O GLOBO - 09/02
É crucial aprofundar a experiência de pacificação já existente, com o avanço dos investimentos sociais prometidos e a blindagem do programa contra tentações eleitoreiras
Os recentes ataques de bandidos a Unidades de Polícia Pacificadora — no morro de São Carlos, na Rocinha, no Complexo do Alemão —, com troca de tiros e, inclusive, o assassinato da PM Alda Rafael Castilho, em Parque Proletário, devem servir de alerta para dois aspectos da política de retomada, pelo Estado, via ocupação direta por forças policiais, de áreas controladas pelo crime organizado.
O primeiro é que, após um primeiro momento de debandada, em razão do vigor irresistível das ações de asfixiamento do tráfico de drogas, a base econômica das quadrilhas que subjugavam as comunidades, grupos de criminosos se rearticulam para tentar retomar áreas em que impunham um reinado de terror. Como é possível que estas sejam reações espasmódicas (mas de qualquer forma a merecer respostas adequadas das forças da lei), a questão de fundo está no segundo aspecto para os quais os episódios de enfrentamento chamam a atenção: a consolidação do programa ainda está por ser alcançada.
Por isso, é preocupante a promessa feita pelo secretário de Segurança do Rio, José Mariano Beltrame, de estender as UPPs, ainda neste primeiro semestre, para uma ampla região formada por Baixada, Niterói e São Gonçalo. Beltrame parte de uma preocupação relevante: a pacificação de áreas subjugadas pelo tráfico teve como efeito colateral a fuga de bandidos para essas regiões do estado, menos guarnecidas de policiamento, com o consequente incremento local da criminalidade. Essa nova realidade é um desafio, e combatê-la, uma obrigação do poder público. Mas enfrentá-la ao custo de pôr em risco um programa que, nas áreas em que já foi implantado, não obstante seus bons resultados, ainda tem flancos não suficientemente blindados contra ataques equivale a adotar uma política de cobertor curto. É ideia temerária.
Além disso, as UPPs têm um propósito bem definido, implicando um planejamento que parece passar ao largo da promessa do secretário. No Rio, a implantação das atuais 36 unidades obedeceu a um cronograma que, salvo situações pontuais, como na ocupação do Complexo do Alemão ditada por um surto de terrorismo, foi cumprido de modo a cobrir estrategicamente toda a área compreendida.
Por princípio, o governo precisa dar conta desse desafio de reverter curvas de criminalidade onde ela estiver em alta — e, neste aspecto, há indicadores a exigir atenção não só nas regiões para as quais Beltrame acenou com a extensão das UPPs. O que leva à questão dos critérios para a escolha das áreas a serem beneficiadas. Por outro lado, é crucial aprofundar a experiência de pacificação já existente, com o avanço dos investimentos sociais prometidos (aliás, uma reivindicação constante de Beltrame) e a blindagem do programa contra tentações eleitoreiras, desvinculando-o inequivocamente de candidaturas ao pleito de outubro.
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