sexta-feira, outubro 19, 2012
Repercussão geral - ANTONIO DE PASSO CABRAL
O Globo - 19/10
O julgamento do mensalão pelo Supremo Tribunal Federal tem se revelado importante em certas matérias comuns a milhares de outros processos nas cortes federais e estaduais em todo o país.
Ao indeferir o desmembramento do processo, o STF afirmou a preclusão da reapreciação de questões já decididas. Em termos simples, entendeu que, quando a defesa alega diversas vezes uma mesma questão já decidida pelo juízo, não cabe ao Judiciário julgar novamente o tema, pois a discussão já foi exaurida naquele ponto. Aplicada a premissa a outros processos, reduzemse custos e tempo de tramitação, pondo fim à insistência da defesa em repetir argumentos já rejeitados pelo juiz.
No campo da valoração da prova, as decisões tomadas pelo Supremo elevaram a um alto nível as discussões sobre o tema no direito processual brasileiro. Ressaltou-se que a prova não deve ser concebida numa visão ultrarracionalista (e até certo ponto ingênua) a respeito da cognição humana. Se exigirmos certeza de verdades apodíticas, uma condenação só seria possível se o agente público fosse filmado recebendo propina do corruptor ou se o criminoso tivesse conversa telefônica interceptada confessando o cometimento do delito.
Como salientaram os ministros. Fux, Barbosa, Weber, Peluso, entre outros, a prova deve ser compreendida em sua função persuasiva, há muito sustentada na literatura especializada: o juiz deve formar seu convencimento sopesando as provas e alegações de cada parte. A função persuasiva da prova reforça para o juiz o dever de fundamentar, tornando o resultado do processo mais racional e controlável, e reafirma a pacífica jurisprudência do STF, que há décadas considera suficiente, inclusive para condenação criminal, um conjunto de indícios que conduzam à conclusão segura de que o crime ocorreu. Isso é importante em contextos associativos complexos (organizações criminosas), e em casos de formação de cartéis, crimes e infrações no mercado de capitais, em que a prova indiciária predomina, pois é raro que se obtenham documentos e gravações dos fatos criminosos.
Não surpreende que, contraposto a estas premissas fixadas pelo Supremo, observemos um desconforto de setores aos quais interessa um processo caótico em que o Judiciário é posto numa relação de vassalagem à defesa, como se os réus pudessem proceder como bem entendessem e o magistrado devesse valorar os fatos e as provas sempre a seu favor; como se o juiz fosse compelido a tolerar qualquer conduta e tivesse que afastar sucessivas vezes a mesma alegação, por mais inverossímil que fosse. A previsão da ampla defesa — um valioso direito constitucional de todos nós — não significa que a defesa possa tudo. Cabe aos juízes conduzir o debate sem tolerar excessos ou admitir abuso dos mecanismos processuais.
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