O GLOBO - 11/03
Do Leme ao Pontal, como diz a música, o Rio ostenta um litoral que encanta o mundo. Ao mesmo tempo, o carioca, de modo geral, tem muita dificuldade de ver nessa privilegiada faixa do território oportunidades de aproveitamento que vá além do banho de mar e outras atividades de lazer. Não se discute que esses são hábitos a serem preservados, na verdade até incentivados, parte que são do modo de vida de moradores. São também fonte de atração para o turismo e, sobretudo, atividades saudáveis. Mas isso não justifica o preconceito de deixar o mar e seu entorno à margem de empreendimentos que contribuam para o desenvolvimento econômico, urbanístico e cultural da cidade.
Nesse sentido, é cego e anacrônico o preservacionismo que contamina as discussões sobre a revitalização da Marina da Glória. O atual projeto em debate, aprovado preliminarmente em Brasília pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) é claro quanto ao propósito de aproveitar as potencialidades econômicas daquela faixa do Aterro, respeitando-se seus pressupostos ambientais . É uma diretriz moderna, que vem sendo adotada por outros países tanto em obras de recuperação de áreas degradas como em regiões em que a ocupação deve ser regida por normas urbanísticas que protejam o meio ambiente.
O projeto, tornado público recentemente, prevê a ampliação e modernização das instalações náuticas e de turismo da Marina, bem como a preparação daquela faixa de água para as competições de vela das Olimpíadas de 2016 — este, um compromisso assumido com a comunidade internacional pelos entes envolvidos na organização dos Jogos. Além disso, deverão ser construídas unidades comerciais e, principalmente, um centro de convenções, espaço de que a cidade sofre de crônica carência.
Lastreadas por um investimento de R$ 200 milhões, são intervenções, por si, positivas para o crescimento da cidade. Mas, localizadas em região que, por suas peculiaridades, tombada pelo serviço do patrimônio público, precisam ser implementadas dentro de estrita obediência à legislação. A aprovação preliminar pelo Iphan sinaliza que tal pressuposto está contemplado no projeto. De qualquer forma, antes do canteiro de obras, as propostas ainda passarão pelo crivo de outros organismos.
Ações em defesa do meio ambiente são, por óbvio, importantes para proteger a natureza de crimes ambientais. Mas o preservacionismo cego não pode ser pretexto para boicotar o crescimento ordenado e responsável da cidade. De resto, no caso da Marina, objeto de um aparentemente sério projeto de revitalização, pode-se lembrar que, no sentido estrito da preservação, o Aterro do Flamengo, que a abriga, sequer existiria hoje, pois se trata de um empreendimento — grandioso e, como se viu, benéfico para a cidade — que subtraiu ao mar uma extensa faixa. Não fosse a visionária teimosia de Lota Macedo Soares, que o idealizou enfrentando resistências de seu tempo, o carioca não teria hoje o belo parque, sinônimo de qualidade de vida.
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