O GLOBO - 14/11
O general Petraeus foi o primeiro de uma nova era de moralidade ou mais um na lista de vítimas do FBI
Num país que teve um presidente testicocéfalo (John Kennedy), outro apanhado fornicando no Salão Oval (Lyndon Johnson) e um terceiro, na sala do lado (Bill Clinton), o que aconteceu ao general David Petraeus, obrigado a renunciar à direção da Central Intelligence Agency, é o improvável início de uma nova era moralista ou mais um episódio na série de crises fabricadas pela usina de mexericos do Federal Bureau of Investigation. Petraeus teve um caso com sua biógrafa. Até agora não apareceu prova de que essa ligação tenha afetado a segurança dos Estados Unidos.
Se alguém dissesse que Allen Dulles, o fundador da CIA, tinha uma namorada fora do casamento, seria considerado pessoa mal informada. Ele teve umas cem. Um dia, levou a rainha Frederika da Grécia (mãe de Sofia da Espanha) para um closet, ficaram trancados e ele precisou chamar um assessor para libertá-los. Coisa velha? O colunista Jeff Stein revelou que uma operadora da CIA dormiu com seus agentes brasileiros para melhorar a coleta de informações sobre os programas espacial e nuclear de Pindorama. Fronhas do ofício?
De 1935 a 1977, enquanto J. Edgar Hoover dirigiu o FBI, seu capital político ficava no cofre onde guardava a crônica dos lençóis de Washington. Ia de Marilyn Monroe com os irmãos Kennedy às orgias de Martin Luther King. Ele era o guardião de uma moralidade que a elite americana cultiva, mas raramente pratica. O Pentágono faz mais mal ao país encobrindo casos de estupro (de mulheres e homens alistados) do que com infidelidade de seus generais. Faz pouco tempo que deixou de ser falta de educação lembrar que Thomas Jefferson, um dos pais da pátria, teve filhos com sua escrava Sally. Strom Thurmond, um dos líderes da bancada segregacionista no Congresso, tivera uma filha com sua empregada negra, mas o fato só foi revelado em 2003, depois de sua morte.
David Petraeus foi detonado pelo FBI durante a presidência de um casal apaixonado. Às vezes o FBI trabalha em silêncio, procurando informar ao governo com minúcias que levam anos para serem reveladas. Acaba de sair nos Estados Unidos uma biografia do juiz William Rehnquist, que ficou na Suprema Corte de 1972 a 2005, presidindo-a durante 19 anos. (Chama-se “Partisan” e está na rede por US$ 14,99.) Era um asceta e não falava de sua impecável vida pessoal. Sabia-se que padecia de males da coluna e passara por duas cirurgias. A Corte escondia suas ausências, mas algumas gravações mostram que arrastava a fala durante seus votos. O FBI foi atrás e descobriu que ele não conseguia dormir e tomava oito medicamentos, triplicando a dose máxima de um deles, o Placidyl. Em 1982, o juiz internara-se secretamente para um tratamento de desintoxicação. Sem as drogas, delirou, ouviu vozes de conspiradores da CIA para matá-lo e, quando viu que as cortinas do quarto mudavam de desenho, fugiu. Foi achado no saguão, de pijama. O doutor pirara, “mas a extensão da loucura só foi conhecida depois de sua morte, quando o FBI liberou os documentos da investigação de seus agentes”.
O papelório foi mandado à Casa Branca quando Ronald Reagan quis elevá-lo à chefia (vitalícia) da Corte. O presidente manteve sua escolha e até 2005, quando foi fulminado por um caso raro de câncer da tireoide, Rehnquist ocupou o cargo sem transtornos.
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