O GLOBO - 02/01
A proposta de um plebiscito para a definição de uma reforma política ganhou força no PT na esteira das manifestações de rua de junho, acontecimento fora do radar dos petistas e também da oposição. Pela primeira vez, as ruas eram ocupadas a partir de convocações feitas por redes sociais, à margem das máquinas de mobilização historicamente sob controle do PT — sindicatos e certas organizações, como a UNE.
Foi um choque. Até a violência de black-blocs e anarquistas em geral afugentar os manifestantes, muitos movidos pela vontade de protestar contra a precariedade da infraestrutura e serviços básicos em geral — saúde, educação, transportes —, governo e PT estiveram na defensiva.
Ao reagirem, na proposta de “pactos” feita pela presidente Dilma, foi levantada a bandeira da “Constituinte exclusiva”, para ser feita a reforma política dos sonhos petistas e aliados: financiamento público integral de campanha, voto em lista fechada, etc.
Não demorou para ficar evidente a inviabilidade constitucional e, portanto, política desta via rápida para reformas, no melhor estilo chavista. Pois foi assim, depois de se eleger a primeira vez, com votação esmagadora, que o caudilho Hugo Chávez obteve apoio para convocar uma constituinte em que teve ampla maioria. Começou ali a triturar a democracia representativa por meio de um instrumento formalmente democrático.
Diante da impossibilidade de a fórmula ser repetida no Brasil, onde as instituições republicanas são mais fortes, o partido passou a defender o plebiscito.
Não cabe “Constituinte” porque ela só pode ser convocada para reforma de regime. Por este motivo, elas coincidem, na História da República brasileira, com momentos de rupturas institucionais. Não é o caso atual. Ao contrário. Se se quiser fazer mudanças na Carta, que se atenda aos requisitos estabelecidos para tal: votação em dois turnos em cada Casa do Congresso, por quórum qualificado (três quintos, 60%). Preservadas as cláusulas pétreas.
É assim em qualquer democracia efetiva, para que a necessária segurança jurídica seja garantida.
Mas o remendo do plebiscito também não é adequado a um assunto complexo como a reforma política. Como o eleitorado poderá decidir com equilíbrio entre “lista fechada” ou “aberta”, por exemplo, se a grande maioria da população não tem ideia do que se trata? O risco de haver muita manipulação é incomensurável.
É ilusório, portanto, achar que apenas por ser um plebiscito o resultado da consulta terá uma “qualidade” maior que uma lei do Congresso. Um grande engano.
Na democracia representativa, cabe ao Congresso e às Casas legislativas em geral decidirem temas como este. Se alguma consulta vier a ser feita, que seja em referendo, no qual caberá ao eleitorado aceitar ou rejeitar aquilo que seus representantes decidiram. O grau de conhecimento do assunto já será maior, devido ao longo debate entre os parlamentares.
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