"Queridos e queridas" é o novo "companheiros e companheiras". Dilma Rousseff voltou a soar seu bordão ao conjurar eleitores na sexta-feira à noite, no seu pronunciamento em rede de rádio e TV. "Meus queridos brasileiros e, muito especialmente, minhas queridas brasileiras" - começou a presidente, antes de anunciar a desoneração da cesta básica, no Dia Internacional da Mulher. Não foi por acaso.
"Queridos e queridas" são a chave para identificar quando Dilma está em campanha. Ao contrário de Lula, que conclamava os "companheiros" em qualquer discurso, ela faz uso seletivo do bordão. Parece até que a evocação depende de quem escreve o texto, se o ghost-writer palaciano ou o marqueteiro da reeleição. Mas importa menos o "quem" do que o "quando".
Em quase 400 manifestações públicas desde que tomou posse da Presidência, Dilma fez uso de "queridos" (no plural) em apenas 58 ocasiões. A referência a "queridas" foi duas vezes mais rara: só em 31 vezes. Juntos, "queridos" e "queridas" só saíram da boca de Dilma em 6% de suas falas. Foram poucas e boas, porém.
Os pronunciamentos presidenciais em rede de TV, quando a audiência é potencialmente de dezenas de milhões de pessoas, começam invariavelmente por "Queridas e queridos". Foram cinco vezes em 2011, quatro em 2012 e duas até agora em 2013. Dilma tem usado efemérides para monopolizar a TV: Natal, Dia do Trabalho, 7 de Setembro. Vale observar se a regra se repetirá até 2014 ou se o calendário eleitoral se imporá ao cronológico.
Na sexta-feira, as brasileiras foram "queridas" duas vezes e as mães, uma. Foi uma rara - senão única - demonstração de afetividade. Dilma costuma ser econômica nos adjetivos que dirige ao público. Fala uma vez "queridos e queridas" na abertura - ou quando se dirige diretamente à audiência - e basta. A repetição adjetiva de sexta-feira sugere um esforço extra para criar empatia.
O bordão é pouco espontâneo, mas maleável. Pode ser adaptado ao alvo, como em "queridas prefeitas e queridos prefeitos", usado por Dilma durante seu encontro com os novos chefes do Executivo municipal - e potenciais cabos eleitorais - em janeiro passado. Pode virar "queridos formandos" (formatura do Instituto Rio Branco) ou "queridos mineiros" (entrega do Mineirão).
Mas "queridos brasileiros" Dilma usa apenas nos pronunciamentos em rede de TV e rádio - ou em ocasiões solenes, como durante seu discurso de posse no Congresso Nacional.
O "querido" perde a solenidade, porém, se é dirigido a repórteres. Quando a presidente ouve uma pergunta de que não gosta, o interlocutor logo descobre porque a resposta vem precedida de um enfático e irônico "Meu querido...". Por exemplo, em "Meu querido, não respondo a essa pergunta" ou em "Meu querido, eu não vou ficar me atendo à pauta do adversário".
Poucas palavras revelam mais o estado de espírito presidencial do que "querido" - seja pela pronúncia ou pela omissão.
Em 2011, Eduardo Campos ouviu vários "querido", ditos em público pela presidente durante cerimônias em Brasília e no Nordeste. Em 2012 e 2013, nenhum (mesmo quando sua mulher, Renata, foi saudada com um "querida" por Dilma em dezembro, no Ceará). Ao contrário, desde o ano passado que os repasses federais para Pernambuco, o Estado governado por Campos, diminuíram a patamares não de "querido", mas de oposicionista.
Levantamento feito pelos repórteres Julia Duailibi e Bruno Boghossian, do Estado, mostra que a proporção de repasses voluntários da União a Pernambuco caíram quase pela metade entre o primeiro e o segundo anos do governo Dilma - indo na direção oposta do que ocorreu no governo Lula, quando só cresceram.
Não terá sido coincidência a escassez tanto de investimentos quanto de "queridos" no relacionamento de Dilma com Campos desde que o governador se tornou presidenciável. Daqui até 2014, "queridos" devem sair cada vez com mais frequência da boca de Dilma. Se forem incluídos nas referências ao governador pernambucano, será sinal de que o PSB e seu presidente decidiram adiar para 2018 o projeto de concorrer à Presidência.
'Queridos' e 'palhaços'. Antes "querido" do que "palhaço". Quando mandou um repórter "chafurdar" no lixo e o chamou de "palhaço", o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Joaquim Barbosa, demonstrou o seu equilíbrio.
Ao não pedir desculpas de viva voz e usar o texto de um subalterno para tentar se redimir, o ministro provou o seu caráter.
Nenhum comentário:
Postar um comentário