segunda-feira, março 11, 2013

As intenções e os gestos do governo - JORGE J. OKUBARO

O ESTADO DE S. PAULO - 11/03

Conceitos, expressões, palavras que sintetizam, mais do que anseios de pessoas inquietas, reais necessidades da economia para a retomada do crescimento rápido e sustentável - e por isso mesmo têm sido repetidos por empresários, economistas e brasileiros em geral preocupados com o futuro - começam a aparecer em pronunciamentos oficiais, especialmente da presidente Dilma Rousseff. Pode ser um bom sinal. Pode ser que, de tanto ouvir as queixas do setor produtivo, o governo se tenha dado conta de que há graves obstáculos ao crescimento cuja superação depende, em maior ou menor grau, de suas decisões ou ações.

Há, porém, o risco, já apontado por parte da oposição, de que a nova atitude da presidente da República e seu novo discurso, simbolizado na ênfase de expressões de denso significado, tenham objetivos menos louváveis. Teme-se que tudo seja mais um sinal de que, perturbado pelo mau desempenho da economia e sem poder oferecer respostas adequadas aos que, com razão, pedem medidas efetivas para estimular os investimentos e melhorar a infraestrutura, o governo também tenha decidido colocar a campanha eleitoral nas ruas, como já o fez o ex- presidente Lula - precocemente e de maneira nociva à atividade econômica, ressalve-se.

O objetivo seria manter pelo prazo mais longo possível - até a eleição do ano que vem - o grande prestígio de que a presidente continua a desfrutar, a despeito do pífio desempenho da economia, resumido no baixo crescimento do PIB em 2012, de apenas 0,9%, e na persistência da inflação em níveis superiores ao centro da meta definida pelo Conselho Monetário Nacional, ameaçando até mesmo superar a margem de tolerância.

Nos últimos dias, a presidente se referiu diversas vezes à necessidade de o Brasil alcançar maior competitividade, para superar os desafios de conquistar espaços crescentes na economia mundial e resistir com mais eficiência aos efeitos da crise.

"O Brasil só vai andai- para a frente se mexer naquelas questões que transformam a competitividade, por exemplo portos e aeroportos", disse a presidente, com toda a razão, em discurso que pronunciou na Paraíba, há uma semana.

Na quarta-feira, em reunião no Palácio do Planalto com governadores e prefeitos, voltou a empregara expressão. "Precisamos perceber que temos que dar um salto de competitividade."

É verdade. Também verdadeiros são os argumentos em favor dos investimentos em educação. O governo quer assegurar para a educação uma fatia dos royalties do petróleo - tema que lhe tem rendido problemas com sua base parlamentar e que resultaram na derrubada do veto da presidente à fórmula aprovada pelo Congresso para o rateio desses recursos.

"Tem que colocar os royalties do petróleo para a educação", disse Dilma, na reunião com governadores e prefeitos. "É a única coisa fundamental. Aí vamos garantir creches, alfabetização na idade certa, ensino integral e formação profissional para romper as amarras da competitividade." Eis aí, novamente, a palavra-chave do que parece ser o novo vocabulário da presidente.

O País precisa de tudo o que Dilma citou nos últimos dias, e muito mais, para de fato tornar- se mais competitivo. Mão de obra adequadamente treinada para atender às exigências cada vez maiores do mercado será essencial para isso. Até mesmo a indústria da construção, tradicionalmente apontada como porta de entrada no mercado de trabalhadores com baixa ou nenhuma qualificação, requer em ritmo crescente profissionais capacitados para lidar com materiais e equipamentos de alta tecnologia. Isso exige um sistema de ensino preparado para formar esses profissionais, o que é bastante diferente do sistema existente hoje.

Portos e aeroportos com maior capacidade e que ofereçam serviços mais eficientes e a custos menores são igualmente indispensáveis para melhorar a competitividade do País. Sistemas rodoviário e ferroviário mais seguros e mais amplos também são imprescindíveis. Oferta adequada de energia elétrica e de telecomunicações, da mesma forma, ajuda a tornar nossa economia mais competitiva.

Não foram citadas por Dilma, mas mudanças institucionais são também indispensáveis para melhorar o ambiente econômico. Apesar de avanços beneficiando sobretudo empresas de médio e de pequeno portes, a burocracia ainda é excessiva e tolhe os investimentos e a atividade econômica. O sistema tributário, complexo demais, pesa exageradamente nos custos de operação no País. Decisões legislativas balizadas por interesses meramente eleitorais geram insegurança no campo jurídico e, da mesma forma, inibem decisões de investimentos.

Paia alguns desses persistentes problemas, o governo apresentou sua proposta de solução. Há uma profusão de planos e anúncios para a modernização de portos e aeroportos, a redução da tarifa de energia elétrica, a melhoria e ampliação das malhas rodoviária e ferroviária por meio de investimentos privados, a retomada das licitações de blocos de petróleo, entre outros. São, em geral, boas notícias.

Alguns planos já produzem resultados. Mas o exame pormenorizado das condições em que outros estão sendo colocados em prática revela dificuldades formais e práticas para sua concretização. Regras mal definidas, exigências exageradas - como a imposição de taxas de retorno muito baixas, com o objetivo de assegurar tarifas igualmente baixas - reduzem o interesse dos investidores nesses projetos, ameaçando inviabilizá-los. Tomando emprestada a letra de Fado Tropical, música de Chico Buarque e Ruy Guerra, pode-se dizer que "há distância entre intenção e gesto" do governo nesses projetos. Essa distância e o risco político da nova atitude do governo alimentam desconfianças.

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