GAZETA DO POVO - PR - 10/12
As negociações tiveram vários lances difíceis, e um personagem sai fortalecido dessa rodada: o brasileiro Roberto Azevedo, diretor-geral da OMC
A globalização é destacada por sua capacidade de transformar o planeta Terra em um mercado único, uma verdadeira “aldeia global”, expressão cunhada por Herbert Marshall McLuhan para dizer que as novas tecnologias de comunicação encurtariam distâncias e, ao lado do progresso tecnológico, transformariam o mundo numa espécie de país único. Ao se intensificar nos últimos 30 anos, a globalização ampliou o movimento de mercadorias, de pessoas, de capitais e de tecnologias entre os países.
O avanço da globalização se deveu a várias fatores, com destaque para a liberalização do comércio internacional, a desregulamentação do fluxo internacional de capitais financeiros e a abertura das economias nacionais. Inicialmente, o movimento de abertura foi mais expressivo no mundo ocidental; logo adiante, incorporou os países nos quais o comunismo foi abolido; e, numa terceira etapa, envolveu vários países orientais. O aumento do comércio de bens, serviços e tecnologias entre as nações foi impulsionado pelo aumento da população global e pela necessidade de reduzir a pobreza.
Nesse cenário, um setor que teve menor velocidade de abertura e seguiu mantendo protecionismos nacionais foi a agricultura. Países como os Estados Unidos, Japão e várias nações europeias sempre relutaram em reduzir os subsídios a seus setores agrícolas e abrir suas economias a importações de alimentos oriundos de países cuja produção primária era mais eficiente. O Brasil é um dos países que há muito vinham demandando mais abertura e menos protecionismo à agricultura naqueles países, a fim de ampliar os mercados para exportação.
Após anos de fracasso nas negociações, os países membros da Organização Mundial do Comércio (OMC), reunidos em Bali, na Indonésia, acabaram de aprovar o primeiro acordo comercial geral em duas décadas, cuja conclusão chega a surpreender, pois depende da concordância de todos. Sem consenso não há acordo. Desta vez, coube à Aliança Bolivariana para as Américas (Alba) – da qual participam Bolívia, Cuba, Nicarágua e Venezuela – rejeitar o acordo inteiro, mesmo estando os países pobres, sobretudo aqueles nos quais há escassez de alimentos, entre os mais beneficiados com o acordo, uma vez que o pacote envolve medidas de estímulo e facilitação do comércio, da agricultura e do desenvolvimento. Mas depois de conseguirem chamar a atenção, os países componentes da Alba enfim deram seu aval à assinatura do acordo.
Estimativas iniciais feitas por organismos vinculados ao comércio internacional afirmam que os estímulos podem superar US$ 1 trilhão e têm potencial para gerar mais de 20 milhões de empregos na economia mundial, como destacou o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama. Parece que a oposição ao acordo, se houver, será de pequena expressão e localizada em países com interesses específicos eventualmente não beneficiados pelo acordo. As negociações tiveram vários lances difíceis, culminando com a aprovação final, e um personagem sai fortalecido dessa rodada: o brasileiro Roberto Azevedo, diretor-geral da OMC, que foi aplaudido na última sessão do encontro da organização, composta por 160 países membros.
As negociações envolveram itens de comércio exterior, transporte, barreiras não tarifárias, burocracia, normas jurídicas para solução de conflitos e medidas de facilitação do comércio. Espera-se que o setor primário mundial entre em novo tempo, com aumento da produção de alimentos, melhoria da produtividade e contribuição expressiva no combate à fome ao redor do mundo. Alguns pontos serão detalhados mais adiante e os procedimentos para a implementação dependem, pelo menos parte deles, de sistematização e divulgação.
Os países signatários do acordo agora passam à fase de adaptação de sua legislação e sua política interna a fim de que os efeitos das medidas aprovadas no âmbito da OMC se verifiquem na prática. As mudanças não serão imediatas no prazo curto, pois a extensão das medidas é expressiva e é grande o número de países envolvidos. Em relação ao comércio internacional, os termos combinados se transformam em norma a ser obedecida, cabendo à própria OMC o julgamento de eventuais conflitos levados a seus órgãos internos por qualquer parte considerada prejudicada.
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