Com pitos, Dilma atacou os juros altos e até as tarifas de hotéis. O problema é que as leis básicas da economia são surdas, não reagem a ordens e passam por cima de qualquer artificialismo
Érico Oyama
A personalidade forte de Dilma Rousseff já entrou para a galeria do folclore dos presidentes brasileiros. O estilo incontrastável alçou-a de personagem secundária do governo petista gaúcho aos escalões mais elevados do Planalto, primeiro no Ministério de Minas e Energia, depois no comando da Casa Civil e, finalmente, como candidata a presidente da República ungida por Lula. Os humoristas do Casseta & Planeta capturaram esse traço marcante da personalidade da presidente criando a Dilmandona, personagem interpretada por Claudio Manoel que apresentava projetos como a Lei da Tábua da Privada Levantada e a Lei da Toalha Molhada em Cima da Cama. A Dilma de verdade tem problemas nada engraçados. Na semana passada, ela foi vaiada em uma reunião da Confederação Nacional dos Municípios por prefeitos a quem contrariou por mostrar oposição à distribuição mais ampla dos royalties do petróleo, que hoje beneficiam apenas as cidades produtoras. Dilma não gostou, é claro, e limitou-se a fazer o sinal de positivo com o polegar direito.
O presidencialismo brasileiro, embora refém muitas vezes das bases aliadas de sustentação no Congresso, tem caráter imperial. Por isso, as broncas e os desejos expressos por presidentes da República têm sempre algum resultado. Quem não se lembra de que, em pleno esforço nacional para modernização da indústria automobilística, em 1993, o então presidente da República Itamar Franco, em um arroubo populista, nostálgico, arcaico e autoritário, pediu à Volkswagen que ressuscitasse o Fusca, então peça de museu. Foi atendido. Durante três anos, os modelos foram produzidos, mas, como era de esperar, ninguém quis saber de comprar as velharias e a linha de montagem foi abandonada. Não há artificialismo que dure nas economias modernas. Ficou, no entanto, a lição de que os presidentes devem ter muito cuidado com o que mandam os outros fazer, pois a chance de ser atendidos é grande - e o custo também. Dilma mandou baixar os juros aos consumidores, os bancos estatais atenderam e os bancos privados, mais timidamente, também se mexeram. Dilma reclamou do preço das tarifas de hotéis no Rio de Janeiro e as manchetes de jornais no dia seguinte informaram que ela foi atendida, mas apenas por uma agência de turismo que realmente estava inflando o preço de seus pacotes. Obviamente, essas broncas são para inglês ver, pois os juros e os demais preços da economia não obedecem a ordens. Eles refletem realidades. Diz o economista Carlos Eduardo Soares Gonçalves, da Universidade de São Paulo: "No caso dos juros, a implantação do cadastro positivo teria muito mais impacto do que simplesmente pregar a redução das taxas".
Na semana passada, Dilma reclamou de outro preço, o da energia elétrica. O Brasil gera a maior parte de sua energia pelo método mais barato do mundo, as hidrelétricas, mas cobra uma das tarifas mais caras do planeta. Por quê? Por causa dos impostos federais e estaduais, que respondem por 50% do preço pago pelos consumidores. Dilma acertou também ao apontar os impostos como o componente mais pesado do preço da eletricidade no Brasil. Agora, em vez de meramente exigir soluções dos outros, ela se colocou na posição incômoda de ter de agir internamente no governo federal e cutucar os estados se quiser ver seu desejo realizado. O maior anacronismo da tributação brasileira está no imposto sobre circulação de mercadorias e serviços (ICMS), que é um tributo estadual. Cada um dos 27 estados brasileiros tem sua própria legislação de ICMS, além de inúmeras tarifas e normas distintas. O ICMS pesa fortemente sobre o custo das tarifas de energia e também sobre as de internet e telefonia celular ou fixa. No Rio de Janeiro, 47% do preço da conta de luz se deve ao ICMS. Em Minas Gerais, esse valor é de 43%. Nos outros estados, a incidência é apenas um pouco mais baixa. Como o ICMS representa a principal fonte de receita dos estados, nenhum governador aceita mexer nele. Portanto, se quiser mesmo baixar o custo da energia no Brasil, Dilma precisará compensar os estados que aceitarem reduzir o ICMS. que encarece a conta de luz.
