O ESTADÃO - 09/02
Os fundamentos macroeconômicos do País vêm apresentando piora no governo Dilma e várias análises têm identificado na questão fiscal a causa central da piora. Vale notar que essas análises reduzem a questão fiscal ao resultado primário (receitas menos despesas, exclusive juros) insuficiente, sempre aquém da meta estabelecida na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), como determina a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).
A LRF obriga a União, Estados e municípios a enviarem como anexo à LDO as metas do ano calendário para o resultado primário, para o resultado nominal (receitas menos despesas, inclusive juros) e para a dívida.
O comportamento da relação dívida/PIB depende do resultado nominal e do PIB. O comportamento dos juros da dívida pública é omitido como principal responsável do déficit fiscal do setor público nessas análises, e o mesmo ocorre com o resultado nominal, principal termômetro das finanças públicas, o que chama a atenção.
Caso a despesa com os juros fosse um componente sem importância na despesa pública, essa omissão até poderia passar despercebida, mas não é o caso. Historicamente, sempre esteve acima de 5% do PIB, à exceção de 1997 (-4,8%) e 2012 (-4,9%), como mostra o quadro. Na média histórica os juros representaram 6,7% do PIB, ultrapassando o superávit primário de 2,4% do PIB e causando um déficit fiscal de 4,3% do PIB.
Vem ocorrendo, no entanto, melhora no resultado fiscal, com déficits decrescentes por causa da redução relativa das despesas com juros, nos últimos três presidentes. E isso se deve principalmente à redução relativa da despesa com juros, que infelizmente voltou a subir a partir de 2013.
A despesa com juros atingiu em 2013 R$ 249 bilhões, R$ 35 bilhões mais que a de 2012. O déficit fiscal em 2013 atingiu 3,3% do PIB, ou seja, 0,8 ponto porcentual acima do de 2012. Contribuiu para isso a piora em 0,5 ponto no resultado primário e 0,3 ponto nos juros. Esse 0,3 foi ignorado nessas análises.
Neste ano, como a Selic média tende a 11%, poderá ficar superior à de 2013 (8,29%) em cerca de 30% e, como a dívida bruta vem crescendo a cada ano, não será de estranhar se a conta de juros pular para acima de 6% do PIB, o que elevaria o déficit fiscal a cerca de 4% do PIB, superior ao dos últimos dez anos (2004/2013), e aí sim as agências de classificação de risco poderão rebaixar a nota brasileira e a causa central será o crescimento das despesas com os juros.
Por enquanto, essas análises parecem ignorar o impacto monetário (alta da Selic) sobre o resultado fiscal, focando apenas o resultado primário. Há que considerar, também, que o governo federal estimulou no ano passado os Estados a investir por meio de novas dívidas e estes fizeram sua LDO considerando a alta desses investimentos.
O baixo crescimento previsto para este ano vai, também, na direção oposta da melhora do déficit fiscal ao não ajudar na elevação da arrecadação e ao ser o denominador do resultado fiscal.
Tudo isso ocorre em face da política suicida de manter elevada a Selic como instrumento de controle inflacionário. Ao mantê-la muito acima do nível internacional atrai dólares especulativos, mantendo o câmbio artificialmente apreciado para baratear o produto importado, e com isso conter os preços internos dos bens comercializáveis. É a estratégia adotada como principal característica da política econômica do País. Isso causa não apenas o déficit fiscal, mas também o câmbio apreciado, o rombo nas contas externas, o dano à competitividade das empresas, o elevado custo de carregamento das reservas internacionais e o baixo nível de crescimento econômico.
Como a inflação em ascensão pode prejudicar seriamente o cacife eleitoral da presidente, é mais provável que o governo federal vá calibrar mais ainda para cima a taxa básica de juros, aprofundando a piora dos fundamentos macroeconômicos.
O que parece despercebido é que isso tudo tem custo para a sociedade e é pago por todos por meio dos tributos e da perda patrimonial. Uma parte visível dessa perda ocorre em cima da Petrobrás e seus acionistas, ao subsidiar o preço da gasolina e do diesel. Com isso estimula o uso do automóvel, gerando custos da mobilidade urbana que atinge a todos que precisam circular pelas cidades.
De pouco vai adiantar o governo anunciar cortes orçamentários para satisfazer o mercado. O ano eleitoral é não só para o governo federal. As disputas eleitorais vão empolgar os Estados e, por tabela, os municípios, por onde flui a ação governamental. Vale lembrar que Estados e municípios são responsáveis por 64% da despesa pública não financeira, que certamente subirá bem acima da prometida redução da despesa federal, essa superengessada pelo cipoal legislativo.
Assim, é provável que 2014 tenda a ser pior que 2013, sobretudo pela elevação da Selic, causador principal do déficit fiscal e do rombo das contas externas ao artificializar o câmbio, o que vai carregar pesado ônus para 2015. E a conta virá salgada, principalmente sobre as classes de menor renda, que não usufruem do rentismo que campeia no País. Vale conferir.
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