O ESTADÃO - 05/04
Há 3 anos, disse que a sigla não se tornaria um grupo político importante e minha opinião se mantém após a última reunião China, Xi Jinping, escolheu Moscou como o destino para a sua primeira visita de Estado. Ele e o presidente russo, Vladimir Putin, anunciaram uma série de acordos e, em seguida, viajaram para a cidade sul-africana de Durban, onde participaram da 5.a cúpula dos Brics, juntamente com os líderes da Índia, Brasil e África do Sul. Na reunião, eles propuseram a criação de um novo banco de desenvolvimento que poderá desafiar o domínio do Banco Mundial e do Fundo Monetário Internacional. Os cinco líderes referiram-se em seus discursos a uma guinada na ordem mundial - e Xi afirmou que “o potencial de desenvolvimento dos Brics é infinito”.
Foi como se os membros do grupo tivessem finalmente chegado à idade adulta. Há três anos, eu olhava os Brics com ceticismo. E, apesar do aparente sucesso da cúpula recente, o meu ceticismo persiste.
O termo “Bric” foi cunhado há cerca dei 2 anos por Jim O’Neill, então o chefe da equipe de economistas do Goldman Sachs, para indicar os mercados emergentes do Brasil, Rússia, Índia e China. De 2000 a 2008, a participação desses quatro países na produção global cresceu rapidamente, de 16% para 22% (em termos de paridade de poder aquisitivo) e, na crise que se seguiu, suas economias apresentaram um desempenho melhor do que a média.
Para os investidores, esse resultado justificava a criação do interessante acrônimo. Mas, então, aconteceu algo estranho: a criatura ganhou vida.
Em 2009,os quatro países reuniram-se pela primeira vez na Rússia na tentativa de estabelecer uma organização política internacional. Os sul-africa-nos uniram-se ao bloco no final de 2010, de início por razões políticas. Como recentemente O’Neill declarou ao jornal China Daily: “A África do Sul tem muita sorte de fazer parte desse grupo, pois, do ponto de vista econômico, tem dimensões muito reduzidas em relação aos outros”. Além disso, seu desempenho econômico tem sido relativamente fraco, com uma taxa de crescimento de apenas 2,3% no ano passado.
Na realidade, embora os Brics possam ser úteis na coordenação de certas táticas diplomáticas, o termo engloba países extremamente díspares. Não só a Africa do Sul é pequena em comparação aos outros, como a economia da China é maior do que a de todos os demais membros juntos. Do mesmo modo, Índia, Brasil e África do Sul são democracias e ocasionalmente se reúnem em um fórum alternativo, o Ibas. E, embora as grandes autocracias, Rússia e China, achem vantajoso do ponto de vista diplomático alfinetar os americanos, ambos os países mantêm relações diferentes - porém cruciais - com os Estados Unidos. E ambos esforçaram-se para frustrar os esforços da Índia, Brasil e África do Sul para se tornarem membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU.
Imersão. Como escrevi há três anos, em termos analíticos, não faz sentido incluir a Rússia, uma antiga superpotência, no rol de economias em desenvolvimento. Moscou não tem exportações diversificadas, enfrenta graves problemas demográficos e de saúde e, segundo as palavras do próprio ex-presidente Dmitri Medvedev, “precisa modernizar-se enormemente”. O país pouco mudou desde a volta de Putin à presidência, no ano passado.
Embora o crescimento econômico tenha se beneficiado do fantástico aumento dos preços do petróleo e gás na última década, ainda não se destacaram outros setores competitivos, e o país agora encara a perspectiva da queda dos preços da energia. E ainda que pretenda manter um crescimento anual de 5%, sua economia ficou relativamente estagnada no ano passado.
Se os recursos energéticos da Rússia parecem em declínio, os do Brasil se mostram impressionantes, considerando que o país possuiu uma superfície que é o triplo da que tem a Índia, um índice de alfabetização de 90%, e o triplo da renda per capita dos indianos (além de cerca de duas vezes a da China). Entretanto, nos três anos que se passaram desde minha avaliação anterior, o desempenho do Brasil declinou: seu crescimento econômico anual baixou de 7,5%, em 2010, para 1% no ano passado, e para este ano prevê-se uma taxa de 3,5%.
Assim como o Brasil, nos anos 90 a Índia experimentou um surto de expansão da produção depois da liberalização da economia. Na realidade, até poucos anos atrás, o crescimento do PIB aproximava-se das taxas chinesas. Contudo, este ano, seu crescimento deverá se manter em uma taxa relativamente baixa, de 5,9%. Caso o país não melhore sua infraestrutura e seu índice de alfabetização (particularmente entre as mulheres), será improvável que a Índia alcance o ritmo da China.
Portanto, deveremos levar os Brics de hoje tão a sério quanto os Brics de três anos atrás? Significativamente, a reunião de Durban não produziu nenhum detalhe sobre a estrutura do novo banco de desenvolvimento, o que sugere que houve muito pouco progresso no último ano desde a última reunião do grupo, em Nova Délhi, quando foi feito o anúncio do plano.De fato, apesar do empenho em realizar “negociações formais” para a criação do banco, as divergências quanto ao tamanho e às participações no capital da instituição não foram resolvidas.
Essa falta de unidade é um sintoma das incompatibilidades subjacentes entre os membros do Brics. Em termos políticos, China, Índia e Rússia competem entre si pelo poder na Ásia. E, em termos econômicos, Brasil, Índia e África do Sul estão preocupados com os efeitos da moeda desvalorizada da China sobre suas economias.
Há três anos, escrevi que, “os Brics não devem se tornar uma organização política importante de países que compartilham as mesmas ideias”. Essa última reunião dos Brics não me deu nenhuma razão para rever a minha avaliação.
Nenhum comentário:
Postar um comentário