O Estado de S.Paulo - 22/12
O ano chega ao fim e 2013 passará para a história como aquele em que o comércio exterior brasileiro deu a sua mais desastrada reviravolta do século, com o saldo despencando de um superávit de US$ 19,4 bilhões, em 2012, para um resultado mais ou menos equilibrado e, mesmo assim, com números manipulados para esconder o verdadeiro déficit. Como de hábito neste governo, a Petrobrás foi usada nessa manipulação com "exportações" de plataformas que nunca saíram do País e registros de importação de combustíveis adiados para maquiar resultados.
Há países com forte vocação exportadora, outros que importam muito e aqueles que fazem as duas coisas dependendo do momento de sua economia. O Brasil sempre foi grande exportador de commodities (agrícolas e minerais) e, a partir dos anos 70, passou crescentemente a exportar produtos industriais. A moratória de 1982 e seus desdobramentos com a suspensão de créditos externos levaram o País a buscar na exportação recursos financeiros para sobreviver. Desde então foi consolidada uma espécie de fé religiosa de que só superávits comerciais são bem-vindos, déficits são trágicos.
O Plano Real tentou desfazer esse tabu, mas não conseguiu. Na época, a economia era ancorada pelo câmbio baixo e fixo e pelo incentivo à importação para frear a inflação. Com isso as exportações desabaram, as importações foram à lua e o País acumulou déficits comerciais entre 1995 e 2000, só recuperando o superávit em 2001 - efeito do novo câmbio flutuante, que vigora desde 1999. O tabu não foi desfeito porque, em Economia, mesmo dependendo da situação vivida, é sempre melhor ter superávit do que déficit. No início do Real, câmbio baixo e importação em alta foram fundamentais para derrubar a inflação, mas era para durar pouco, a corda foi esticada e a correção só chegou em 1999. Com a demora, sofreram não só o setor externo, mas a economia como um todo.
Lula chegou em 2003 já com o câmbio flutuante e muita sorte por atravessar um período de rara fertilidade na economia mundial, com o mundo inteiro crescendo. Foi a fase dos megassuperávits comerciais (o maior deles, de US$ 46,4 bilhões, registrado em 2006), obtidos na onda da prosperidade mundial. Teria sido ainda melhor se Lula não tivesse rejeitado a Área de Livre Comércio das Américas (Alca) e cuidasse de conceber e praticar uma política para o comércio exterior. Não havia política e a preferência por Mercosul, América do Sul e países em desenvolvimento não gerou os resultados esperados. Exemplo: nosso maior parceiro nessa área, a Argentina, vive impondo barreiras a nossos produtos.
A crise econômica no mundo rico acabou com a onda otimista: desde 2008 o comércio externo declina e a balança comercial contabiliza superávits decrescentes, embora ainda expressivos. Em 2011, primeiro ano de Dilma Rousseff, o saldo foi de US$ 29,8 bilhões, caiu para US$ 19,4 bilhões no ano seguinte e até a primeira quinzena de dezembro de 2013 contabilizava um déficit de US$ 15 milhões. Numa conjuntura em que a taxa cambial deixou de ser um empecilho para exportações e deveria desestimular importações, a queda do saldo comercial é desastrosa, violenta, assusta e desencoraja projeções de recuperação no curto prazo.
O que falta ao comércio exterior é o que falta à gestão Dilma desde o início: um rumo, uma diretriz, um programa de governo, deixar de viver ao sabor do momento. Não há iniciativas nem do Ministério do Desenvolvimento e Comércio Exterior nem do Itamaraty em definir uma estratégia para o comércio exterior. A opção pela solução multilateral é importante e deve prosseguir, mas o Brasil não pode ficar esperando por um acordo final na Organização Mundial do Comércio, que vai demorar décadas - se chegar. Também não pode ficar amarrado aos parceiros do Mercosul para construir acordos com outros países (a negociação com a União Europeia não sai do lugar). Enquanto os ricos EUA e países europeus avançam no mais poderoso acordo comercial do mundo, o Brasil patina no Mercosul e tropeça no bloco dos Brics.
Aos queridos leitores, feliz Natal!
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