segunda-feira, março 11, 2013

Um pacto por recursos - DENISE ROTHENBURG

CORREIO BRAZILIENSE - 11/03

No Brasil, as coisas sempre ocorrem lentamente. Haja vista a redemocratização. Não foi feita “na marra”, embora alguns trabalhassem por esse caminho. Tivemos que passar pelo Colégio Eleitoral antes de seguir para o sonhado voto direto. A própria Constituição de 1988 está até hoje com uma série de artigos sem regulamentação, alguns inclusive obsoletos. O mesmo mal recai agora sobre o tal pacto federativo. Há quanto tempo você ouve falar da necessidade de uma nova ordem no relacionamento entre União, estados e municípios? E esta semana, finalmente, teremos a chance de saber se “agora” vai e, se ocorrer, será mais pela dificuldade do PT em dividir o poder do que qualquer outro motivo mais republicano.

Dentro do Congresso, há aquela sensação de que finalmente o tempo de maturação do pacto federativo chegou. Ao longo dos próximos dias, teremos uma série de reuniões com a pauta dos estados. Hoje, por exemplo, a Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) recebe os ex-ministros Nelson Machado e Guilherme Dias, o ex-governador Germano Rigotto e o ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda Bernard Appy e o economista José Roberto Afonso. Quarta-feira, os presidentes do Senado, Renan Calheiros, e da Câmara, Henrique Eduardo Alves, reúnem os 27 governadores para tratarem do tema. E ainda tem o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa, e secretários estaduais na terça-feira, para debater a reforma do ICMS.

Ok, você tem razão. Quando se coloca muita gente na mesa para debater um tema fica difícil chegar a uma alguma decisão. Mas está no ar do Congresso um certo “basta” no que se refere ao velho pires na mão e a certeza de que não é possível essa concentração de receitas e de projetos em Brasília.

Mas, desde que venceu o prazo fornecido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) para que o Congresso reformulasse a distribuição do Fundo de Participação dos Estados (FPE) e que a reforma do ICMS entrou na ordem do dia, tem-se a percepção de que os políticos pretendem usar essa obrigação para aproveitar e fazer o serviço pendente há décadas.

O novo pacto federativo volta e meia entra na pauta. No passado, Paulo Renato Souza, no papel de coordenador da campanha do candidato Fernando Henrique Cardoso, colocou esse tema como primeiro da lista de prioridades do futuro governo. Perdeu a batalha, porque a maioria não queria rediscutir a federação. Afinal, a concentração da receitas na União estava boa para a maioria dos partidos, cada um se sentindo acomodado em um setor. De vez em quando, havia uma crise, mas nada que comprometesse a divisão global do poder, graças ao jeitoso presidente, que segurava seus aliados na lábia.

Agora, esse quadro mudou. Sob esse biombo da ordem do STF, do ICMS e da praticidade de se resolver obras e serviços nas instâncias mais próximas do eleitor (administrações estaduais e municipais), há o cansaço de deputados e senadores, a maioria da base governista, com a demora do PT em dividir o poder.

Para completar, eles vêem na presidente Dilma um ar de superioridade e impaciência com a classe política, uma atitude que reforça a imagem negativa que se tem dos congressistas de forma geral. Até aqui, todas as mudanças de ministros no governo Dilma Rousseff — e olha que não foram poucas — vieram recheadas de estresse, com os partidos apontando nomes que o Planalto simplesmente rejeitava. Uma rara exceção, foi Aldo Rebelo, do PCdoB, para o Ministério do Esporte. Para as agências reguladoras e cargos de segundo escalão, o PT sempre preferiu indicar os seus, enquanto até os nomes técnicos propostos pelos aliados ficavam esquecidos.

Diante desse quadro, se Maomé não consegue chegar à montanha, no caso as receitas da União, os políticos vão levar essa montanha até Maomé. É isso que estará em curso no pacto federativo. Repassar a estados e municípios os recursos que hoje estão concentrados na União.

Enquanto isso, no Planalto…

Ao longo dos últimos 25 anos, a União foi competente em segurar essa distribuição. Seus técnicos sempre jogavam sobre a mesa algum recurso que faziam com que os estados brigassem entre si, enquanto o grosso do bolo permanecia intocável. Desta vez, parece que o governo pretende usar o ICMS como essa isca. Se vai funcionar, veremos no decorrer dos próximos dias.

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