Parece não haver desvão da sociedade brasileira que esteja livre do germe do racialismo patrocinado pelo Estado. A mais recente investida se deu na Plataforma Lattes, sistema que agrega informações sobre o universo acadêmico, organizado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Na Plataforma, os pesquisadores devem manter seu perfil acadêmico e atualizá-lo regularmente com sua produção, para que as instituições de fomento possam medir seus méritos antes de conceder financiamentos. É o chamado Currículo Lattes, sem o qual praticamente nenhum pesquisador hoje no País é reconhecido. Pois agora o CNPq solicita dos acadêmicos uma informação que nada tem de científica ou meritória: a "raça" ou a "cor".
Os pesquisadores que tiveram de atualizar seu Currículo Lattes nos últimos dias depararam-se com essa exigência esdrúxula: "O campo "Cor ou Raça" é de preenchimento obrigatório para a publicação do Currículo Lattes. Essa informação é solicitada para atender à Lei n.° 12.288, de 20 de julho de 2010". Trata-se da lei que institui o chamado Estatuto da Igualdade Racial, um projeto que, prenhe de boas intenções, oficializou a desigualdade racial no Brasil.
Ao estabelecer uma série de mecanismos que visam a "combater a discriminação de cidadãos afro-brasileiros", o estatuto parte do princípio de que os cidadãos brancos são invariavelmente favorecidos nos concursos e no trabalho graças somente à cor de sua pele, e não a seus méritos pessoais. Portanto, para combater essa suposta discriminação, criou-se outra, que nada tem de hipotética. Pretendeu-se resgatar uma "dívida histórica", referente à escravidão, à custa do artigo constitucional segundo o qual "todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza". .
Essa aberração jurídica foi corroborada pelo Supremo Tribunal Federal em 2012, ao avalizar a adoção de cotas para negros e pardos nas universidades publicas. "A pobreza tem cor no Brasil", justificou a ministra Rosa Weber, como se a pobreza fosse uma característica inerente aos negros. Poucas vezes a consolidação de um estereótipo social negativo como esse contou com o apoio de tão doutos jurisconsultos.
O resultado é que a sociedade está agora legalmente dividida em negros e pardos de um lado e brancos de outro. Por esse motivo, pareceu natural ao governo exigir uma declaração racial formal dos pesquisadores e acadêmicos - como parte de seu currículo pessoal. A Secretaria da Promoção da Igualdade Racial informa que esse dado agora é necessário para "orientar os órgãos públicos federais na adoção de ações de promoção da igualdade racial" e que isso "atende a uma das mais antigas reivindicações do movimento negro brasileiro". A julgar pela explicação da secretária de Políticas de Ações Afirmativas, Angela Nascimento, isso significa que o Estado poderá discriminar pesquisadores em razão de sua raça ou de sua cor na hora de decidir se deve ou não financiá-los, pois o "quesito raça/cor" é "instrumento fundamental da ação governamental no planejamento, avaliação e alcance de tais políticas públicas".
Sofisticou-se, assim, o racialismo. Até aqui, as políticas de ação afirmativa tinham como base apenas levantamentos demográficos genéricos, feitos pelo IBGE, nos quais se preservava o anonimato. Agora, no caso dos pesquisadores, seus nomes estarão vinculados a rótulos como "negro", "branco" ou "amarelo", como se essas definições fizessem parte de suas qualificações. Em artigo no jornal O Globo (18/4), sob o apropriado título O ovo da serpente, a antropóloga Yvonne Maggie se disse "chocada" com a exigência do CNPq, expressando dúvidas pertinentes: "Como essa informação será utilizada? Será sigilosa?". .
Há a opção "não desejo responder à pergunta", mas quem garante que o pesquisador que se recusar a informar sua raça não será discriminado por isso? O fato é que a pergunta nem sequer deveria ter sido feita, pois que mérito acadêmico há em ser "branco", "negro" ou "amarelo"?
Os pesquisadores que tiveram de atualizar seu Currículo Lattes nos últimos dias depararam-se com essa exigência esdrúxula: "O campo "Cor ou Raça" é de preenchimento obrigatório para a publicação do Currículo Lattes. Essa informação é solicitada para atender à Lei n.° 12.288, de 20 de julho de 2010". Trata-se da lei que institui o chamado Estatuto da Igualdade Racial, um projeto que, prenhe de boas intenções, oficializou a desigualdade racial no Brasil.
Ao estabelecer uma série de mecanismos que visam a "combater a discriminação de cidadãos afro-brasileiros", o estatuto parte do princípio de que os cidadãos brancos são invariavelmente favorecidos nos concursos e no trabalho graças somente à cor de sua pele, e não a seus méritos pessoais. Portanto, para combater essa suposta discriminação, criou-se outra, que nada tem de hipotética. Pretendeu-se resgatar uma "dívida histórica", referente à escravidão, à custa do artigo constitucional segundo o qual "todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza". .
Essa aberração jurídica foi corroborada pelo Supremo Tribunal Federal em 2012, ao avalizar a adoção de cotas para negros e pardos nas universidades publicas. "A pobreza tem cor no Brasil", justificou a ministra Rosa Weber, como se a pobreza fosse uma característica inerente aos negros. Poucas vezes a consolidação de um estereótipo social negativo como esse contou com o apoio de tão doutos jurisconsultos.
O resultado é que a sociedade está agora legalmente dividida em negros e pardos de um lado e brancos de outro. Por esse motivo, pareceu natural ao governo exigir uma declaração racial formal dos pesquisadores e acadêmicos - como parte de seu currículo pessoal. A Secretaria da Promoção da Igualdade Racial informa que esse dado agora é necessário para "orientar os órgãos públicos federais na adoção de ações de promoção da igualdade racial" e que isso "atende a uma das mais antigas reivindicações do movimento negro brasileiro". A julgar pela explicação da secretária de Políticas de Ações Afirmativas, Angela Nascimento, isso significa que o Estado poderá discriminar pesquisadores em razão de sua raça ou de sua cor na hora de decidir se deve ou não financiá-los, pois o "quesito raça/cor" é "instrumento fundamental da ação governamental no planejamento, avaliação e alcance de tais políticas públicas".
Sofisticou-se, assim, o racialismo. Até aqui, as políticas de ação afirmativa tinham como base apenas levantamentos demográficos genéricos, feitos pelo IBGE, nos quais se preservava o anonimato. Agora, no caso dos pesquisadores, seus nomes estarão vinculados a rótulos como "negro", "branco" ou "amarelo", como se essas definições fizessem parte de suas qualificações. Em artigo no jornal O Globo (18/4), sob o apropriado título O ovo da serpente, a antropóloga Yvonne Maggie se disse "chocada" com a exigência do CNPq, expressando dúvidas pertinentes: "Como essa informação será utilizada? Será sigilosa?". .
Há a opção "não desejo responder à pergunta", mas quem garante que o pesquisador que se recusar a informar sua raça não será discriminado por isso? O fato é que a pergunta nem sequer deveria ter sido feita, pois que mérito acadêmico há em ser "branco", "negro" ou "amarelo"?
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