O Estado de S.Paulo - 23/11
Tão logo foi batido o martelo, espocaram manifestações de regozijo dentro e fora do governo.
O leilão de concessões de expansão e de gestão dos aeroportos do Galeão (Rio de Janeiro) e de Confins (Minas Gerais) durou cerca de uma hora e meia e foi de fato um sucesso.
O sucesso não deve ser medido apenas pelo interesse manifestado por grandes grupos econômicos, pelos altos ágios obtidos (de 293,9% pelo leilão do Galeão e de 66,0% pelo de Cofins) e pela bolada de R$ 20,8 bilhões que vai ser recolhida em múltiplas parcelas ao Tesouro Nacional, a partir de março de 2015.
O maior sucesso deve ser creditado a importante mudança de postura e de comportamento do governo Dilma sobre como devem ser realizados investimentos e a administração de serviços públicos.
Ainda subsiste dentro do governo o ponto de vista de que qualquer operação que cheire a privatização é um atentado aos interesses nacionais. A condenação sistemática aos processos de privatização colocados em prática ao longo dos governos Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso foi um dos motes das campanhas do PT. Agora é o que está tratando de colocar em prática.
No caso do leilão dos aeroportos, ainda se ouve o matraquear de que o governo transfere de bandeja o filé mignon para os empresários, que só querem lucro e moleza, e deixa as pelancas para a Infraero, a empresa que é do povo.
Não passa pela cabeça dessa gente que problema maior do que infraestrutura cara, caracterizada por tarifas e pedágios altos, é a falta de infraestrutura. Mesmo se fosse eficiente, o que não é, o setor público não dispõe de recursos para bancar e administrar ele próprio o que tem de ser feito.
A participação de empresas estrangeiras nos consórcios não tem nada de entreguismo, como também se alega nessas áreas e nas remanescentes do brizolismo, em cujas hostes militou a presidente Dilma. Deve-se a uma razão técnica incontornável: nenhuma empresa brasileira tem hoje experiência em administração de grandes aeroportos.
Até agora, mantinha-se arraigada dentro do governo a ideia de que as licitações de serviços públicos são empreendimentos destituídos de risco, fator que justificaria o achatamento da remuneração dos consórcios. O tamanho dos ágios mostra como esse ponto de vista não faz sentido.
O governo enfrenta custos enormes pelas omissões, pelos atrasos, pelas contradições internas na sua política de outorgas. O primeiro leilão de aeroportos, em 2012, contou com pequenas operadoras por regras mal engendradas. A ministra-chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, que coordena as licitações na área de infraestrutura, reconhece a falta de traquejo, falhas de modelagem, demora, improvisação e vacilações nesses processos.
Apesar de tudo, o governo Dilma está certo ao bancar essas iniciativas. E é importante que sejam bem-sucedidas porque esse sucesso deverá contribuir para modernizar e dar mais racionalidade à administração pública. Paradoxalmente, é essa convocação da iniciativa privada que pode resgatar pelo menos parte da credibilidade perdida ao longo destes anos.
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