FOLHA DE SP - 01/12
Aspecto importante da produtividade de um país, que não se mede em infraestrutura, ambiente de negócios, nível técnico dos trabalhadores e empresários ou nível de investimento. Falo da matriz cultural da produção.
Em visita recente à Alemanha, fiquei mais uma vez impressionado pelo grau de organização, limpeza e qualidade da produção visto desde a feira livre até a empresa de alta tecnologia. O que me chamou mais a atenção foram o entusiasmo e a satisfação de executar um bom trabalho.
É um círculo virtuoso: na medida em que cada um trata os demais com eficiência e cortesia, também recebe bom tratamento.
Apesar de ter origem cultural diferente, o Brasil tem feito grandes progressos nessa direção. Tive duas experiências muito gratificantes que mostram isso.
A primeira foi a construção da operação brasileira de uma multinacional que atingiu os melhores índices de eficiência, qualidade e satisfação do cliente na comparação com o resto do mundo. Depois, no setor público, dirigindo o Banco Central, tive experiência semelhante com equipe de colaboradores engajada e eficiente, que se orgulhava, valorizava muito o trabalho e, por meio dele, a si mesma.
Embora tenhamos caminhado muito na valorização da qualidade e da produtividade, é preciso um grande avanço para elevar o nível de renda ao padrão dos países desenvolvidos.
Tive primeira visão mais crítica da questão quando li há muitos anos o diário de Charles Darwin sobre sua volta ao mundo nos anos 1830, na qual desenvolveu a teoria da evolução.
Ao passar pelo Brasil, o que mais chamou sua atenção foi o conceito de que homem de bem era o que se dedicava às coisas nobres, como as artes, e não às coisas "menores", como o trabalho, visto como atividade de escravos ou mal-intencionados. Mal-intencionado era todo aquele que quisesse ganhar dinheiro almejando o lucro, fosse comerciante ou agricultor.
De lá para cá, o país evoluiu muito com o fim da escravidão, a urbanização, as ondas migratórias, a massificação educacional e a ocupação produtiva do interior. Hoje o Brasil busca produtividade e conta com uma classe de trabalhadores e com empreendedores cientes do valor do trabalho.
Porém resiste em setores importantes uma visão arcaica contra o lucro e a meritocracia. Ter consciência de que ela é fruto de raízes culturais ultrapassadas contribui para seguir o processo de valorização da cultura do empreendedorismo, da meritocracia, da remuneração segundo a produtividade de cada um.
Quanto mais esses valores prevalecerem, mais perto estaremos do desenvolvimento que buscamos para todos.
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