FOLHA DE SP - 23/11
Se a mera promulgação de novas leis fosse capaz de transformar a realidade, o Brasil não seria o país que é. Embora óbvia, a constatação é frequentemente ignorada pelos legisladores.
O país assiste a uma verdadeira profusão de leis --muitas delas, a rigor, desnecessárias. São produzidas todos os dias pelos Legislativos federal, estadual e municipal, sem falar na imensa quantidade de atos normativos, decretos, portarias, circulares...
O problema não se restringe à confusão que esse emaranhado costuma provocar. Às novas leis correspondem novas obrigações para o poder público, que deve monitorar sua implementação, fiscalizar seu cumprimento e punir eventuais desvios.
Antes de promulgar leis, legisladores de países mais previdentes realizam estudos de impacto e testes de custo/benefício para avaliar os efeitos das normas. Não no Brasil, onde a regra é o voluntarismo.
O mais recente exemplo disso é o projeto de lei que regulamenta o peso a ser transportado por estudantes em suas mochilas --o texto foi aprovado pelo Senado e deve seguir para avaliação da Câmara.
Com base em estudos segundo os quais a maioria dos problemas de coluna de adultos está associada à carga de material escolar que transportaram na infância, a proposta determina que as mochilas não devem ultrapassar o limite de 15% do peso corporal de cada estudante, a ser aferido por meio de declaração pessoal.
Se aprovada, será com certeza mais um caso de "lei que não pega". O acúmulo de situações desse tipo é nefasto: normas sem eficácia desmoralizam o Direito e incutem descrença nos cidadãos.
Mesmo que, por hipótese, haja adesão à norma, seus efeitos serão igualmente contraproducentes. Fiscalizar seu cumprimento demandaria, no mínimo, a instalação de balanças nas escolas, e os procedimentos tomariam um tempo que alunos e professores poderiam investir de outra maneira.
As escolas sem dúvida devem estar atentas a essa questão --e é provável que, para algumas crianças, 15% do peso corporal já seja excessivo. A disponibilização de armários para os alunos é medida a ser incentivada, por exemplo.
Não faz sentido o Estado descer àquele nível de detalhe para, de forma burocrática e inconsequente, disciplinar a vida do cidadão.
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