O Estado de S.Paulo - 16/01
Na praia de Santa Monica, na Califórnia, apareceu recentemente uma lula gigante, entre 3,5 metros e 15,38 metros de comprimento. A hedionda criatura estava, além de tudo, contaminada pelas radiações de Fukushima. A única desculpa deste bicho abominável é que ele não existe; não passa de besteira que algum idiota, de tempos em tempos, coloca na internet.
E o ventre de Julie Gayet, a amiga do presidente francês, François Hollande, não será, como a lula californiana, um mero boato? Os fatos andam rápido: há uma semana, uma revista de badalação nos informava, com fotos e tudo, que o presidente, nos crepúsculos parisienses, costumava pegar uma moto e, acompanhado por seus guarda-costas, visitava a atriz Julie Gayet.
Na sexta-feira, a informação, ainda não confirmada oficialmente, assumia o colorido da verdade: a companheira de Hollande, Valérie Trierweiler, fora hospitalizada em razão de uma "crise de depressão". Hoje, pior ainda, os boatos voltaram com estardalhaço na internet: Julie estaria grávida de quatro meses e meio. Na França, os sites dos jornais diminuíram a cobertura do caso, mas a imprensa internacional enlouqueceu. O Daily Mail anuncia a gravidez de Julie. "Espetáculo lamentável", é o título de Le Temps, da Suíça. The Times fala do "presidente libidinoso".
Diante desta avalanche, a primeira reação de um jornalista consciencioso é "duvidar". Pois é! Mas, o mesmo jornalista teve de engolir, algumas horas antes, "o impensável": o plácido e prosaico Hollande camuflava na realidade um terrível "serial lover" colecionador de mulheres: Ségolène Royal, Valérie Trierweiler e agora Julie Gayet. Além disso, existiria em Hollande um impulso paternal extremamente vigoroso: com Ségolène, ele tem quatro filhos. Com a "primeira-dama" Valérie, tem três. Em outra aventura atribuída ao presidente, há alguns anos, com a atual candidata socialista à prefeitura de Paris, Madame Hidalgo, também teria tido um filho. E para coroar a obra, as alcovas tórridas com Julie explicariam a gravidez que inflama a internet.
Portanto, há muitos boatos. Mas, há também uma verdade. Há alguns dias, antes portanto da revelação do "romance" do presidente com a atriz, ficamos sabendo que ela fora escolhida pela ministra da Cultura, Aurélie Filipetti, para fazer parte do júri extremamente seleto e extremamente fechado encarregado de designar os moradores da Villa Medici de Roma - lugar de grande prestígio da cultura francesa no qual se hospedam jovens artistas. Quando os franceses souberam da nomeação, ficaram perplexos: por que milagre a bela Gayet, uma simples atriz de TV de 41 anos, teria sido nomeada para um cargo tão cobiçado e disputado?
Depois, falou-se que o "milagre" em questão tinha um nome e que este nome era "Hollande" e sua ministra da Cultura, Filipetti. E que Julie tinha um currículo que justificava sua ascensão surpreendente ao firmamento da cultura francesa: meses de colóquios crepusculares com o presidente da República, na Rue du Cirque (nome bem curioso!) sob a proteção de alguns guardas do Palácio do Eliseu, encarregados, entre outras coisas, de transportar com suas motos alguns croissants no caso de o casal, depois da ação, sentir uma "fomezinha". Ontem de manhã, a ministra Filipetti repentinamente mudou de ideia. E, imediatamente, divulgou o nome de outra mulher - esta sim, absolutamente qualificada, para ocupar o posto.
A ministra explicou também que foi o diretor de Villa Medici que cometeu o engano, divulgando a informação há alguns dias. Mas que diretor idiota! Pobre Julie. Mas a ministra também cometeu um engano. Não teria se mostrado bem mais inspirada se tivesse nomeado para a Villa Medici, no lugar da pobre Julie (a "segunda" primeira-dama), a pobre Valérie Trierweiler, (a "primeira" primeira-dama), à saída do hospital?
Porque, afinal de contas, Valérie sofre de uma profunda depressão e será preciso encontrar uma solução para ela se, como temos o direito de temer, ela tiver de devolver, dentro de alguns dias, o escritório e as várias secretárias que o Palácio do Eliseu colocou a sua disposição? Seria um gesto delicado da parte de Hollande, porque bem sabemos o que é uma mulher ciumenta. Não é uma mulher de trato fácil. Ora, Valérie não é apenas uma mulher ciumenta em razão dos crepúsculos da Rue du Cirque. É também, como ela mesma disse às amigas, uma "mulher humilhada". E uma mulher humilhada...
Tal é o romance no qual a imprensa internacional - a britânica em primeiro lugar -, evidentemente, tripudia, chafurda e se lambuza há uma semana. Como são maldosos os jornalistas estrangeiros! Como se Hollande não estivesse sendo suficientemente crucificado por sua leviandade, pelo efeito das pulsões que muitas vezes tornam este ser tão doce, tão racional e tão plácido, um indivíduo incontrolável, talvez sob o efeito do luar que inunda a alcova da Rue du Cirque. / TRADUÇÃO DE ANNA CAPOVILLA
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