Estive em Brasília na semana passada para um evento que me encheu de orgulho. Fui receber a medalha da Ordem do Mérito Cultural, entregue pelas mãos da presidente Dilma Rousseff em cerimônia realizada no Palácio do Planalto. Aproveito para cumprimentar os outros dois premiados do Sul nessa festa que teve como principal homenageado Luiz Gonzaga: a professora e doutora em Educação Cleodes Ribeiro, que reside em Caxias, e a Fundarte, de Montenegro. Compartilhamos esse momento ao lado de Marieta Severo, Regina Casé, os irmãos Campana, Elba Ramalho, além de ilustres póstumos como Plínio Marcos, Mazzaropi, Jorge Amado, Herivelto Martins e outros nomes de igual estatura. Éramos 40 representantes da cultura brasileira, entre pessoas físicas e jurídicas, vivas e falecidas, e, se me permitem a piada, em trânsito: Orlando Orfei, aos 90 anos, compareceu frágil em sua cadeira de rodas, comovendo a todos que tiveram infância.
Mas, afora essa introdução cabotina, quero falar sobre Brasília. Foi a sexta vez em que lá estive, e não consigo mudar minha impressão: não é uma cidade, e sim uma instalação a céu aberto com obras do magnífico Oscar Niemeyer. Não há como não ficar impactado com seu trabalho grandioso e atemporal. De resto, a Capital Federal é uma abstração.
Brasília é plana – e fruto de um plano, imagino: impor distância entre o governo e o povo. A localização parece estratégica no bom sentido (no centro do país, o que, em tese, promoveria uma aproximação democrática com todos os Estados), mas na prática Brasília está ilhada em meio ao cerrado, observando os brasileiros de binóculos.
Nada convida à aproximação. Imensos terrenos separam os prédios. A cidade é dividida em setores que não se comunicam com facilidade. Caminhar em Brasília é um desconsolo, uma travessia solitária em meio à geometria fria e monocromática das ruas.
A cerimônia de premiação se deu pela manhã, e no início da noite fomos convidados para um coquetel no Palácio da Alvorada, onde a presidente, junto a alguns ministros, recebeu-nos como uma dona de casa recebe: com alegria, afeto, descontração. Havia quadros, tapetes, cortinas, um lindo jardim com piscina e a presença de Chambinho do Acordeon (protagonista do filme Gonzaga, de Pai Para Filho), que tocou xote, baião e promoveu um arrasta-pé no meio da sala. Dançamos, cantamos. Havia calor humano ali. Havia gente ali. Foi a única ocasião em que me senti numa cidade comum.
Vi quando alguém cumprimentou a presidente pela sua casa e ela respondeu: “Não é minha, e sim de todos os brasileiros”. Meu primeiro pensamento: “Hum, da próxima vez vou trazer meu biquíni”. O segundo: “Brasília inteira deveria ser a casa de todos os brasileiros”. O Rio é. Salvador é. Qualquer outra cidade do Brasil é.
Uma casa é onde seus moradores interagem, onde todos são vistos, onde a proximidade desmascara as mentiras e impõe a verdade. Uma casa é onde acontecem nossos dramas, comédias, rebeliões, discussões, abraços. É onde a vida germina e cresce. A capital de um país deveria estimular exatamente isso que Brasília dificulta: a convivência.
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