A chuva continua
CELSO MING
O ESTADO DE SÃO PAULO - 15/04/11
Em tempo de enchente, não há quem não pergunte quando, afinal, vai terminar a temporada de aguaceiros.
É também por isso que os analistas se voltam para o Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos), que não para de despejar dólares no mercado global e vai produzindo inundações monetárias.
Os juros básicos nos Estados Unidos já estão praticamente zerados desde dezembro de 2008. Isso significa que a partir de então houve tanta abundância de dinheiro por lá a ponto de seu preço (juros) girar em torno de zero.
Mas o presidente do Fed, Ben Bernanke, não parou por aí. No auge da crise (2008-2009), recomprou US$ 1,7 trilhão em títulos privados (hipotecas, promissórias, debêntures, depósitos a prazo, etc.) que estavam largados, sem interessados, no mercado. O resultado dessa nova injeção de dinheiro fora dos padrões de comportamento de uma autoridade monetária ganhou o nome de afrouxamento quantitativo (quantitative easing). E foi justificado como operação destinada a encorajar o crédito e o consumo para tirar a economia americana da paradeira.
Em agosto do ano passado, o Fed reconheceu que a situação da economia americana continuava malparada. Por isso não tiraria do mercado os recursos que chegassem a seus guichês no resgate dos títulos que estavam em seu poder, à medida que fossem vencendo. Em vez disso, usaria esses recursos na recompra de títulos do Tesouro dos Estados Unidos que estivessem rolando no mercado. Ou seja, os recursos seriam rebombados para o mercado e o estoque do afrouxamento quantitativo seguiria sendo de US$ 1,7 trilhão.
Mas o Fed ainda não parou aí. Em agosto de 2010, também para facilitar a recuperação da economia dos Estados Unidos, Bernanke anunciou a recompra de mais US$ 600 bilhões em prestações mensais de US$ 75 bilhões, até junho de 2011.
De lá para cá, acirrou-se o debate sobre quando o Fed começará a reverter esse jogo. A reversão significaria o início do enxugamento dessa dinheirama. Quem quer que isso ocorra argumenta com a estocada da inflação nos Estados Unidos, que já foi para 2,5% ao ano e pode terminar 2011 em torno dos 4,5%. O problema - e desse problema Bernanke não para de falar - é que o emprego não reage, a despeito de uma certa melhora da atividade econômica.
Ontem, por exemplo, o Departamento do Trabalho dos Estados Unidos divulgou seu informe semanal sobre procura de seguro-desemprego e veio mais uma surpresa. Na semana terminada no dia 8 de abril, contrariando as expectativas bem mais otimistas dos analistas, mais 27 mil trabalhadores americanos se viram na contingência de recorrer a esse benefício, puxando o total de assistidos para 412 mil.
É um dado que reforça a posição de Bernanke de continuar levando adiante o processo de afrouxamento quantitativo. Do ponto de vista do Brasil, isso significa que a inundação de dólares deve prosseguir. E, para aqueles que esperavam uma retração dos preços das commodities com base na reversão desse processo, a manutenção desses níveis de desemprego nos Estados Unidos continua sendo fator adicional de alta do petróleo e de elevação dos preços dos alimentos, portanto, de mais inflação.
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