O problema central, porém, é que o excesso de protagonismo do governo na economia já saiu do campo da sátira para se tornar uma preocupação. O tripé da prosperidade "brasileira, baseado no câmbio flutuante, na intolerância com a inflação e na austeridade fiscal, está sendo desmontado na surdina em Brasília, substituído por broncas da presidente, bazófias do ministro da Fazenda e chicanas do Banco Central. Segundo o economista Juan Jensen. da consultaria Tendências, "as seguidas intervenções do governo em diversas frentes são prejudiciais, além de pouco eficazes. Essas medidas trazem incertezas e afugentam os investidores". A Dilmandona dos humoristas ainda faz rir, mas na vida real pode fazer o Brasil chorar.
O presidencialismo brasileiro, embora refém muitas vezes das bases aliadas de sustentação no Congresso, tem caráter imperial. Por isso, as broncas e os desejos expressos por presidentes da República têm sempre algum resultado. Quem não se lembra de que, em pleno esforço nacional para modernização da indústria automobilística, em 1993, o então presidente da República Itamar Franco, em um arroubo populista, nostálgico, arcaico e autoritário, pediu à Volkswagen que ressuscitasse o Fusca, então peça de museu. Foi atendido. Durante três anos, os modelos foram produzidos, mas, como era de esperar, ninguém quis saber de comprar as velharias e a linha de montagem foi abandonada. Não há artificialismo que dure nas economias modernas. Ficou, no entanto, a lição de que os presidentes devem ter muito cuidado com o que mandam os outros fazer, pois a chance de ser atendidos é grande - e o custo também. Dilma mandou baixar os juros aos consumidores, os bancos estatais atenderam e os bancos privados, mais timidamente, também se mexeram. Dilma reclamou do preço das tarifas de hotéis no Rio de Janeiro e as manchetes de jornais no dia seguinte informaram que ela foi atendida, mas apenas por uma agência de turismo que realmente estava inflando o preço de seus pacotes. Obviamente, essas broncas são para inglês ver, pois os juros e os demais preços da economia não obedecem a ordens. Eles refletem realidades. Diz o economista Carlos Eduardo Soares Gonçalves, da Universidade de São Paulo: "No caso dos juros, a implantação do cadastro positivo teria muito mais impacto do que simplesmente pregar a redução das taxas".
Na semana passada, Dilma reclamou de outro preço, o da energia elétrica. O Brasil gera a maior parte de sua energia pelo método mais barato do mundo, as hidrelétricas, mas cobra uma das tarifas mais caras do planeta. Por quê? Por causa dos impostos federais e estaduais, que respondem por 50% do preço pago pelos consumidores. Dilma acertou também ao apontar os impostos como o componente mais pesado do preço da eletricidade no Brasil. Agora, em vez de meramente exigir soluções dos outros, ela se colocou na posição incômoda de ter de agir internamente no governo federal e cutucar os estados se quiser ver seu desejo realizado. O maior anacronismo da tributação brasileira está no imposto sobre circulação de mercadorias e serviços (ICMS), que é um tributo estadual. Cada um dos 27 estados brasileiros tem sua própria legislação de ICMS, além de inúmeras tarifas e normas distintas. O ICMS pesa fortemente sobre o custo das tarifas de energia e também sobre as de internet e telefonia celular ou fixa. No Rio de Janeiro, 47% do preço da conta de luz se deve ao ICMS. Em Minas Gerais, esse valor é de 43%. Nos outros estados, a incidência é apenas um pouco mais baixa. Como o ICMS representa a principal fonte de receita dos estados, nenhum governador aceita mexer nele. Portanto, se quiser mesmo baixar o custo da energia no Brasil, Dilma precisará compensar os estados que aceitarem reduzir o ICMS. que encarece a conta de luz.
O problema central, porém, é que o excesso de protagonismo do governo na economia já saiu do campo da sátira para se tornar uma preocupação. O tripé da prosperidade "brasileira, baseado no câmbio flutuante, na intolerância com a inflação e na austeridade fiscal, está sendo desmontado na surdina em Brasília, substituído por broncas da presidente, bazófias do ministro da Fazenda e chicanas do Banco Central. Segundo o economista Juan Jensen. da consultaria Tendências, "as seguidas intervenções do governo em diversas frentes são prejudiciais, além de pouco eficazes. Essas medidas trazem incertezas e afugentam os investidores". A Dilmandona dos humoristas ainda faz rir, mas na vida real pode fazer o Brasil chorar.
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