão claros os mecanismos de saneamento, mas ele acredita que, a partir do resgate dos bancos espanhóis, o sistema financeiro será mais saudável, com mais chances de financiar o crescimento.
Na Espanha, os 14 maiores bancos passarão por testes de stress para saber como seu balanço de ativos e passivos suporta um cenário de agravamento ainda maior da crise. Recentemente, já tinham passado por auditorias como esta e os dois maiores bancos — Santander e BBVA — saíram-se muito bem.
Depois de examinados os ativos dos bancos, serão criados os “bad banks” para onde serão transferidos os ativos podres retirados dos balanços dos bancos. Na Espanha, esses empréstimos duvidosos foram concedidos no boom do mercado imobiliário que antecedeu a grande crise, iniciada em 2008. Hoje, os imóveis valem menos do que valiam, menos do que o valor tomado emprestado, e os endividados não conseguem pagar.
— Na verdade, o que aconteceu na Espanha foi com os bancos das regiões autônomas, as Caixas. São bancos públicos que concederam muitos empréstimos e de forma pouco transparente. O maior problema foi com incorporadoras que tiveram dificuldade de vender os imóveis no início da crise, até porque os preços estavam altos. Houve muito crédito concedido de forma inadequada. As autoridades de supervisão tinham critérios mais frouxos de avaliação dos bancos públicos, que são a origem do problema. O Bankia — banco que está com maior dificuldade — é o resultado da fusão de várias dessas Caixas.
Segundo a OIT, a Europa está no início de um processo de recessão prolongada no mercado de trabalho, como efeito da crise na região. Dos 17 países, só Alemanha, Áustria, Bélgica, Luxemburgo e Malta criaram novos postos de trabalho.
Entre os que estão entrando no mercado, 31,5% estão desempregados ou inativos e entre os que perderam o posto de trabalho, 44% estão há mais de um ano desempregados. Na Espanha, a taxa dos jovens sem emprego chega a 50%. Segundo a OIT, essas pessoas atingidas pelo drama do desemprego no início de suas carreiras profissionais poderão “ter sequelas para o resto da vida”.
Esse é o drama maior da Europa. Atrás dessas informações áridas — como a taxa de risco cobrada do mercado para rolar a dívida soberana de países com desequilíbrios fiscais — existe um sofrimento pessoal enorme. Não é um problema abstrato.
O sistema de proteção social na Europa é forte e amplo, porém a falta de perspectiva de melhora de uma situação como a da Espanha tem desdobramentos cada vez mais negativos.
Em toda crise bancária há erros dos administradores dos bancos. O problema é que, ao entrarem em crise de insolvência, eles ameaçam a própria economia. O país inteiro fica refém do desequilíbrio. Normalmente, há uma retroalimentação. A piora dos bancos congela o mercado de crédito, que agrava a situação econômica que, por sua vez, aprofunda a crise bancária.
No Brasil, na crise dos anos 1990, os bancos foram saneados, mas os administradores e controladores foram punidos com perda de ativos e indisponibilidade de bens.
Na crise que estourou nos Estados Unidos, após a quebra do Lehman Brothers, o governo socorreu os outros bancos, permitindo que os executivos preservassem seus gordos bônus.
Na Espanha, fala-se da crise como uma fatalidade que ocorre pelos problemas globais. Mas na raiz do desequilíbrio bancário está má regulação e gestão irresponsável. O preço maior quem paga é todo o país.
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