GAZETA DO POVO - 09/02
Em todo o mundo, os poderes do Estado para melhorar a vida dos cidadãos têm sido colocados em dúvida. Outras formas de atuação como o chamado Terceiro Setor, o “público-não estatal”, têm se firmado como formas de atuação alternativa à ação direta das agências públicas, pois têm se mostrado capazes de escapar ao ritualismo e ao hiperformalismo destas últimas, agindo com a flexibilidade das organizações privadas, mas perseguindo o objetivo público de melhorar a vida das pessoas. No Brasil é diferente.
A educação pública é de qualidade lastimável; mas ai de quem resolver “se meter” nesse assunto, por mais puros que sejam seus intuitos e por mais eficazes que sejam as formas que utilizem: logo se levantará uma multidão de vozes para lembrar ao ingênuo que a educação é uma das funções “típicas” da administração pública e que a “intrusão” neste campo representa ilícita terceirização de funções públicas. Não vem ao caso que essa opinião seja totalmente equivocada, pois o artigo 205 da Constituição Federal define que a “educação, direito de todos e dever do Estado e da família, serão; promovida e incentivada com a colaboração da sociedade”. Nem vem ao caso que os “transgressores” não usufruam qualquer recompensa material, política, religiosa ou social de qualquer tipo e que resolvam agir por altruísmo; de novo, o importante para os críticos é que a educação é um assunto exclusivo dos governos e, portanto, deve ficar longe da influência de quem quer que seja, fora da burocracia oficial.
Pacientes morrem nas filas de espera por uma vaga em hospital; crianças morrem nas UTIs com infecções hospitalares; pessoas se amontoam nos corredores, deitadas no chão, perto de latas de lixo... Mas a participação de organizações não estatais na prestação de serviços de saúde, mesmo quando se mostram capazes de driblar a catatonia burocrática habitual nas organizações públicas, é contestada vigorosamente por defensores de que a “saúde” é uma função precípua do Estado e que, como a educação, deve ficar exclusivamente a seu cargo.
E o caso das Apaes? As associações de apoio às pessoas com deficiências executam há mais de meio século um trabalho exemplar. Mas agora os defensores do purismo estatal querem porque querem proibir o Estado de apoiar tais organizações. Não vem ao caso que as crianças e pessoas com deficiência percam a atenção especializada que as associações lhe dedicam nos dias de hoje; importa apenas que todos sejam tratados pelo Estado de maneira igual – mesmo que irremediavelmente medíocre. Fazer com que as pessoas sejam igualadas na desgraça e na desatenção é o que realmente importa.
A crença nos poderes do “Estado” já saiu de moda pela simples razão de que as máquinas públicas são grandes burocracias entrópicas que servem para dissipar recursos de maneira indiscriminada, não para resolver problemas. Se as pessoas continuarem a sofrer com a tragédia da ignorância, não importa. Se insistirem em morrer de causas fúteis, também não importa. Esses defensores do Estado todo-poderoso não ligam, pois dormirão tranquilos em paz com suas crenças e com suas idiossincrasias.
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