sexta-feira, julho 12, 2013

Realismo e bravatas na blindagem da internet - EDITORIAL O GLOBO

O GLOBO - 12/07

Passada a fase de repúdio político e diplomático à espionagem americana, é necessário tratar do tema de forma objetiva. Sem empulhações



Enquanto se esgota a fase de demonstrações políticas e diplomáticas de repúdio à ação da malha de espionagem eletrônica americana sobre o Brasil, revelada pelo GLOBO, entra-se na fase de discussões sobre medidas objetivas de defesa contra a atuação bisbilhoteira da Agência Nacional de Segurança dos Estados Unidos (NSA) e todas as outras.

O ministro da Defesa, Celso Amorim, defendeu quarta-feira no Congresso a necessidade de se investir em "tecnologia nacional" de segurança de informações. Por sua vez, o presidente da estatal ressuscitada Telebras, Caio Bonilha, garantiu, em entrevista, que as redes do governo são totalmente seguras, e que, para garantir o sigilo, são usados equipamentos "tecnológicos fabricados no Brasil."

Balela, pois, ao se conectar à rede mundial de computadores, como ele próprio admitiu, governo, empresas e brasileiros podem ser espionados. E não apenas por estrangeiros. Daqui a pouco, será proposta a criação da estatal "Servidobras", para armazenar com "segurança" os dados gerados na internet no Brasil. Delírio.

É fato que a cibersegurança constitui aspecto estratégico na órbita governamental, nas empresas e com impacto direto sobre as pessoas. Autoridades conscienciosas admitem a vulnerabilidade da rede do governo. Não se sabe que "tecnologia nacional" seria esta para proteger o tráfego de dados do setor público. Há aqui o risco de mais uma vez, como já ocorreu na informática durante a ditadura militar, tentar-se reinventar a roda, com grandes prejuízos para o Erário.

É preciso ser realista, e não empulhar — mesmo que possa interessar a maquiavéis de Brasília estender ao máximo o assunto para dividir as atenções da opinião pública com a crise política do governo Dilma.

Forças Armadas, o Estado como um todo, corporações e cidadãos precisam ter meios de proteger o sigilo de dados. Sendo a parte mais frágil o brasileiro comum, sobre o qual pairam vários sistemas de vigilância invasivos, como o da Receita, nem sempre usados conforme estabelece a Constituição.

Há muito o que fazer. Por exemplo: aprovar o Marco Civil da Internet, atuar nos fóruns multilaterais numa pressão constante pela transparência no manejo de bancos de dados pelos Estados, tornar juízes, promotores, procuradores e agentes policiais capazes de zelar pela privacidade da população e instituições no mundo digital.

São ações nada estrondosas, porém as mais eficientes no tratamento deste assunto. E sempre numa abordagem global, porque, sem que haja uma atuação multinacional contra os abusos no atropelamento dos direitos civis na internet, de pouco adiantará qualquer maior esforço.

Assim como há tratados de extradição para impedir a impunidade de criminosos fugitivos, algo semelhante terá de haver no universo digital. Bem como no plano da relação da sociedade com as corporações, estatais ou não.

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